Diversidade, Liberdade e Inclusão Social

Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Esses Americanos.....


Halloween


Dias das Bruxas


Kathleen Parker


O halloween, ou Festa das Bruxas, antecede a eleição presidencial americana em poucos dias. A impressão que se tem é que um evento condiz com o outro. "Arrepiante" é uma palavra apropriada para descrever o que vem acontecendo nas horas finais.Nas últimas semanas, a campanha de John McCain tenta meter medo nos eleitores para convencê-los a votar nele -e, o mais arrepiante de tudo, na governadora Sarah Palin, a malandra Mulher Maravilha da minúscula Wasilla.Palin, que recentemente se descreveu como "Redneck Woman" (mulher caipira), título de um sucesso da cantora country Gretchen Wilson e papel que a candidata a vice costuma representar quando inicia seus comícios, tem repetido e aprofundado o tema de que não se pode confiar em Obama. Ele "anda por aí" com terroristas, diz ela, e não vê a América do mesmo modo como "nós" a vemos."Dobra, dobra, labuta e provação/ Arde fogo e borbulha caldeirão."As tentativas de vincular Obama ao ex-terrorista Bill Ayers, antigo membro do grupo dos anos 1960 Weather Underground, encontraram eco entre poucos exceto integrantes da base republicana. Hoje Ayers é professor universitário em Chicago e, embora ainda seja radical, está longe de integrar o círculo estreito dos assessores de Obama.Tirando isso, a narrativa de que Obama "não é exatamente um de nós" vem dando resultado contrário ao pretendido. O que Palin inspira entre alguns de seus admiradores é algo repulsivo o suficiente para assustar até mesmo os foliões adultos do Halloween. Embora os racistas não sejam exclusividade do Partido Republicano, os da direita se sentem liberados pelo espírito da mensagem de Palin. Alguns poucos lançaram epítetos racistas em comícios. Um homem recentemente exibiu um boneco do personagem animado George, o Curioso, um macaco, usando como chapéu um adesivo de Obama. Ele ergueu o objeto diante da câmera de um repórter e então se afastou, rindo.O rosto dele não era o do Partido Republicano de Abraham Lincoln.McCain vem tentando distanciar-se da raiva e hostilidade que freqüentemente permeiam seus comícios, mas é lamentavelmente pouco convincente. Às vezes suas tentativas de agir com decência só pioram as coisas, como aconteceu quando uma mulher disse a ele que não confia em Obama porque ele é árabe. Tirando o microfone das mãos dela, McCain tentou acalmá-la, dizendo: "Não, senhora. Ele é um homem decente, pai de família, um cidadão com quem eu, por acaso, tenho divergências."Isso com certeza deve ter tranquilizado árabes em toda parte. Obama não é árabe. Ele é um homem decente. Um pai de família. Com uma diplomacia como essa, quem precisa de propaganda para recrutar terroristas?Enquanto isso, a pior ofensa de Obama até agora foi aprovar um anúncio -intitulado "A Escolha Dele"- que mostra Sarah Palin dando uma piscadela. De onde eles tiraram essa idéia? O anúncio foca a fraqueza de McCain em questões econômicas, fraqueza para a qual o próprio McCain chamou a atenção várias vezes nos últimos meses. O anúncio mostra algumas frases do candidato republicano, concluindo com uma que ele proferiu no debate de 28 de novembro de 2007 e que é especialmente negativa para ele: "Eu talvez precise depender dos conhecimentos especializados de economia de um vice-presidente que escolher", disse McCain. O quadro seguinte mostra Palin durante o debate vice-presidencial, mexendo os lábios, sem que saia nenhum som, e dando piscadelas.As reações do campo de McCain foram imediatas e tolas. "É sexista", gritaram. Mesmo a presidente da seção de Los Angeles da feminista Organização Nacional para Mulheres disse que o anúncio "amesquinha as mulheres".Correção: as piscadelas e os acenos de cabeça de Sarah Palin durante o debate entre os candidatos a vice foram sexistas e amesquinharam todas as mulheres que esperam avançar na vida graças ao trabalho duro e ao mérito. Desde a perspectiva dessas mulheres, a performance de Palin, como se estivesse num concurso de miss, enviou outra mensagem subliminar: que, quando uma mulher não sabe a resposta a uma pergunta, pode abrir caminho até o topo flertando.Vaias para ela!


Tradução de Clara Allain

KATHLEEN PARKER é colunista do "Washington Post" e comentarista da NBC; ela escreveu esta coluna para a Folha

"Presença da Intertextualidade nos Gêneros Textuais"


Abaixo Machado de Assis!

David Coimbra


Por Deus que o imeil que vou reproduzir abaixo é verdadeiro. Recebi-o dias atrás. É de uma aluna de um colégio particular de Porto Alegre. Ó:“Olá. Estudo na oitava série. Tenho que fazer um trabalho de português sobre a presença da intertextualidade nos gêneros textuais e um deles são as crônicas. Gostaria de saber se você sabe de alguma crônica que tenhas feito com a presença da intertextualidade (polifonia) que possas me mandar. Desde já agradeço.”

Terminei de ler o imeil e fiquei parado, fitando o vazio. Assim permaneci por, sei lá, três, cinco, 10 minutos. Reli o imeil. “Presença da intertextualidade nos gêneros textuais”. E agora? O que responderia para a pequena aluna em apuros com suas tarefas escolares? Doloroso dilema. Porque, na verdade, o burrão aqui não sabe o que é intertextualidade, quanto mais identificar sua presença nos gêneros textuais, seja lá o que forem eles.Pior: a menina que me perguntou sobre intertextualidade e polifonia e tudo mais, ela está na oitava série. Quantos anos tem um aluno de oitava série? Quatorze? E já está lidando com a intertextualidade... Quer dizer: sou, realmente, um imbecil.O problema é que suspeito existirem vários imbecis parecidos comigo. Gente pouco interessada na intertextualidade. Cultivo inclusive a desconfiança de que conhecer os meandros da intertextualidade talvez não seja exatamente útil para a imensa maioria das pessoas, mesmo aquelas que, como eu, ganham a vida escrevendo. Então, alguém aí me diga: por que uma aluna da oitava série está estudando esse troço???Eis uma reflexão pertinente para um dia como hoje, de abertura da Feira do Livro. A leitura é o alicerce da Educação, todo mundo sabe disso. E todo mundo também sabe que o Brasil é um país que não lê. No Brasil, um livro que vende 2 mil exemplares é best-seller, e o número de todas as livrarias do país não ultrapassa o da cidade de Buenos Aires. Vivemos numa nação em que grande parte dos habitantes não sabe interpretar o sentido de uma frase direta, sujeito, verbo, complemento.Por que isso? Por causa da intertextualidade. Como podem falar de intertextualidade com alunos de oitava série? Ou de transitivo direto? Por favor! A estrutura do ensino no Brasil é formulada para que os jovens sintam nojo da palavra escrita. Gramática, cruzcredo. O ensino da gramática devia ser vetado pelo menos até os últimos anos do segundo grau. Uma vírgula ou um acentinho, volta e meia, tudo bem, mas não me venham com pronomes oblíquos.Dêem livros aos alunos. Que eles leiam o tempo todo. Leiam e interpretem, leiam e escrevam. E que os professores corrijam os textos e expliquem por que os corrigiram. Livros! Mas também não me venham com autores que escrevem destarte e outrossim. Não estou falando dos piores do século 19, como o tal Joaquim Manuel de Macedo e sua insuportável Moreninha; estou falando do melhor: Machado de Assis. Não empurrem Machado de Assis para menores de 16 anos, por favor. Se não quiserem lhes dar um Verissimo, que seja o Harry Potter, que seja O Código da Vinci. Não deixem as crianças ficar com raiva de livro!


quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Nas Raias da Ideologia




O diario gauche de hoje diz que o prefeito reeleito de Porto Alegre, José Fogaça, é o novo darling da direita guasca. Eu comento depois.



José Fogaça é o novo darling da direita guasca
O arranjo maragato para 2010 está sendo montado agora. Não vê, quem não quer. A coisa é escancarada, despudorada. O jornal Zero Hora de hoje mostra sobradas razões para que o senso comum sulino assimile com naturalidade e entusiasmo a nova liderança a ser investida como governador do Estado. Eles chegam ao requinte de estampar uma declaração (inédita) da governadora Yeda Rorato Crusius de que não disputará a reeleição.
Depois de se ler o diário da Azenha, hoje, a conclusão é quase um imperativo categórico: o substituto de Yeda Rorato Crusius é José Alberto Fogaça de Medeiros, do PMDB. Não tem outro. Este é o homem.
A carga publicitária da RBS não tem um traço sequer de censura ao fato de que Fogaça acabou de se eleger prefeito municipal para um mandato de quatro anos, portanto, que terminariam somente em 2012. Em abril de 2002, quando o então prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, renunciou ao cargo para disputar as eleições ao Piratini, recebeu da mesma RBS as maiores reprovações morais por não cumprir com a integralidade do mandato conferido pelos seus eleitores.
As eleições estaduais de 2010 começaram nesta semana, nos veículos da RBS. A construção de uma candidatura forte e invencível começa cedo, e reveste-se de cuidados para bem além da objetividade fria da política, porque trata de projetar um pequeno mito no imaginário do senso comum, buscando a montagem de uma “persona” que seja dotada de todas as subjetividades positivas com acréscimos de carisma, bonomia, firmeza, e capacidade de liderança.
José Fogaça não é nada disso, mas os escultores de candidaturas amigas da RBS tratarão de entregar o “produto” imagético pronto e acabado até março de 2010.
Mãos à obra.


