O nervoso e irado do Collor, o novo companheiro de certa esquerda |
Abaixo, recomendo a leitura do artigo de Demétrio Magnoli no Globo de hoje, em negrito o que considero importante. Repito estão perdendo o foco, a CPI do Cachoeira não foi composta para avaliar a conduta da Veja, mas para investigar as relações que os tentáculos do bicheiro tem com o governo federal e diversos estados, governados por tucanos, petistas e pemedebistas. Bilhões de reais em dinheiro público estão envolvidos. Esse é o foco.
Os Bons Companheiros
De “caçador de marajás”, Fernando Collor transfigurou-se em caçador de jornalistas. Na CPI do Cachoeira, seu alvo é Policarpo Jr., da revista “Veja”, a quem acusa de associar-se ao contraventor “para obter informações e lhe prestar favores de toda ordem”. Collor calunia, covardemente protegido pela cápsula da imunidade parlamentar. Os áudios das investigações policiais circulam entre políticos e jornalistas ─ e quase tudo se encontra na internet. Eles atestam que o jornalista não intercambiou favores com Cachoeira. A relação entre os dois era, exclusivamente, de jornalista e fonte ─ algo, aliás, registrado pelo delegado que conduziu as investigações.
Jornalistas obtêm informações de inúmeras fontes, inclusive de criminosos. Seu dever é publicar as notícias verdadeiras de interesse público. Criminosos passam informações ─ verdadeiras ou falsas ─ com a finalidade de atingir inimigos, que muitas vezes também são bandidos. O jornalismo não tem o direito de oferecer nada às fontes, exceto o sigilo, assegurado pela lei. Mas não tem, também, o direito de sonegar ao público notícias relevantes, mesmo se sua divulgação é do interesse circunstancial de uma facção criminosa.
Os áudios em circulação comprovam que Policarpo Jr. seguiu rigorosamente os critérios da ética jornalística. Informações vazadas por fontes diversas, inclusive a quadrilha de Cachoeira, expuseram escândalos reais de corrupção na esfera federal. Dilma Rousseff demitiu ministros com base naquelas notícias, atendendo ao interesse público. A revista na qual trabalha o jornalista foi a primeira a publicar as notícias sobre a associação criminosa entre Demóstenes Torres e a quadrilha de Cachoeira ─ uma prova suplementar de que não havia conluio com a fonte. Quando Collor calunia Policarpo Jr., age sob o impulso da mola da vingança: duas décadas depois da renúncia desonrosa, pretende ferir a imprensa que revelou à sociedade a podridão de seu governo.
A vingança, porém, não é tudo. O senador almeja concluir sua reinvenção política inscrevendo-se no sistema de poder do lulopetismo. Na CPI, opera como porta-voz de José Dirceu, cujo blog difunde a calúnia contra o jornalista. Às vésperas do julgamento do caso do mensalão, o réu principal, definido pelo procurador-geral da República como “chefe da quadrilha”, engaja-se na tentativa de desqualificar a imprensa ─ e, com ela, as informações que o incriminam.
O mensalão, porém, não é tudo. A sujeição da imprensa ao poder político entrou no radar de Lula justamente após a crise que abalou seu primeiro mandato. Franklin Martins foi alçado à chefia do Ministério das Comunicações para articular a criação de uma imprensa chapa-branca e, paralelamente, erguer o edifício do “controle social da mídia”. Contudo, a sucessão representou uma descontinuidade parcial, que se traduziu pelo afastamento de Martins e pela renúncia ao ensaio de cerceamento da imprensa. Dirceu não admitiu a derrota, persistindo numa campanha que encontra eco em correntes do PT e mobiliza jornalistas financiados por empresas estatais. Policarpo Jr. ocupa, no momento, o lugar de alvo casual da artilharia dirigida contra a liberdade de informar.
No jogo da calúnia, um papel instrumental é desempenhado pela revista “Carta Capital”. A publicação noticiou falsamente que Policarpo Jr. teria feito “200 ligações” telefônicas para Cachoeira. Em princípio, nada haveria de errado nisso, pois a ética nas relações de jornalistas com fontes não pode ser medida pela quantidade de contatos. Entretanto, por si mesmo, o número cumpria a função de arar o terreno da suspeita, preparando a etapa do plantio da acusação, a ser realizado pela palavra sem freios de Collor. Os áudios, entretanto, evidenciaram a magnitude da mentira: o jornalista trocou duas, não duzentas, ligações com sua fonte.
A revista não se circunscreveu à mentira factual. Um editorial, assinado por Mino Carta, classificou a suposta “parceria Cachoeira-Policarpo Jr.” como “bandidagem em comum”. Editoriais de Mino Carta formam um capítulo sombrio do jornalismo brasileiro. Nos anos seguintes ao AI-5, o atual diretor de redação de Carta Capital ocupava o cargo de editor de “Veja”, a publicação na qual hoje trabalha o alvo de suas falsas denúncias. Os editoriais com a sua assinatura eram peças de louvação da ditadura militar e da guerra suja conduzida nos calabouços. Um deles, de 4 de fevereiro de 1970, consagrava-se ao elogio da “eficiência” da Operação Bandeirante (Oban), braço paramilitar do aparelho de inteligência e tortura do regime, cuja atuação “tranquilizava o povo”. O material documental está disponível no blog do jornalista Fábio Pannunzio, sob a rubrica “Quem foi quem na ditadura”.
