[Francis] Fukuyama inventou a versão moderna da frase do fim da história, e o que ele quis dizer foi que chegamos a uma fase da história em que não podemos ver nada diferente do mundo em que vivemos: de um lado, a democracia parlamentarista e, de outro, o sistema capitalista, com competição e mercados abertos. Acho que não se pode mais tomar essa posição como aceitável, pois uma sociedade de baixo carbono provavelmente mudará bastante o comportamento das pessoas, o modo como veem o mundo. Pode envolver uma crítica forte de viver num tipo de sociedade baseada no consumo, sem outros valores. O que quis dizer foi que temos de nos preparar para pensar novamente de modo muito radical lá na frente. É claro que, agora, temos de lidar com o mundo como o vemos. Mas sou a favor de um retorno parcial a certo utopismo. O mundo que criamos é insustentável, sabemos que não podemos continuar como estamos.
Vejo o Brasil como um negociador ou uma terceira parte nas negociações entre os EUA, a União Europeia e a China. Vejo o Brasil capaz de ter uma liderança entre os países de industrialização recente para levar os outros países a uma posição decente. O país pode ter um papel bastante importante, e seria desejável se de fato o exercesse. Mas isso também depende de uma liderança política forte.
FOLHA - Estamos vivendo a pior crise econômica desde a Grande Depressão. Quais serão seus efeitos?GIDDENS - Depende de em que nível você está falando. Nos próximos dois anos e no momento, ninguém sabe realmente o que acontecerá, independentemente de suas credenciais acadêmicas. Se haverá declínio contínuo com desemprego crescente ou se, nesse período, haverá algum tipo de recuperação, pelo menos em algumas áreas. Ambos são possíveis. Muito depende de um fenômeno do qual ainda estamos nas mãos: o mercado. Toda vez que uma decisão é tomada, as pessoas querem saber como os mercados irão reagir. Ainda estamos nas mãos do mercado global, para o bem e para o mal. No médio prazo, pessoas como eu deveriam estar pensando em um modelo de capitalismo responsável. Pois existe uma convergência entre o debate sobre mudanças climáticas e a recessão, por razões óbvias. Nos dois casos, estamos falando de um papel forte do Estado e de mais regulação, de um planejamento de longo prazo que não houve antes, de controlar mecanismos de mercado de modo mais efetivo do que foi feito nos últimos 30 anos, de inovações tecnológicas. Mas ainda estamos no estágio inicial de descobrir o que seria um novo modelo de capitalismo responsável e global. A crise é mundial, não importa o que a Europa ou os EUA façam. Essa é uma questão em aberto, pois os países não têm sido bons em chegar a acordos, mesmo quando é de seu interesse. A Rodada Doha e a Organização Mundial do Comércio são exemplos perfeitos.
GIDDENS - A globalização é um termo que abarca muitas mudanças, e é preciso quebrá-lo em várias partes. Há alguns aspectos muito improváveis de serem revertidos, como a revolução das comunicações, uma das maiores forças da globalização. Goste-se ou não, isso ainda será o futuro: o mundo estará integrado imediatamente pela tecnologia e quase certamente isso continuará a ter avanços. Nesse sentido, a globalização está aqui para ficar. Mas, quando se fala em livre mercado, é diferente. Alguns aspectos podem ser revertidos, isso já aconteceu antes, e, em uma situação de recessão, as pessoas tendem a se voltar para seus países. Mas, se sabemos alguma coisa de teoria econômica, é que protecionismo, no final, prejudica sua própria economia. Nenhuma economia que se isolou do mercado global conseguiu realmente prosperar. Pessoalmente, não acho que o protecionismo voltará, como nos anos 1930.
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