Meu pitaco:

Como é lindo esse discurso de certa esquerda que aponta -- com dedo bem em riste -- que qualquer pessoa que não tenha fé na religião do materialismo histórico, como sendo de direita. O José Serra, que sempre foi um cara de esquerda, virou um totalitário de direita. O Fogaça, que também nunca foi de direita, se transformou num fascista de extrema direita. Os editores da mídia alternativa deveriam ter um pouquinho mais de cuidado antes de distribuirem suas merendas e suas hóstias aos seus fieis.

Afinal, que diferença ideológica existe, por exemplo, entre Serra e Dilma? Os dois nadam na mesma raia da social-democracia. Não foi o Serra que bateu de frente com as grandes indústrias farmacêuticas e criou os genéricos? Isso, por acaso, é uma praxis liberal? Na piscina da humanidade, certa esquerda se acha a dona dos troféus e apenas entrega suas medalhas para aqueles que se enquadram nos seus preconceitos. Nada mais falso do que a intempestiva assertiva de que a raia onde só a esquerda pode nadar é somente aquela onde as marolas se direcionam para a fé do materialismo histórico. Se, por acaso, o atleta resolve invadir outra raia onde o mercado gosta de circular ele é visto como um nadador neoliberal. Essa é uma tese que já naufragou. Avisem a orquestra. Luc Ferry é que está certo, uma dos fatores mais inócuos e impertinentes dos nossos tempos é a discussão ideologica e religiosa.

É impressionante como a ideologia da igreja católica que atrasou o Brasil durante séculos e séculos continua a ter um paradoxal efeito no pensamento reacionario de certa esquerda. Para esses, enriquecer é mesmo uma burrice. Espírito empreendedor? é pecado. Empresário é ganancioso, como disse uma vez o companheiro ex governador. Por isso os nadadores das marolas da raia bem à esquerda adoram a dinastia Castro em Cuba, onde o empreendorismo é sufocado com armas e prisões. Não importa se o empreendedor vai fazer benfeitorias para o povo, melhorar as condições de vida, gerar lazer, cultura (até mesmo a construção do Museu Iberê foi criticada pelo Diário Gauche), o que efetivamente importa aqui é o lado irrelevante e fransiscano da questão: ele não pode ter lucro ou como a religião impõe como grave transgressão: o sacrilégio da mais valia. Depois eles ficam se queixando que os candidatos de certa esquerda perdem as eleições nas capitais brasileiras do centro sul.

Perniciosas Assimetrias - George Soros


Um cara que eu admiro é George Soros. Ele tem visão de mundo, tem cultura, escreve bem e tem boas opiniões. Artigo dele na Folha de hoje. Os grifos, em negrito, são do ditador deste blog.


EUA devem se lembrar de emergentes

George Soros - Financial Times


O sistema financeiro mundial, na forma pela qual está constituído agora, se caracteriza por uma perniciosa assimetria. As autoridades dos países desenvolvidos estão no comando e farão o que for necessário para impedir que o sistema entre em colapso. Mas o destino dos países periféricos as preocupa menos. O sistema oferece menos estabilidade e menos proteção a esses países do que aos países centrais.Essa assimetria, encapsulada no direito de veto dos Estados Unidos no FMI (Fundo Monetário Internacional), explica por que os americanos conseguiram acumular um déficit em conta corrente cada vez mais elevado no último quarto de século. O chamado Consenso de Washington impôs forte disciplina de mercado a outros países, mas os norte-americanos ficaram isentos dela. A crise dos mercados emergentes em 1997 devastou países periféricos como Indonésia, Brasil, Coréia do Sul e Rússia, mas deixou os Estados Unidos ilesos. Subseqüentemente, muitos dos países periféricos adotaram políticas macroeconômicas sólidas e uma vez mais passaram a atrair grandes influxos de capital, o que lhes valeu crescimento econômico acelerado nos últimos anos.Então surgiu a crise financeira, que se originou nos Estados Unidos. Até recentemente, países periféricos, como o Brasil, haviam passado em larga medida intocados e até se beneficiado do boom de commodities. Mas, depois da quebra do Lehman Brothers, o sistema financeiro sofreu uma parada cardíaca temporária e as autoridades dos Estados Unidos e da Europa tiveram de recorrer a medidas desesperadas.Elas decidiram que não deveriam permitir a quebra de qualquer outra instituição financeira de grande porte e também instauraram garantias de depósitos contra possíveis perdas. Isso resultou em conseqüências adversas inesperadas para os países periféricos, e suas autoridades foram apanhadas de surpresa.Nos últimos dias, houve fuga generalizada rumo à segurança, da periferia para o centro. As moedas locais caíram frente ao dólar e ao iene. As taxas de juros e os ágios nas operações de "credit default swap" dispararam, e as Bolsas despencaram.Os pedidos de cobertura de margem proliferaram e se espalharam aos mercados de ações dos Estados Unidos e da Europa, gerando o espectro de um pânico renovado.O FMI discute a criação de novas linhas de crédito para os países periféricos, em contraste com as linhas condicionais de crédito que não vêm sendo usadas porque as condições que comportam são por demais onerosas. Essas novas linhas de crédito não envolveriam precondições ou estigmas, para os países que estejam seguindo políticas macroeconômicas sólidas. Além disso, o FMI se declarou pronto a conceder crédito condicional a países menos qualificados. Islândia e Ucrânia já assinaram pacotes, e a próxima da fila é a Hungria.A abordagem é a correta, mas pode ser insuficiente, e talvez esteja chegando tarde demais.O máximo que essas linhas de crédito permitiriam em termos de saque seria cinco vezes o valor da cota do país.No caso do Brasil, isso equivaleria a US$ 15 bilhões, um valor ínfimo comparado às reservas cambiais brasileiras superiores a US$ 200 bilhões. Um pacote muito maior e mais flexível é necessário, para reassegurar os mercados. Os bancos centrais dos países do centro deveriam criar grandes linhas para "swaps" com os bancos centrais dos países periféricos qualificados, e os países dotados de fortes reservas cambiais, como Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, China e Japão, deveriam estabelecer um fundo suplementar de desembolso mais flexível. Também há necessidade urgente de mais crédito de curto e de longo prazo para permitir que os países com posições fiscais sólidas pratiquem políticas keynesianas de investimento público anticíclico.
Apenas o estímulo à demanda interna permitirá eliminar o espectro de uma depressão mundial. Infelizmente, as autoridades mundiais estão sempre correndo atrás dos acontecimentos. É por isso que a crise financeira está escapando ao controle.Ela já envolveu os países do Golfo Pérsico, e Arábia Saudita e Abu Dhabi talvez estejam preocupados demais com sua região para que se disponham a contribuir na formação de um fundo mundial. É hora de começar a pensar sobre a criação de direitos especiais de saque ou outra forma de reserva internacional em larga escala, mas isso fica sujeito ao veto dos Estados Unidos.O presidente George W. Bush convocou uma conferência de cúpula do Grupo dos 20 em 15 de novembro, mas realizar uma reunião como essa seria irrelevante a não ser que os Estados Unidos estejam sendo sérios quanto a apoiar um esforço mundial de resgate.Os norte-americanos precisam dar o exemplo na proteção aos países periféricos contra uma tempestade que se originou em sua economia, se não desejam abrir mão de sua posição de liderança.Mesmo que Bush não concorde com esse ponto de vista, devemos esperar que o próximo presidente o faça.

O Iluminismo Americano




Fotografado do espaço por satélites, à noite, o mapa iluminado dos Estados Unidos reflete basicamente o resultado da última eleição presidencial no país, em 2004. Onde há concentração de luzes (e gente), venceram os democratas. Nas áreas menos iluminadas e escuras, levaram os republicanos e o presidente George W. Bush.Os rasgos de luzes estão posicionados em três faixas: nos extremos das costas Oeste (onde estão cidades mais liberais, como São Francisco e Los Angeles) e Leste (Nova York, Boston) e em uma grossa linha transversal na porção mais à direita do país, tendo Chicago, em Illinois, como pivô.Cada eleição tem a sua própria dinâmica. A atual nos EUA, daqui a cinco dias, tem como principal motivo condutor a promessa, de ambos os candidatos, de virar a amarga página do governo Bush. As pesquisas do momento apontam para a vitória do democrata Barack Obama. Para um negro de 48 anos em um país racista e conservador como os EUA, já é um feito extraordinário chegar aonde chegou. Mas não é só isso. Obama é também emissário de uma plataforma bem mais liberal do que a de seu antecessor democrata na Casa Branca, Bill Clinton (1993-2001), cujas posições em campanhas em quase nada se diferenciavam das dos republicanos.Para vencer, Obama parece estar contando mais com os novos eleitores e com os americanos (cerca de 40% do eleitorado) que regularmente deixam de votar nas eleições no país, onde o voto é facultativo. Apelando para a indignação dessa parcela, o democrata espera tirá-los do sofá na próxima terça.O mais impressionante, porém, não é a liderança de Obama a essa altura. Mas a resistência conservadora nos EUA. E as reais chances que seu adversário, John McCain, ainda tem de ganhar essa parada -mesmo tendo votado 90% das vezes alinhado a Bush no Senado.Vai se tornando também cristalino a cada dia que a atual crise nos EUA se assemelha a um tsunami.Algumas das grandes ondas já atingiram a praia, preparando o terreno para a maior delas, quando o desemprego começar a crescer com mais força, nos próximos meses.A dinâmica dessa crise, com origem no setor imobiliário, tende a afetar mais diretamente as áreas "menos iluminadas" no país, onde há maiores concentrações de proprietários de imóveis. Em grandes cidades, como Nova York e São Francisco, as proporções de casas alugadas chegam a 60%.Quem quer que seja, o novo presidente acabará rapidamente identificado negativamente com os fortes efeitos da crise, ao longo de 2009 e adiante. Se de fato for Obama, não será desta vez que boa parte dos EUA deixará o mundo das trevas.
FERNANDO CANZIAN é repórter especial da Folha.