Na “Veja” de então, sob a orientação de Carta, trabalhava o editor de Economia Paulo Henrique Amorim. A cooperação entre os cortesãos do regime militar renovou-se, décadas depois, pela adesão de ambos ao lulismo. Hoje, Amorim faz de seu blog uma caixa de ressonância da calúnia de Carta dirigida a Policarpo Jr. O fato teria apenas relevância jurídica se o blog não fosse financiado por empresas estatais: nos últimos três anos, tais fontes públicas transferiram bem mais de um milhão de reais para a página eletrônica, distribuídos entre a Caixa Econômica Federal (R$ 833 mil), o Banco do Brasil (R$ 147 mil), os Correios (R$ 120 mil) e a Petrobras (que, violando a Lei da Transparência, se recusa a prestar a informação).
Dilma não deu curso à estratégia de ataque à liberdade de imprensa organizada no segundo mandato de Lula. Mas, como se evidencia pelo patrocínio estatal da calúnia contra Policarpo Jr., a presidente não controla as rédeas de seu governo ─ ao menos no que concerne aos interesses vitais de Dirceu. A trama dos bons companheiros revela a existência de um governo paralelo, que ninguém elegeu.
3 comentários:
Maia,
Respondo o título do post com outra pergunta: "Mas de quê, afinal, tem medo os barões da mídia?"
O artigo é um Ad Hominem interminável. Desqualifica Mino Carta (era coadjuvante da ditadura), tenta proteger Policarpo com argumentos ingênuos, apelando pra "fé" de quem lê.
Tem um único endereço: desqualificar a CPI.
Eu te faço uma pergunta só, Maia: Policarpo teve uma relação correta, ética, com Cachoeira por quase dez anos. Neste tempo, nunca, nunquinha, percebeu que o cara era criminoso?
E, se percebeu, por que nunca o denunciou? Não dava uma matéria boa?
Se Policarpo usou seu posto na Veja para facilitar o desvio dos "bilhões de reais em dinheiro público", ele (e a revista Veja) devem ser foco de investigação, sim, como possíveis cúmplices.
Confundir isso com "assalto à liberdade de imprensa" é conversa pra boi-anti-petista ficar feliz.
Ainda acho incrível o tamanho da mobilização em defesa da Veja. É só uma revista, que pisou na bola MUITAS vezes.
E, se são verdadeiras as acusações da imprensa "chapa-branca" (outro ad hominen bobinho) a respeito do "Poli", a revista é suja mesmo.
Sério, por que defender a Veja? Tem outras revistas por aí!
Guimas, o debate é bem mais complicado. Não se trata da Veja, que não está acima do bem e do mal, mas de ficarmos atento por movimentos que querem fazer o controle social da mídia. Este é o ponto. Em nenhum lugar socialmente desenvolvido existe controle social e político da mídia. O controle que existe sobre a mídia ( e a sociedade tem que ter esse controle) é do Judiciário. Assim aconteceu com o jornaleco de Murdoch em Londres (fechado por seu dono), mas que pisou na bola pois cometeu crimes de chantagem e de violação à privacidade.
A CPI do Cachoeira ouviu dois delegados da PF que ouviram todas as gravações. Os dois disseram a mesma coisa, a relação de Policarpo com Cachoeira é apenas de jornalista em busca do fato.
Claro que Policarpo sabia que Cachoeira é bicheiro, mas não existe nenhuma prova de que Policarpo sabia de eventuais desvios de dinheiro público e tenha se calado.
Certa esquerda reacionária está usando o caso Cachoeira não para verificar os desvios de dinheiro público, mas para fazer uma CPI da mídia, cuja consequência pode ser horrorosa para a sociedade: o controle social da mídia.
Maia,
Essa coisa de ponto de vista é divertida.
Nas eleições já se bateu na tecla do "controle social da mídia". Nada aconteceu, e Dilma se elegeu (ainda bem, Serra seria um erro terrível). A mídia continua livre, leve e solta. E impune.
Esta é a enganação maior, o engodo: certa mídia reacionária quer carta verde para atuar como partido político, mas sem as regras dos partidos políticos. E, num país onde a justiça é como é no Brasil, a mídia efetivamente atua sem regras.
Estou com FHC: há necessidade urgente de regulação da mídia. Usando o teu jargão, Maia, não há nenhum país socialmente desenvolvido onde não há regulação da mídia. E não somente pelo judiciário.
Quanto ao "Poli", faço um paralelo com o Amaury Ribeiro Jr., e seu livro: ele foi atacado e processado por supostamente ter obtido dados sigilosos sobre Veronica Serra ilegalmente, com intuitos políticos - fazer dossiês para o PT.
Onde esteve a grita defendendo a liberdade da imprensa neste caso? Em lugar nenhum. Não interessava (e ainda não interessa) o que Amaury descobriu, pois não atinge as pessoas certas.
Maia, com uma elite tão atrasada como essa, que se dispõe a colocar todo um aparato midiático para se defender sem restrições, como esperas que o Brasil mude? Se nem punir uma revista que publica mentiras com intuito explicitamente político se aceita?
E com uma minoria endinheirada e atuante defendendo essa mídia, sob o espectro falso e bobo do medo do "controle social da mídia"?
Numa coisa concordo contigo: não se trata da Veja. Se trata de investigar se a Veja foi acessório no esquema de corrupção (o que, na minha modesta opinião, é evidente).
PS.: curiosa a tua comparação com o "jornaleco em Londres": ele foi fechado antes do processo. Aqui, só de se falar em processo (ou investigação) as beldades defensoras da imprensa já tem chiliques.
É dose.
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