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Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


quarta-feira, 15 de abril de 2009

Os EUA Não São a Rússia




Reduzir o capitalismo financeiro é o grande teste americano
Martin Wolf - Financial Times
Os Estados Unidos são a Rússia? A pergunta parece provocativa, se não ultrajante. Mas a pessoa que a faz é Simon Johnson, o ex-economista chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI) e um professor da Escola Logan de Administração do Instituto de Tecnologia de Massachusetts. Em um artigo na edição de maio da "Atlantic Monthly", o professor Johnson compara o domínio da "oligarquia financeira" sobre a política norte-americana com o das elites empresariais nos países emergentes.

Essas comparações fazem sentido? A resposta é sim, mas apenas até certo ponto."Em sua profundeza e repentinidade", argumenta o professor Johnson, "a crise econômica e financeira americana lembra chocantemente momentos que vimos recentemente em mercados emergentes". A semelhança é evidente: grandes afluxos de capital estrangeiro; crescimento tórrido do crédito; alavancagem excessiva; bolhas nos preços dos ativos, particularmente imóveis; e, finalmente, colapsos nos preços dos ativos e catástrofe financeira."Mas", acrescenta o prof. Johnson, "há uma semelhança mais profunda e perturbadora: interesses de negócios da elite - financistas, no caso americano - exerceram um papel central na criação da crise, fazendo apostas cada vez maiores, com o apoio implícito do governo, até o colapso inevitável".

Além disso, "a grande riqueza que o setor financeiro criou e concentrou deu aos banqueiros um enorme peso político".Agora, argumenta o professor Johnson, o peso do setor financeiro está impedindo a solução da crise. Os bancos "não querem reconhecer a plena extensão de suas perdas, porque isso provavelmente os exporia como insolventes... Este comportamento é corrosivo: bancos não saudáveis ou não emprestam (acumulando dinheiro para escorar as reservas) ou fazem apostas desesperadas em empréstimos e investimentos de alto risco que podem dar um alto retorno, mas provavelmente não pagarão nada. De qualquer forma, a economia sofre ainda mais e, assim, os próprios ativos dos bancos continuam deteriorando - criando um ciclo altamente destrutivo".

Essa análise faz sentido? Esta é uma pergunta na qual pensei durante minha estadia recente de três meses em Nova York e visitas a Washington, DC, a atual capital financeira mundial. Eles são o motivo para a análise do prof. Johnson ser tão importante.Sem dúvida, nós testemunhamos uma enorme ascensão da importância do setor financeiro. Em 2002, o setor gerou impressionantes 41% dos lucros corporativos domésticos dos Estados Unidos. Em 2008, a dívida privada americana chegou a 295% do produto interno bruto, um recorde, em comparação a 112% em 1976, enquanto a dívida do setor financeiro atingiu 121% do PIB em 2008. O salário médio no setor saltou de próximo da média de todos os setores entre 1948 e 1982 para 181% dela em 2007.Em uma pesquisa recente, Thomas Philippon da Escola Stern de Administração e Negócios da Universidade de Nova York, e Ariell Reshef, da Universidade da Virgínia, concluíram que o setor financeiro foi um setor de alta capacitação e altos salários entre 1909 e 1933. Ele então caiu em relativo declínio até 1980, quando de novo começou a ser um setor de alta capacitação e altos salários.*
Eles concluíram que a principal causa foi a desregulamentação, que "libera criatividade e inovação, aumentando a demanda por funcionários altamente capacitados".A desregulamentação também gera crescimento do crédito, a matéria-prima com a qual o setor financeiro cria e da qual se alimenta. A transmutação do crédito em renda é o motivo da lucratividade do setor financeiro poder ser ilusória. Igualmente, a expansão do setor financeiro reverterá, pelo menos dentro dos Estados Unidos: o crescimento do crédito e da alavancagem mascararam a lucratividade baixa e mesmo inexistente de grande parte das atividades, que desaparecerá, e parte da dívida também deve ser liquidada. A era dourada de Wall Street acabou: o retorno da regulamentação é a causa e consequência desta mudança.

Mas o prof. Johnson apresenta um argumento mais forte do que esse. Ele argumenta que a recusa de instituições poderosas em admitir as perdas -ajudadas e com a cumplicidade de um governo atrelado aos "donos do dinheiro"- pode impossibilitar uma saída da crise. Além disso, como os Estados Unidos desfrutam do privilégio de serem capazes de tomar empréstimos em sua própria moeda, é muito mais fácil para eles do que para as meras economias emergentes encobrir as rachaduras, transformando a crise em um mal econômico de longo prazo. Assim, nós testemunhamos uma série de improvisos ou "acordos" cuja meta real é resgatar o máximo possível do sistema financeiro da forma mais generosa que os autores de políticas acham que podem escapar impunes.Eu concordo com as críticas às políticas adotadas até agora. No debate no fórum dos economistas do "Financial Times" sobre a "parceria de investimento público/privado" do secretário do Tesouro, Tim Geithner, as críticas são acertadas: se funcionar, será por causa de sua forma não-transparente de transferir riqueza dos contribuintes para os bancos. Mas é improvável preencher o buraco de capital que os mercados estão ignorando no momento, como argumenta Michael Pomerleano. Nem sou persuadido de que os "testes de tensão" em andamento sobre o capital dos bancos levarão a uma ação que preencherá o buraco de capital.

Mas estas fraquezas transformam os Estados Unidos na Rússia? Não. Em muitas economias emergentes, a corrupção é notória e descarada. Nos Estados Unidos, a influência vem tanto de um sistema de crenças quanto do lobby (apesar do segundo não estar ausente). O que era bom para Wall Street era considerado bom para o mundo. O resultado foi um programa bipartidário de desregulamentação imprudente para os Estados Unidos e, dada sua influência, o mundo.

Além disso, a crença de que Wall Street precisa ser preservada em grande parte como é agora se deve principalmente ao medo. A visão de que instituições grandes e complexas são grandes demais para falir pode estar errada. Mas é fácil entender por que autores de políticas inteligentes receiam testá-la. Ao mesmo tempo, os políticos temem uma reação pública contrária a grandes injeções de capital público. Assim, como o Japão, os Estados Unidos estão presos entre o medo da falência da elite e a revolta popular contra os resgates. Este é um fenômeno mais complexo do que o "golpe silencioso" descrito pelo prof. Johnson.Mas uma reestruturação decisiva é de fato necessária. Não porque o retorno da economia ao crescimento alimentado pela dívida dos últimos anos seja viável ou desejável.

Mas duas coisas precisam ser obtidas: primeiro, as principais instituições financeiras devem se tornar solventes de forma crível; e, segundo, nenhuma instituição financeira com fins lucrativos pode se tornar grande demais para falir. Isto não é capitalismo, mas socialismo. Este é um dos pontos em que a direita e a esquerda concordam. Elas estão certas. A falência - e os prejuízos aos credores sem seguro - deve fazer parte de qualquer solução durável. Sem esta mudança, a solução desta crise só poderá ser a precursora da próxima.

*Salários e Capital Humano no Setor Financeiro Americano de 1909-2006, janeiro de 2009, www.nber.org

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