Jogo Épico


Falaram que era dia do famoso "jogo épico". Mas o que eu vi foi uma goleada. Meu time perde os passos. Afunda na sua incompetência ofensiva e defensiva. Onde está o meio de campo? Estou com sono, mas ainda tenho voz para mostrar minha indignação. O campeonato embolou de vez. Era tudo o que a gente não queria. E agora, vivente?

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Salto Alto


Salto Alto - Calçado feminino que permite a mulher ficar a mesma altura que o homem.
No Brasil a expressão é usada como sinônimo de arrogância, fanfarronice ou autosuficiência.
Este post foi pescado do Blog do Luiz Favre, companheiro da Marta Suplicy.

Com Maradona A Seleção Argentina Vai Virar Pó!


Enriquecer é Burrice



O diário gauche de hoje critica, em vermelho bem vermelhado, o cartaz da 54ª Feira do Livro. Eu comento depois.

Criatividade em tempos de crise
Quem será o autor do cartaz publicitário da Feira do Livro de Porto Alegre, edição 2008?
É muito ruim o tal cartaz. Está assinado pela agência de publicidade denominada Matriz. Mostra a representação da fachada de uma casa construída com livros, simulando duas colunatas fake, dois chaminés de lareiras, varanda superior e térrea, evocando uma estética arquitetônica vitoriana/norte-americana.
Nada mais infeliz. A pessoa que concebeu isso teve a criatividade roçando o nível jegue. A crise financeira na qual o mundo chafurda originou-se na farra do crédito fácil baseado em hipotecas do quê mesmo? Ora, de casinhas simpáticas tal qual essa retratada no cartaz da agência Matriz.
E o slogan, então?
“Ler enriquece”. Falando de corda em casa de enforcado. Valoração de mau gosto para a conjuntura bicuda que vivemos. Ler enriquece e uma casinha estilo e-o-vento-levou (hipotecada) ao lado. Este é o cartaz oficial da 54ª Feira do Livro de Porto Alegre.
Inacreditável.

Meu comentário:

Eu achei bem legal o cartaz da feira do livro. É como se fosse uma casa de Lego feita de livros. Os tijolos são os livros, são os cimentos do nosso conhecimento. Ler capitaliza a nossa consciência, desaliena, nos prepara para a cidadania, nos ajuda a nos incorporar no mercado. E uma casa representa o que todo mundo mais deseja, inclusive aqueles que criticam o cartaz: viver com uma boa qualidade de vida. Todos deveriam ter a mesma possibilidade de morar em uma boa casa e de preferência cheia de livros e de conhecimentos. É uma pena que em um país como o Brasil, onde a capacidade empreendedora ainda é tão pequena, ainda existam pessoas que tenham preconceito com a construção de qualquer tipo de riqueza, inclusive a intelectual. Talvez para esses falte uma leitura de melhor qualidade.

Deve o Estado Deixar Que As Bolhas Explodam?


Presidente Americano Herbert Hoover. Na Crise de 1929 ele resolveu não injetar dinheiro público para salvar a crise. Fez bem ou fez mal?


A crise – vaticínio de Karl Marx, por Luiz Carlos da Cunha*
Em sua análise do capital, Marx propugnou por duas leis econômicas. A primeira inspirada na analogia da física então ciência proeminente , no processo de acumulação a quantidade se transforma em qualidade. A segunda lei, da qual podia se orgulhar o descobridor visionário a economia capitalista é auto-replicante e tende a crescer até um ponto crítico. Ponto crítico assinalado pela superprodução.A mecânica do produzir a mercadoria e digeri-la no mercado a tornaria cíclica. Seu companheiro Frederico Engels, vulgarizador do marxismo, explicava a lei exemplificando o processo de produção com o fabricante de chapéus. Quando o mercado se saturava de chapéus, advinha a paralisação do mercado e o capitalista não mais tinha a quem vender. Marx a descreveu em 1848. Em outubro de 1928 – 80 anos depois –, a crise aconteceu, culminante no “crash” da bolsa de Nova York. Era outubro de 1929: a queda brusca dos valores das ações. As industriais caíram 80% de valor de face; 11 mil bancos faliram em quatro dias; US$ 2 bilhões evaporaram; os preços dos produtos agrícolas encolheram 53%.


O Brasil, como outros países periféricos à época, foi duramente afetado. Os problemas econômicos e sociais gerados pela crise do café empurraram-nos para a Revolução de 30. Hoje, ainda que autoridades governamentais, por dever de ofício, menosprezem a semelhança de situações de 1929 e 2008, pecam por falsa aparência de tranqüilidade. O governo americano, quebrando seus pruridos contra o intervencionismo estatal no mercado, sob o pragmatismo republicano feroz, recorre às burras oficiais em socorro do sistema financeiro com US$ 700 bilhões. Para começar! Bush, o republicano de hoje, se contrapõe ao de 1928 – o presidente Hoover resistiu em recorrer ao dinheiro público para salvar as corporações. E quando, no ápice da crise, improvisou a Corporação de Reconstrução Financeira, já era tarde. Executivos e capitalistas, de súbito nivelados ao rés do chão da miséria, suicidavam-se do alto de suas torres imperiais na Wall Street. O desemprego varava os 20% nas cidades, e no campo as famílias famintas de Oklahoma deambulavam em busca de trabalho e esmola. A tragédia daqueles dias foi romanceada pelo Prêmio Nobel de Literatura John Steinbeck em As Vinhas da Ira.As ações bursáteis negociadas podem ser entendidas como empréstimos tomados pelos bancos e empresas ao poupador individual ou empresarial. Quando o somatório das ações corresponde ao valor daquilo que a empresa vale – e vale por aquilo que pode gerar em valor de venda, o mercado está estacionário. Quando este se encontra saturado e os compradores recuam ou somem, a produção estanca. As ações perdem o valor, porque não mais respondem ao valor real da empresa.O comércio de ações na bolsa adquire dinâmica própria, independente do processo produtivo. Distancia-se para mais ou para menos, na oscilação ondulatória das incertezas, do fascínio, do jogo, do risco calculado, do risco aleatório, na instabilidade do dia ou na estabilidade ilusória do lucro miraculoso e imediato. Até que a multiplicação das transações, o distanciamento do ficcional e do real que os papéis representam ou deveriam representar, atinge o ponto crítico – a quantidade se transforma em qualidade. Na penumbra supersticiosa do mercado, ante o pânico recessivo, o fantasma de Marx avulta, a lembrar que não morreu.

*Arquiteto e escritor.
Artigo na ZH de hoje.

Conversando Com Um Liberal Sobre a Crise Dos Nossos Dias




O Charlie, dono do Bunker, pediu para eu comentar um artigo do Frank Shostak do Mises Institut.
Esse artigo está aqui.
Não vou copiar e colar inteiro, porque ele é extenso.
Realmente é um bom artigo, Charlie!
Diz, em síntese o seguinte:

O problema do crédito: o que fazer para recuperar os mercados?

Apesar das ações concertadas dos governos e bancos centrais mundiais, as bolsas seguem caindo e a recessão mundial já bate à porta. Parece que apenas os seguidores da Escola Austríaca de economia não se surpreendem que tais atitudes não apenas são incapazes de impedir recessões, como, ao contrário, acabam por agravá-las.
(....)
No dia 7 de outubro, o presidente do Fed Ben Bernanke anunciou que o banco central americano estava pronto para intervir no mercado de títulos comerciais. O Fed agora passará a comprar títulos comerciais que foram emitidos por corporações e que estão com baixa liquidez - o que significa que o banco central americano agora fará empréstimos diretamente para corporações.
Parece que Bernanke está disposto a jogar trilhões de dólares no mercado para manter o sistema monetário vivo.
Bernanke é da visão de que uma das grandes causas da Grande Depressão dos anos 1930 foi a
omissão do banco central americano, que, segundo ele, não agiu rapidamente para reativar o então paralisado mercado de crédito. Por "ação rápida", Bernanke está se referindo a maciças injeções monetárias.
O presidente do Fed faz questão de nos relembrar continuamente que pelo menos ele aprendeu a lição da Grande Depressão e garantirá que o erro cometido pelo Fed não será repetido novamente.


