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Do sempre muito bom, Angeli |
Sou seguidor do Blog do sociólogo (de esquerda) Rudá Ricci. Volto a repetir aqui: gosto muito da esquerda sensata que não utiliza do maniqueísmo e da manipulação em seus discursos.
A entrevista completa que ele deu ao Jornal Tribuna do Planalto de Goiás está aqui . Pincei três partes do post que considero mais interessante ou importante: a) o surgimento da nova classe C e a proposta de FHC de se aproximar mais dessa classe C e deixar o povão de lado; b) as diferenças entre Dilma e Lula e c) os movimentos sociais na era Lula e Dilma.
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Sobre a Classe C .
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O senhor considera que a nova classe C é conservadora. Em que sentido? Dessa forma estariam mais abertas para eleger um governo de direita?
R: Não necessariamente, já que não têm filiação ideológica. Eles possuem valores conservadores: contra aborto, contra discriminação da maconha, contra casamento gay, contra qualquer mudança relacionada à ordem. Eles querem conservar a situação que os ascendeu socialmente. Como sempre foram pobres, desconfiam de toda institucionalidade pública vigente, não lêem (a maior fonte de informação é o Jornal Nacional da rede Globo) e só acreditam em sua família (apontada por 83% deles como único segmento social que confiam). Formam um segmento que valoriza o círculo social mais íntimo, mais próximo e se ressentem das frustrações de sua vida passada. Mas nada que os identifiquem com elites ou segmentos sociais mais abastados. Neste sentido, Lula foi a expressão pública mais acabada deste segmento. Daí sua popularidade.
Que avaliação o senhor faz do governo de Dilma Rousseff? Ela é descendente do lulismo, mas deve continuar a seguí-lo?
R: Dilma tem a sorte de Lula e a racionalidade de FHC. É um personagem híbrido, gestor, pouco carismático, que tem dificuldades em assumir um papel de liderança pública. Mas faz parte do projeto lulista. E tem personalidade forte. Começou com uma agenda econômica muito negativa: aumento da taxa Selic, corte de 50 bilhões de reais do orçamento (afetando prefeitos e parlamentares), impediu aumento significativo do salário mínimo (pedra de toque da ascensão social na Era Lula). Mesmo assim, como foi adotada pela grande imprensa, como a oposição está em frangalhos e como o governo federal pulverizou verbas publicitárias para o interior do país, seus índices de aprovação foram ás alturas. Dilma não é uma figura popular. Mas o Brasil quer crer que é.
Que diferenças pontuais há entre Dilma e Lula? Ou não existem diferenças?
R: As diferenças são profundas. Dilma fala o discurso dos antigos formadores de opinião: a classe média tradicional. Tem este estilo anódino, reto, duro, formal, técnico, focado no resultado. A grande imprensa adora porque também fala para a classe média tradicional. Já Lula fala para a nova classe média, para os pobres que hoje são classe média baixa. Há uma evidente empatia e Lula soube falar a partir das referências culturais desta classe emergente: futebol, ironias e gracejos, valores familiares (sempre que podia aparecia com sua esposa e chegou a dizer que era contra o aborto, mas que tinha que ser gestor e estadista e pensar em saúde pública). Temo que Dilma, por sua formação como gerente de ações e programas, não consiga fazer a leitura do país novo que emerge e, principalmente, que não consiga assumir papel de liderança numa eventualidade de crise.
Qual a avaliação do senhor sobre os movimenos sociais nesses quase 10 anos de governo do PT? Eles perderam sua força porque foram para o governo? Mas ao mesmo o senhor não acha que eles têm mais força ou são mais respeitados pelo atual governo do que eram pelo governo FHC?
R: Parte significativa dos movimentos sociais se partidarizou e nem é mais movimento social. Se transformaram em organizações, com lógica própria, particular, privada, disputando recursos para se manter. Grande parte é financiada pelo Estado, por governos de todas cores ideológicas. Prestam serviços terceirizados, com competência técnica, em assistência às famílias, à crianças e adolescentes, na área de saúde e educação. Oferecem cursos e oficinas para escolas em tempo integral. E perderam o projeto político-ideológico. Há quem ainda faça discurso da transformação e mobilize socialmente, mas perde rapidamente seu apelo popular e até mesmo sua base social. Este é o caso do MST, que percebe que o fim da pobreza rural (segundo a FGV-RJ, a ascensão social é mais forte no campo) diminui sua base de arregimentação para ocupações. Para que uma família se arriscará a enfrentar um pelotão de choque se pode acessar o bolsa-família ou conquistar um emprego urbano? Finalmente, você me pergunta sobre respeito. Sim, há identidade de trajetórias entre o lulismo e estas organizações. Mas aprendi que em política só há acordo entre quem tem força. E estou afirmando que os antigos movimentos sociais perderam muita força política e são financiados pelo Estado. O fato é que o Brasil se fechou politicamente. Não há, hoje, espaço para um oposicionista ao lulismo. Por isto, a oposição se tornou discursiva. Perdeu o protagonismo da ação.
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