Comentário meu: esse é um dado histórico interessante. Em 1929, o Estado americano não procedeu como está fazendo na presente crise: injetando dinheiro público para salvar os créditos.
Hoje estava falando com uma pessoa que aplica direto no mercado de ações e ele me disse que agora é o momento certo para quem tiver uma graninha extra aplicar neste mercado, porque as ações estão muito baixas. Efetivamente, elas estão menos que a metade, quase um terço do valor que havia antes da crise. Isso para uma economia como americana onde o povo investe e muito em ações é uma imensa catástrofe.
Continua o artigo, pulando algumas partes:

Os estrategistas econômicos dos bancos centrais gostam de dizer que o segredo para o crescimento econômico sustentável é um fluxo de crédito suave e estável. Para eles (e para Bernanke, em particular), é o crédito que fornece as bases para o crescimento econômico e eleva o padrão de vida dos indivíduos. Dessa perspectiva, faz muito sentido que os bancos centrais queiram que o crédito flua novamente.
Seguidores dos ensinamentos de Friedman e Keynes, é quase unanimidade entre eles que, quando os emprestadores estão relutantes a emprestar, é dever do governo e do banco central entrar em campo e manter ativo o fluxo de empréstimos.
(...)
Mas será que o aumento das injeções monetárias feitas pelos bancos centrais irá descongelar os mercados de crédito? Os experts acreditam que sim. Se a atual dose de injeção monetária não funcionar - como não está funcionando - então os bancos centrais devem continuar jorrando mais dinheiro até que os mercados de crédito voltem a se mexer - é nisso que eles acreditam.




Meu palpite: eis ai uma questão complicada. E se a crise continuar, persistir, se alargar no tempo e no espaço, devem os Bacens continuar a injetar dinheiro nos mercados de crédito? Ontem alguém numa dessas rádios que transmitem notícias disse: está todo mundo cansado no mercado de ações, o estresse é muito grande: quem sabe fechamos as bolsas por duas semanas? Todo mundo volta com cabeça mais tranquila e a crise se superar.....
Continua o artigo:


É verdade que o crédito é a chave para o crescimento econômico. Entretanto, deve-se fazer uma distinção entre crédito bom e crédito ruim. É o crédito bom que torna possível um real e sustentável crescimento econômico - e que, portanto, melhora de fato a vida das pessoas e seu bem-estar. O crédito falso, por sua vez, é um agente de destruição econômica e que leva ao empobrecimento.
(....)

Apesar da aparente complexidade que o sistema bancário introduz ao cenário, o crédito permanece sendo um ato de transferência de poupança real de um emprestador para um tomador de empréstimo. Se não houver um aumento no conjunto da poupança real, os bancos não poderão criar mais crédito. O crédito bom só poderá ser expandido pelo sistema bancário se houver uma concomitante expansão da poupança real.


(...)
Entretanto, o problema todo surge quando, ao invés de emprestar dinheiro totalmente lastreado, um banco começa a praticar reservas fracionárias: a emissão de dinheiro vazio, criado do nada, sem qualquer lastro.
Quando dinheiro é criado do nada, ele inicialmente se faz passar por dinheiro genuíno, dinheiro que supostamente está lastreado por alguma coisa real. Porém, na realidade, nada foi poupado. Portanto, quando esse dinheiro é emitido, ele não pode ajudar o sapateiro, uma vez que pedaços de papel vazio não podem ajudá-lo na produção de sapatos - o que ele de fato precisa é de pão. Porém, como o dinheiro impresso se faz passar por dinheiro legítimo, ele poderá sim ser utilizado para "roubar" o pão que iria para o sustento de outras atividades. E isso irá enfraquecer aquelas atividades.
Ou seja: quando você cria dinheiro do nada e utiliza esse dinheiro para obter algum bem, você está "roubando" esse bem daquela pessoa que de fato trabalhou e poupou para adquiri-lo. Logo, essa pessoa sairá enfraquecida.
É por isso que a criação de dinheiro não lastreado provoca um desvio da riqueza real.


Meu pitaco: Ai a questão é de controle e fiscalização do Estado sobre o mercado financeiro e de ações. Se o banco maquia seus ativos, seus balanços e isso passa e, no ano seguinte, ele continua a a proceder da mesma forma, até chegar a um ponto em que ele começa a se afundar, é questão de ausência total de fiscalização e controle dos organismos estatais para esse fim, como o Banco Central. A criação de dinheiro sem lastro, sem garantia, sem a contraparte é fraude.

(....)


Ao invés de facilitar a transferência de poupança para atividades geradoras de riqueza, quando os bancos emitem crédito não lastreado eles estão na verdade enfraquecendo o processo de formação de riqueza.
Em uma economia de genuíno livre mercado, onde ninguém imprime dinheiro e onde os indivíduos têm de produzir antes de consumir, nenhum distúrbio econômico pode acontecer. Para que distúrbios econômicos aconteçam, alguns indivíduos têm de conseguir dinheiro a troco de nada e em seguida trocar esse dinheiro por bens e serviços. Via de regra, isso ocorre quando a oferta monetária está se expandindo. Quando uma demanda que não é escorada pela produção aumenta, haverá um sobreaquecimento, que tomará a forma de aumento generalizado de preços.
Por causa dessa expansão monetária, várias atividades que antes não eram viáveis passarão a ser. Assim, várias bolhas surgirão nessa economia. E então, quando o banco central apertar sua postura monetária para impedir a elevação dos preços, essas atividades serão interrompidas. Observe que o que levou a essa postura contracionista do banco central foi justamente sua frouxa política monetária anterior.
Deve ser enfatizado que os bancos não podem perseguir implacavelmente uma política de empréstimos não lastreados se não houver um banco central dando sustento. O banco central, através de suas injeções monetárias, garante que a expansão de crédito fictício não faça com que os bancos quebrem uns aos outros.
Podemos assim concluir que, se o aumento dos empréstimos é totalmente lastreado por um aumento da poupança real, então essa é uma boa notícia, já que esse aumento promove a formação da riqueza real. Já o crédito falso, que é criado do nada, sem qualquer lastro, é uma má notícia: um crédito que não é lastreado por uma poupança real é um agente de destruição econômica.
As ações do banco central e do governo apenas pioram as coisas."



Na teoria eu concordo com esse ponto de vista. Realmente a atuação do Banco Central ao descarregar recursos para cobrir rombos do mercado é uma forma de capitalizar o crédito que não tem lastro. Ou seja estamos colocando dinheiro público bom em cima de dinheiro privado ruim. Isso é complicado. Mas, tal como aconteceu no Proer, nos temos do FHC, caso o Bacen não injetasse dinheiro para salvar ativos de bancos falidos exatamente porque seus créditos não tinham lastro, o que seria da economia brasileira? O certo é fazer com que os gestores desses créditos sem lastro sejam afastados da gestão e direção dessas instituições.



Nem o banco central e nem o governo são geradores de riqueza: eles não podem gerar poupança real. Isso significa que toda a injeção monetária que os governos vêm fazendo ultimamente não irá aumentar os empréstimos, a menos que o conjunto da poupança real esteja aumentando. Contrariamente, quanto mais dinheiro o Fed e os outros bancos centrais injetarem, mais eles estarão diluindo o conjunto da poupança real.
No entanto, a maioria dos comentaristas pensa que, dado o presente estado frágil do sistema financeiro, os bancos centrais e os governos devem intervir para impedir o colapso. Mas como os governos e os bancos centrais podem ajudar nesse aspecto? Como os bancos centrais e os governos podem gerar mais poupança real?
A única coisa que os governos e os bancos centrais podem fazer é tomar a poupança real de outras pessoas e distribuí-la para os bancos. Se o conjunto da poupança real ainda estiver se expandindo, isso pode "funcionar" - e os empréstimos poderão voltar a fluir - mas o conjunto da poupança real como um todo irá enfraquecer como resultado dessa transferência de poupança real do setor não bancário para o setor bancário. Se, contudo, o conjunto da poupança real estiver declinando, então não será possível aumentar o fluxo de empréstimos.
Por que não fazer nada é a melhor política para reativar a economia
Dada a crescente plausibilidade de que o conjunto da poupança real está com sérios problemas, será que isso significa que o fluxo de crédito irá permanecer congelado? A única coisa que pode ser feita para descongelar o fluxo é permitir que as taxas de juros flutuem livremente de modo a encontrarem seu nível correto.
No atual cenário de economia em declínio, os emprestadores apenas estarão dispostos a emprestar a taxas de juros que compensem o risco e que sinalizem corretamente que há uma menor poupança real disponível. A uma taxa de juros bem maior, a "crise financeira" e a escassez de crédito sumirão.
O problema então não está no mercado de crédito em si, mas no fato de que os bancos centrais estão injetando quantias maciças de dinheiro para forçar os juros a ficarem em níveis artificialmente baixos. Isso obviamente faz com que seja ainda menos atraente para os emprestadores entrar no mercado de crédito. Logo, a escassez (isto é, a contração do crédito) é o resultado da política dos bancos centrais de não permitirem que as taxas de juros subam para níveis que estejam de acordo com a realidade.
[*]
Por que então as autoridades estão resistindo às forças de mercado e estão permitindo que essa contração do crédito persista?
Porque se permitissem que as taxas de juros subissem naturalmente, muitas bolhas que ainda estão ativas deixariam de ser lucrativas e estourariam.
E os estrategistas políticos, bem como aqueles que têm posições influentes, acreditam que isso levaria a uma séria derrocada econômica; e que, portanto, tal coisa não deveria ser permitida. Criar dinheiro para manter bolhas ativas só faz empobrecer ainda mais os reais geradores de riqueza, além de atrasar as perspectivas de uma significativa recuperação econômica.



(....)



A melhor política para solucionar o problema é que o Fed e os outros bancos centrais comecem imediatamente a não fazer nada. Ao fazerem isso, eles irão permitir que os genuínos geradores de riqueza acumulem poupança real. A política de não fazer nada irá fazer desaparecer as várias atividades que pouco ou nada acrescentam ao conjunto da poupança real. Isso fará com que a geração de riqueza seja muito mais recompensadora.
À medida que o tempo for passando, a expansão do conjunto da poupança real irá levar a uma diminuição das taxas de juros. Isso por sua vez irá fornecer a base para uma subseqüente expansão de várias atividades geradoras de riqueza. Portanto, quanto mais cedo os bancos centrais - começando pelo Fed - pararem de interferir, mais cedo se dará a recuperação econômica.
Se por acaso o conjunto da poupança real ainda estiver crescendo, então fazer nada (e permitir que a taxa de juros reflita a realidade) irá fazer com que a recessão seja curta e que a recuperação econômica comece o mais rápido possível. (A uma taxa de juros mais alta, várias bolhas ainda ativas irão desaparecer. Como conseqüência, mais poupança real se tornará disponível para os geradores de riqueza. E isso fará diminuir as taxas de juros).
Sugerimos que temerárias políticas monetárias seguidas pelo Fed durante anos exauriram severamente o conjunto da poupança real. A continuidade ou o aprofundamento dessas mesmas políticas frouxas não poderá melhorar a atual situação. Ao contrário, tais políticas somente irão atrasar ainda mais a recuperação econômica.
Da mesma forma, as atuais políticas seguidas pelos governos e bancos centrais mundiais, ao empobrecerem os geradores de riqueza, correm o risco de transformar uma curta recessão em uma crise severa e prolongada.



Minha conclusão: Eu acho arriscadíssimo esse ponto de vista. Concordo que não é salutar, não é bom injetar dinheiro em bolhas artificiais de crédito. Isso pode sim gerar um aprofundamento e uma continuidade dessas bolhas. Mas a questão é mais complexa porque envolve ativos de zilhões de pessoas e famílias que podem, nesse curto espaço de tempo, perder todas suas poupanças, como ocorreu em 1929. E, como eu disse antes, os americanos têm tradição em aplicar na bolsa. Lá o investidor da Exxon ou da Chevron abastece nos postos de combustível de onde investe. Se o fulano aplica na Ford ele compra carros da Ford e por ai vai. Os ativos diminuiram muito nesses últimos dias. Mas como disse esse meu amigo que gosta de investir em ações. O prejuízo somente ocorre no momento da venda das ações. Quem vender agora terá prejuízo. Quem vender mais tarde, poderá ter lucro. Será????



_______________________________________________
Frank Shostak é um scholar adjunto do Mises Institute e um colaborador freqüente do Mises.org. Ele é o economista-chefe da M.F. Global.
[*] Outro problema são as políticas de socorro a empresas, que fazem com que empresas insolventes continuem existindo lado a lado com as solventes sem que ninguém saiba qual é qual. E essa incerteza afeta a alocação do crédito. Ver mais detalhes aqui. [N. do T.]

É Culpa do Neoliberalismo?


É culpa do “neoliberalismo”?,


Cristiano Carvalho*

Com a crise financeira surgida nos EUA, a esquerda, por décadas humilhada e desacreditada, de repente saiu da toca, esfuziante com a tão sonhada revanche. As entidades que mais odeia, o neoliberalismo e o mercado, personificados no grande satã Estados Unidos, finalmente estariam se encaminhando para a merecida destruição. Todavia, colocando de lado o histerismo dos esquerdistas tupiniquins e analisando a questão de forma calma e racional, chegamos facilmente à conclusão de que a crise não é culpa, em hipótese alguma, do liberalismo (neoliberalismo, para começar, sequer existe como escola de pensamento político-filosófico, é bom lembrar. O termo, de índole pejorativa, foi cunhado pelos intelectuais de esquerda). O fato é que nenhum dos axiomas da própria teoria econômica tradicional ou neoclássica (esse neo, sim, existe) foi derrubado. A crise nada mais comprova que a própria auto-regulação do mercado, pela oferta e demanda, e prova disso é a própria oscilação de preços das ações, das moedas e dos próprios imóveis, no caso dos EUA. É que o mercado, como sistema dinâmico que é, sofre instabilidades, mais ou menos graves, de tempos em tempos. Por pior que seja tal instabilidade, invariavelmente o equilíbrio retorna, e tanto assim é, que, seguindo a linha da destruição criativa de Schumpeter, pela qual crises e quebras acabam gerando novos e mais complexos mercados, a riqueza mundial cresceu dezenas de vezes desde 1929, não pela mão do governo, mas, sim, pela ação indistinta e não centralizada dos indivíduos. Em rigor, tanto agora quanto em 1929, o que desencadeou a crise não foi a mão invisível, ou seja, a suposta desregulação, mas o próprio intervencionismo do Estado. O Fed, ao determinar juros baixíssimos, sinalizou uma situação que não era a de equilíbrio, incentivando os consumidores a gastar e os bancos a conceder financiamentos baratos. Como tais financiamentos eram garantidos pelos imóveis dos consumidores e, numa situação tipicamente de mercado, tais imóveis se desvalorizaram, não houve mais lastro para cobrir as dívidas. Em síntese, pura oferta e demanda porém, não aquela regulada pela mão invisível, mas a distorcida pela mão do Estado no sistema de preços, gerando ruídos cujos resultados foram a bolha e a conseqüente turbulência. Entretanto, para os que torcem fanaticamente pelo fim dos Estados Unidos e pela destruição do capitalismo, sempre com os surrados argumentos dos males do neoliberalismo e da ganância, resta sempre a pergunta: o que é pior, um mercado livre que sofre crises de décadas em décadas, mas que antes e depois das turbulências cria riquezas nunca antes vistas, ou um sistema regulado até a exaustão pelo Estado, cujo resultado é a mais pura estagnação? Para tanto, basta comparar a economia da antiga União Soviética, que durante 70 anos nada gerou além da distribuição igualitária de pobreza e escassez, assim como as atuais situações de miséria de Cuba e Coréia do Norte. Eu fico com os EUA.


*Pós-doutor em Direito e Economia, na ZH de hoje.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Pós-Estruturalismo


Gilles Deleuze (de cigarro) e Félix Guattari (de óculos)


Michel Foucault (careca e de óculos)



Louis Althusser (de cachimbo)

Pois é, eu confesso. Eu já fui bem de esquerda. Daqueles que se recusava a usar calça de grife. Mac Donald´s? Bem capaz, não entrava nunca. Eu era bem gauche mesmo e defendia - de forma intolerante - a utopia da sociedade totalmente igualitária. Devorava os livros da gauche. Era um verdadeiro consumidor do pensamento marxista.
Gostava dos franceses. Devorei Sartre ( O muro, a Idade da Razão, A Náusea) e depois passei para a geração do chamado pós estruturalismo. Li Deleuze e Guattari e sua revolução molecular. Admirava Foucault, Althusser & Cia.

Ontem na palestra do marxista francês Sylvère Lotringer, que é editor da revista Semiotext(e). toda aquelas leituras vieram à tona.
O que é, afinal, pós estruturalismo???
Com a palavra o wikipédia:

Pós-estruturalismo refere-se a uma tendência à radicalização e à superação da perspectiva estruturalista, observada entre os intelectuais franceses, tanto no campo propriamente filosófico (Jacques Derrida, Gilles Deleuze, Jean-François Lyotard), como psicanalítico (Jacques Lacan), político e sociológico, na perspectiva neomarxista (Louis Althusser, Michel Foucault) e na análise literária (Roland Barthes, Maurice Blanchot).
Também podem ser considerados pós-estruturalistas ou próximos às teses pós-estruturalistas
Giorgio Agamben, Jean Baudrillard, Judith Butler, Félix Guattari, Fredric Jameson, Julia Kristeva, Sarah Kofman, Philippe Lacoue-Labarthe e Jean-Luc Nancy.
O prefixo pós não é todavia interpretado como sinal de contraposição ao estruturalismo. De fato, esses pensadores levaram às últimas conseqüências os conceitos e desenvolvimentos do estruturalismo, até dissolvê-los no
desconstrutivismo, construtivismo ou no relativismo e no pós-modernismo. O movimento pós-estruturalista está intimamente ligado ao pós-modernismo - embora os dois conceitos não sejam sinônimos.
O pós-estruturalismo instaura uma teoria da
desconstrução na análise literária, liberando o texto para uma pluralidade de sentidos. A realidade é considerada como uma construção social e subjetiva. A abordagem é mais aberta no que diz respeito à diversidade de métodos. Em contraste com o estruturalismo, que afirma a independência e superioridade do significante em relação ao significado, os pós-estruturalistas vêem o significante e o significado como inseparáveis.
Não se trata exatamente um movimento, e poucos desses pensadores aceitam o rótulo de 'pós-estruturalista' - criado por outros para designar genericamente um conjunto de diferentes reações ao estruturalismo. Conseqüentemente, nenhum dos ditos pós-estruturalistas se sentiu na obrigação de elaborar um "manifesto" do pós-estruturalismo.
[1]
Como corrente filosófica, embora não constituindo propriamente uma "escola", o pós-estruturalismo carateriza-se pela recusa em atribuir ao cogito cartesiano, ao sujeito ou ao homem, qualquer privilégio gnoseológico ou axiológico, privilegiando, em vez disso, uma análise das formas simbólicas, da linguagem, mais como constituintes da subjetividade do que como costituídas por esta.
São tipicas da abordagem pós-estruturalista a retomada dos temas
nietzscheanos, como a crítica da consciência e do negativo (por Deleuze) ou o projeto genealógico (por Foucault), a radicalização e a superação da valorização ontológica da linguagem heideggeriana e uma perspectiva anti-dogmática e anti-positivista. De modo geral, os pós-estruturalistas rejeitam definições que encerrem verdades absolutas sobre o mundo.[2], pois a verdade dependeria do contexto histórico de cada indivíduo. Assim, o pós-estruturalismo estaria vinculado, de uma parte aos sofistas gregos, e de outro à Mecânica Quântica.

O que é Soberania, Cara Pálida?




O diário gauche de hoje comenta matéria de capa da Folha de hoje que diz que os bancos não estão abrindo as torneiras do crédito. Preferem aplicar nos papéis do governo brasileiro.
Eu comento depois.

Tudo indica que Lula capitulará novamente

Faço questão de copiar/colar a íntegra da matéria de capa da Folha de hoje, assinada pelo jornalista Kennedy de Alencar (que, sabe-se, não é nenhum míriam-leitão-da-vida, que apenas repete o que o mercado lhe assopra). Alencar foi no ponto.
De resto, são disputas de poder e conflitos de classe recorrentes que temos tratado aqui no blog, desde que estourou a crise financeira mundial no começo deste tumultuado outubro.
Tudo indica que Lula vai sucumbir novamente ao seu irrefreável espírito cordial e conciliador, e continuar abrindo mão da soberania sobre parte vital de seu próprio governo, em favor dos bancos, dos rentistas e especuladores de sempre.
O ex-sindicalista, hoje convertido ao pragmatismo expresso da governabilidade de resultados, parece que não está convencido de que a força política e econômica do capital financeiro está com os dias contados, no Brasil e no mundo todo, pelo menos na ênfase e no tom dos últimos trinta anos. Mas vamos ler atentamente o que conta Kennedy Alencar:



O presidente Luiz Inácio Lula da Silva conversou com grandes banqueiros na semana passada para pressioná-los a abrir as torneiras do crédito. Ouviu respostas desanimadoras.
Segundo a Folha apurou, os grandes bancos disseram que a prioridade, no momento, é construir um "muro de liquidez" - ação preventiva e de sobrevivência no médio e longo prazo em relação à crise econômica mundial, que estrangula o crédito e as empresas.Lula ficou contrariado, segundo relato de integrantes da equipe econômica. Os grandes bancos aumentaram muito o grau de seletividade para concessão de crédito. A maior parte do dinheiro que entra via redução do compulsório após medidas do Banco Central não retorna ao mercado sob a forma de empréstimo.
Receosos em emprestar e preocupados em manter sua solidez num momento de grandes incertezas, os grandes bancos seguram em caixa os recursos e aplicam nos títulos do próprio governo, atraídos por uma taxa básica de juros (Selic) de 13,75% ao ano.
A Folha apurou ainda que os maiores bancos privados do Brasil têm também procurado se capitalizar para, caso apareça uma oportunidade de compra estratégica de carteiras ou de instituição, terem recursos em caixa para a operação.
Ou seja, a liberação condicionada de estimados R$ 50 bilhões do compulsório (parcela dos depósitos que os bancos são obrigados a recolher no BC), deixando mais recursos livres para empréstimos, tem tido pouco efeito prático.
Os bancos acreditam que neste momento de incerteza o mais importante é manter o caixa reforçado e não comprar carteiras de crédito de instituições menores, que têm pouca liquidez.
Na semana passada, Lula enviou alguns emissários para conversas com empresários e banqueiros. O presidente tem ouvido opiniões de fora da equipe econômica tradicional -Fazenda, Planejamento e BC. Esses emissários detectaram um pessimismo maior do que Lula imaginava. Os contatos diretos do presidente com banqueiros receosos reforçaram a percepção do presidente de que o efeito sobre o Brasil será maior do que a "marola" prevista por ele anteriormente.
Para complicar, há a divisão na equipe econômica e no próprio BC (Banco Central) em relação à taxa de juros. O presidente do BC, Henrique Meirelles, está no grupo mais ortodoxo. Ou seja, o que cogita até elevar juros para combater eventual efeito inflacionário em razão da alta do dólar.
Os críticos do presidente do BC afirmam que é hora de seguir o movimento dos outros bancos centrais, que reduziram juros para tentar aquecer a economia. O argumento é o seguinte: com os juros tão altos, os bancos vão continuar a preferir a segurança dos títulos do Tesouro do que a concessão de crédito. Seria hora de priorizar o crescimento e não a inflação, apesar de a função oficial do BC ser buscar a meta de inflação.
Esse debate reforça, na avaliação do Planalto, o cenário no qual o BC deverá manter inalterada a Selic na reunião desta semana.
Redator: Cristóvão Feil - Data: 28.10.08 18 comentários Links para esta postagem

Meu comentário que postei no blog diário gauche:

O que é, afinal, soberania, cara pálida? Certa esquerda adora ingressar no inventário dos mortos para retirar significados antigos e simbólicos para certas palavras. Puro chavão. A palavra soberania é a mais castigada. O que é, afinal, soberania? Na verdade, a palavra soberania, como neoliberalismo, mídia oligárquica etc. podem ser explicadas pelos simbolos e chavões da semiótica, do estruturalismo e até mesmo do hiper estruturalismo que certa esquerda gauche francesa gosta de rezar. Bingo, descobri o código da Matrix de Baudrillard.


Um tal de Clairton veio com essa pérola: Soberania é não doar a Vale do Rio Doce e a telefonia do país como FHC fez. Soberania é não dar dinheiro público para a GM e a Ford como o britto e o rigotto fizeram. E agora que ambas estão a beira da falência o que este pessoal tem a dizer??? Soberania é não submeter o país a vontade de meia dúzia de banqueiros.

Eu respondo ao Clairton: A Vale está aqui no Brasil gerando zilhões de emprego, gerando muito mais imposto do que na época da estatal, sendo muito mais eficiente e agregando muito mais serviço, conhecimento e valor. Soberania para você é manter a Vale nas mãos do estatismo? Isso não é soberania, isso é corporativismo. Bem fez FHC de ter privatizado outro templo do corporativismo estatal, o ineficiente sistema Telebrás que alijava a população de baixa renda do importante serviço telefônico. A desestatização das teles transformou o Brasil definitivamente num país de serviços, de agilidade, de velocidade, de mais eficiência e mais flexibilidade. E as viúvas do estatismo gostam mesmo é de chorar de saudades pelos velhos tempos da ineficiência do estatismo, bons tempos aqueles da "soberania".


A verdade, verdadeira é que certa esquerda não tem a mínima noção de como funciona o mercado. Pergunte para qualquer motoboy que ganha sua grana prestando serviço de um lado para o outro que ele sabe muito mais sobre o mercado do que os ideólogos de certa esquerda. O Lula pediu aos bancos que emprestem, mas os bancos não está emprestando. E certa esquerda não entende isso. Quem é que vai ser o louco, o maluco, o lelé da cuca de abrir o caixa do empréstimo numa hora dessas? Quem emprestar agora corre o grande risco de quebrar. Isso não tem nada a ver com questão de classe (classe, que classe?), isso tem a ver com a santa prudência. Se eu fosse acionista de um banco e ele resolvesse abrir a torneira do empréstimo numa hora dessas, apenas porque o Lula recomendou, eu tiraria todo o meu santo dinheirinho desse investimento. Podes crer.

Multifaces


Ontem o filósofo Sylvère Lotringer, na sua palestra no Fronteiras do Pensamento, disse que o indivíduo não é mais único, ele tem várias facetas, sobretudo quando está na frente do computador.

Uma pessoa são várias.

O indivíduo -- que tem suas profissão, seus laços familiares, seus amigos, seu círculo social, seu trabalho -- não é mais individual.
Esse ser único e múltiplo tem hoje condições de incorporar outros personagens, sobretudo quando está na frente do computador, protegido (protegido?) pelo anonimato.

E essa multiface (podemos dizer assim?) está se espalhando.

Aumenta - em progressão para lá de geométrica -- o número de pessoas que inventam personalidades, utilizam nicknames para entrar nos orkuts, nos msn, nos chats, nos blogs.

Fazem isso para desopilar, para agregar conhecimentos, para se divertir, para curtir, para viver ou esquecer a vida.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Um Muçulmano e Um Marxista


O francês Sylvére Lotringer e o paquistanês Tariq Modood em entrevista coletiva antes do Fronteiras do Pensamento hoje em Porto Alegre.
Cheguei do trabalho e coloquei o sapatênis. Hoje é segunda, dia de palestra. A tarde estava linda. Fui a pé. Passei pelo Bonfim e cheguei a Redenção. Porto Alegre, certas horas, tem cara de cidade bonita. É bom esse horário de verão, mas tem gente que não gosta. A Reitoria da UFRGS está toda pichada. Até lá em cima onde ninguém alcança está pichada. Como é que os pichadores chegam até lá?

Tariq Modood é paquistanês, mas mora na Inglaterra. Ele fala sobre o assunto favorito dos imigrantes, multiculturalismo. É dificil ser estrangeiro e ser respeitado como tal na Europa Central. É difícil em todo o lugar. Ele é muçulmano e não está de acordo com aquela medida adotada pelo governo francês que proibe véus e crucifixos nas escolas públicas. É um atentado à liberdade e é uma forma unilateral e ocidental de refletir sobre o assunto. Em outras palavras, as meninas do islã tem que ter a liberdade de usar véu nas escolas.

A segunda conferência é do marxista francês Sylvère Lotringer, que é editor da revista Semiotext(e). Dizem, dizem e dizem que foi ele que levou para os Estados Unidos as idéias dos malditos pensadores franceses pós maio de 68: Michel Foucalt, Gilles Deleuze, Félix Guattari, Jean Baudrillard e Paul Virillio. Lotringer começou sua palestra, como todo bom francês, destacando a importância de Maio de 68. O movimento que causou surpresa e, no fim, se diluiu. Porque no capitalismo -- que não é ideologia -- tudo se dilui, tudo se fragmenta, tudo se coisifica e os indivíduos se tornam "divíduos".

Lotringer, como todos os pensadores malditos franceses pós 68, detesta o capitalismo que deve ser superado. Mas como superá-lo?
Ora, bolas, navegando pela semiótica, pelo estruturalismo e pós-estruturalismo talvez possamos chegar a algum lugar. O capitalismo é um mundo de símbolos, de fetiches, de matrix que virou trilogia de Hollywood e foi inventada por Jean Baudrilhard, o pai do hiper estruturalismo. A crise atual dos papéis que não existem, que não valem ouro, que são meramente virtuais estão a demonstrar que vivemos mesmo num mundo hiper estrutural e que temos mesmo que buscar o sentido que está escondido nas senhas obscuras da matrix.

Moral da história, estamos todos dominados pelo fetiche do capitalismo.

Dez horas da noite e a palestra terminou. Voltei a pé. Cheguei em casa pelas onze. A cidade está cheia de pessoas que dormem nas ruas, protegidas pelas marquises dos prédios que não têm grades.

Análise


Boa análise das eleições de Kennedy de Alencar na Folha de hoje.


Serra sai fortalecido e Lula não transfere popularidade


Peemedebistas ganharam mais prefeituras e viram fiel da balança para 2010. PT aumentou o número de prefeituras sob seu comando, mas foi derrotado nas principais capitais em que disputou as eleições.

Ele não foi candidato, mas o governador José Serra (PSDB-SP) é o político que individualmente sai mais forte das eleições. Serra apadrinhou a reeleição do prefeito Gilberto Kassab (DEM), minando a chance de um núcleo alckmista no PSDB de São Paulo dar gás ao projeto presidencial do colega de partido e também governador, Aécio Neves (MG).Kassab teve uma vitória significativa sobre a candidata Marta Suplicy (PT), o que o torna uma das novas lideranças políticas do país e o principal dirigente do DEM. Sem Kassab, o partido teria tido um desempenho sofrível. A sigla agora apostará mais do que nunca no projeto presidencial de Serra.Na corrida interna no PSDB, Aécio se mantém vivo ao se recuperar do desastre que teria sido a derrota de Marcio Lacerda (PSB) em Belo Horizonte. O governador elegeu o candidato que saiu do bolso de seu colete, mas no sufoco e a um custo político que o deixa em desvantagem na competição com Serra. A tese de replicar nacionalmente a aliança PT-PSDB, partidos que apoiaram Lacerda na capital mineira, sai enfraquecida das urnas.É justo lembrar que Serra não poderá tratorar Aécio como fez com o ex-governador Geraldo Alckmin (SP) na eleição paulistana. Para disputar o Palácio do Planalto, precisará do apoio de Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do país. E o próprio Aécio deixa claro em conversas reservadas que vai lutar para ser o candidato tucano em 2010.Nos bastidores, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso tentará convencer Aécio de que o melhor caminho para conquistar o Planalto em 2010 é o mineiro ser vice de Serra. Aécio, porém, resiste à idéia.


PMDB


Entre os grandes partidos políticos, é inegável que o PMDB obtém uma espécie de primeiro lugar nestas eleições. O partido foi o que mais conquistou prefeituras no país. O PMDB terá forte poder de barganha para costurar alianças na eleição presidencial de 2010. Poderá apoiar o candidato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, hipótese mais provável hoje. Mas também poderá flertar com Serra, político que sabe que não pode depender apenas da parceria com o DEM para viabilizar seu projeto para o cargo presidencial.Os resultados das eleições municipais ampliaram a máquina local peemedebista, arma que vitamina os candidatos a deputados federais e a senadores. Isso tende a dar ao PMDB uma das maiores bancadas no Congresso, o que é vital para a governabilidade dos presidentes que são eleitos sem maioria parlamentar, como tem sido a regra no Brasil.As eleições dos peemedebistas José Fogaça em Porto Alegre e João Henrique em Salvador são boas notícias para Serra. O tucano tem boa relação com os chefes peemedebistas desses Estados.A eleição de Eduardo Paes (PMDB) não é ruim para Serra. Melhor teria sido a vitória de Fernando Gabeira (PV). Mas Paes é ex-tucano e tem boa relação com Serra. O novo prefeito do Rio integra a área de influência política do governador peemedebista Sérgio Cabral, político que hoje é cotado para ser vice na eventual chapa encabeçada pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.


Cenário para 2010


Em relação à sucessão de 2010, as atuais eleições reforçam o cenário de um confronto entre PT e PSDB. Os resultados não vitaminaram a chance de uma terceira via, como Ciro Gomes (PSB) ou um nome peemedebista.Tucanos e petistas deverão continuar a fazer o principal duelo da política brasileira, como uma espécie de Fla-Flu eleitoral. De um lado, Lula precisará vencer seu grande teste administrativo: superar a crise econômica mundial. Se a economia desandar, terá dificuldade para emplacar Dilma.Entre os tucanos, Serra e Aécio terão um ano e meio agora para decidir quem será o candidato. Uma disputa fratricida poderá diminuir a chance do candidato que vencer a disputa no PSDB.


Petismo


O PT cresceu organicamente. Ou seja, aumentou o número de prefeituras, mas perdeu brilho político, porque foi derrotado nas principais capitais em que disputou. O crescimento petista aconteceu nas pequenas e médias cidades, além de alguns municípios importantes em regiões metropolitanas.Ou seja, o PT teve um bom desempenho eleitoral com gosto de derrota política. Marta levou uma goleada de Kassab. O partido não recuperou Porto Alegre e não conquistou Salvador. Suas principais capitais são Recife e Fortaleza, já governadas por petistas.O presidente Lula sai chamuscado. Nas cidades em que se empenhou diretamente pelos petistas, não transferiu votos em quantidade suficiente. A alta popularidade não deu resultado nas eleições municipais. No entanto, o PT continuará dependente do lulismo num grau ainda maior. Nesse sentido, Lula ganha, porque escolherá o candidato à Presidência sem contestação e poderá colocar um auxiliar direto, o chefe-de-gabinete Gilberto Carvalho, no comando do PT.O presidenciável Ciro foi derrotado em seu reduto eleitoral. Empenhou-se pela candidatura da ex-mulher e senadora Patrícia Saboya (PDT) em Fortaleza, contrariando a aliança que o irmão e governador Cid Gomes (PSB) fez para a reeleição da petista Luzianne Lins.A eleição de Lacerda em Belo Horizonte serve mais ao petista Pimentel e ao tucano Aécio do que a Ciro, político que terá dificuldade para viabilizar uma candidatura presidencial pelo chamado bloquinho (PSB, PDT e PC do B), três partidos que atuam juntos no Congresso.Partidos que abrigam políticos que costumam trocar de legenda como quem troca de camisa, PR, PP e PTB continuam a funcionar como partidos do governo, qualquer governo. São siglas médias que apoiarão o próximo presidente.PRB, PSC e PV cresceram. No entanto, continuam a ser satélites dos partidos maiores. Já PSOL confirma o destino de nanico da esquerda. Heloisa Helena se elegeu vereadora em Maceió, mas não acumula força para entrar no primeiro pelotão da disputa presidencial.O PPS praticamente sumiu. Vai apostar as fichas em Serra, atuando como um satélite-nanico com verniz de esquerda para um político de esquerda que tem uma base de apoio de centro-direita.

O PT e a Classe Média



Classe média está ressentida com PT em SP, diz Maria Victoria Benevides.

Cientista política, Maria Victoria Benevides, 66, avalia que Gilberto Kassab não venceu a eleição porque sua aprovação é alta, e sim porque a rejeição a Marta Suplicy é muito forte. "Kassab não provocou nenhuma rejeição. Isso não significa que ele seja bom: significa que as pessoas eram indiferentes a ele".Professora titular da Faculdade de Educação da USP e autora de "O Governo Kubitschek" (1976), "A UDN e o Udenismo" (1980), "O Governo Jânio Quadros" (1981) e "O PTB e o Trabalhismo" (1989), entre outros livros, Benevides afirma que Kassab é apenas um político fabricado pelo governador tucano José Serra -"ele é uma espécie de Pitta que deu certo"- que conseguiu reunir todas as vertentes da direita paulistana em sua batalha contra o PT. Marta Suplicy, por sua vez, foi vítima tanto de sua rejeição pessoal como do ressentimento da classe média paulistana, que se sente abandonada por um governo que privilegia os muito ricos e os muito pobres:


FOLHA - Kassab começou no PL, um satélite do PFL, mas logo ingressou no próprio PFL, que aqui em São Paulo reunia herdeiros da UDN. É possível dizer que a "direita udenista" conseguiu substituir a "direita populista" representada por Maluf?

MARIA VICTORIA BENEVIDES - A direita udenista certamente está com Kassab, mas Kassab não é fruto da direita udenista, mas dos liberais que vieram da esquerda do antigo MDB e da oposição à ditadura. É por isso que é muito difícil estabelecer claramente uma definição de sua identidade política. Nós podemos falar do DNA dele: o DNA dele, com toda a certeza, é de direita, mas um mix da direita udenista com a direita pessedista. Mas basta ver quem o fabricou politicamente: foi José Serra, que está longe de ter um DNA de direita udenista. Ele vem da esquerda e depois evoluiu para uma posição liberal. Kassab é apoiado hoje por uma parte importante do antigo Partidão [PCB], por uma parte importante do antigo movimento sindical. Isso não tem nada a ver com a direita udenista, mas, numa escolha em dois turnos, ele ficou com a direita udenista, a direita malufista, a direita janista e a direita adhemarista. Conseguiu reunir não só a direita udenista, mas todo o conjunto conservador das direitas de São Paulo, mais os tucanos liberais, dos quais a maioria não tem origem na direita, mas que acabaram se "endireitando" no governo.


FOLHA - Mas qual seria a substância político-eleitoral de Kassab?

BENEVIDES - Eu acho que ele foi uma pessoa fabricada. Ele é uma espécie de Pitta que deu certo. O Pitta foi fabricado pelo Maluf igualzinho o Kassab foi fabricado pelo Serra. Quem era Kassab antes do Serra? Eu mesma nunca tinha ouvido falar dele, assim como ninguém tinha ouvido falar do Pitta. É o Pitta que deu certo. E deu certo porque o PSDB, embora rachado e enfraquecido por divisões internas, se deu conta de que ele era a maneira que tinha de ganhar a batalha contra o PT, que é seu grande adversário.

FOLHA - A questão é saber se esses políticos fabricados têm longevidade. Hoje a aprovação a Kassab (59%) na cidade é bem maior do que a do próprio Serra (38%), o que sugere que ele poderia sobreviver a uma eventual derrota de Serra em 2010. Mas, olhando para o passado, os políticos fabricados não duraram muito: Adhemar fabricou o Lucas Garcez; Jânio, o Carvalho Pinto; Quércia, o Fleury. Fabricaram um sucessor, mas o sucessor não teve sobrevida.

BENEVIDES - O que falta nessas comparações que você fez é a perspectiva do segundo turno: o que mais beneficiou Kassab foi a possibilidade de reeleição contra sua principal adversária, a Marta, que tinha uma enorme rejeição. Kassab não provocou nenhuma rejeição. Isso não significa que ele seja bom, significa que as pessoas eram indiferentes a ele. É muito mais fácil criar uma perspectiva positiva em relação a alguém que tem uma imagem indiferente do que destruir uma rejeição e transformar essa rejeição em aprovação. E Kassab apareceu muito, teve um apoio muito grande do governo Serra e também, indiretamente, do governo federal, porque Lula não quis se indispor com São Paulo. Ao contrário. Serra não tem uma queixa a fazer do Lula.

FOLHA - Uma reportagem recente da Folha mostrou que a gestão Kassab recebeu mais verbas do governo Lula do que a própria gestão Marta. BENEVIDES - Exatamente. Eu não apostaria na continuidade do Kassab, mas também não apostaria no fim. O que eu fiquei impressionada foi com os míseros 6% [dos votos] do Maluf. Os malufistas morreram... FOLHA - O populismo em São Paulo praticamente acabou?
BENEVIDES - O populismo na vertente malufista. Mas o populismo continua, sob formas clientelistas -aliás utilizadas por todos os partidos-, porque ele está muito entranhado na cultura brasileira. Não acredito que o populismo tenha acabado. E não vejo, a não ser pelo estilo mais cordato, muita diferença entre Maluf e Kassab.

FOLHA - A sra. diz que o Kassab se beneficiou da rejeição a Marta. Mas o que explica essa rejeição?

BENEVIDES - Há uma rejeição grande ao PT, que aumentou muitíssimo depois da crise de 2005, que decepcionou muita gente, dos meios intelectuais até uma esquerda tradicional, além de uma classe média que se sentiu abandonada, porque na realidade houve uma prioridade aos mais pobres. O problema é que o governo ficou nos extremos: favoreceu muito os muito ricos e os muito pobres, e a classe média tem motivo de ressentimento. Isso aumentou muitíssimo a rejeição ao PT.E a própria Marta é vítima de muito preconceito e muita rejeição. Dela ficou o quê? O que ficou de lembrança da Marta? O "Martaxa". A prova é que ela bateu muito contra isso. O problema é que a memória da imensa maioria dos eleitores, os mais pobres e os menos politizados, é mais curta. Marta devia ter um nível de aprovação altíssimo por causa dos CEUs, mas os CEUs foram apropriados pelos outros: ninguém diz que vai abandonar os CEUs. Deixou de ser algo exclusivo do PT. E a rejeição a Marta é muito forte porque juntou a rejeição ao PT, que piorou muito em razão do que aconteceu, à rejeição a Marta, que é grande por ela ser a Marta: ela agrega rejeição por ignorância, por preconceito, pelo grupo dela no PT.


FOLHA - Segundo o IBGE, em 2006 a taxa de luz existia 3.893 municípios, e a taxa do lixo, em 2.753. Ou seja, elas existem na maioria das cidades, e não causam tanta celeuma.

BENEVIDES - E principalmente aqui em São Paulo, para a imensa maioria das pessoas, era um valor ridículo. Eu me lembro que minha faxineira veio reclamar disso, e eu perguntei quanto ela pagava de taxa de lixo. Era R$ 3. O filho dela estudava num CEU e ele ia e voltava da escola numa van da prefeitura, mas o ficou foi a tal taxa do lixo, porque isso foi superdimensionado pelos adversários. Eles foram competentes em grudar esse adesivo na Marta. E essa coisa das taxas nunca foi apresentada de uma maneira que mostrasse que ela eliminou o IPTU de muitos. Por exemplo, um de meus filhos mora hoje num prédio que ficou isento. Isso nunca foi suficientemente mostrado. Aí predominou a rejeição. E a campanha da Marta foi contaminada por equívocos de marqueteiros e assessores.

FOLHA - A sra. citou o impacto da crise de 2005. Mas, olhando o país, o PT foi quem mais cresceu na eleição.

BENEVIDES - Mas aí é importante ver que o PT de São Paulo não é e nunca foi o PT nacional.
FOLHA - Qual é a diferença?
BENEVIDES - O PT nacional se beneficiou enormemente das políticas regionais e municipais no governo Lula. O PT no resto do Brasil está ligado a propostas e projetos locais, nos quais o conteúdo ideológico é muito pequeno, e a presença da classe média também. Essa classe média forte, organizada, com imprensa, universidades, pequenos e médios empresários, é imensamente mais forte aqui. Dificilmente existe, no resto do Brasil, essa rejeição forte e absoluta ao PT que existe em São Paulo. Inclusive porque São Paulo tem esses extremos: tem uma forte presença de pobres e miseráveis, mas tem a maior classe média, a maior concentração de riqueza, a maior concentração de universidades, intelectuais, empresários organizados, que atuam com muito mais força na opinião pública do que os partidos. O PSDB e o PFL não são só partidos políticos: são partidos vinculados aos grupos de interesse de tudo o que é forte em São Paulo. Eles têm apoio majoritário na Fiesp, UDR, associações de empresários, instituições da sociedade civil. Basta ver que o PT sempre teve enorme dificuldade para ganhar na cidade. Ganhou com Erundina porque não tinha dois turnos, ganhou com Marta porque polarizou com Maluf.

FOLHA - Ela teve inclusive o apoio do governador Covas e do PSDB.
BENEVIDES - O apoio do PSDB. E hoje o PSDB sabe que seu maior adversário é o PT. Por isso o PSDB não faria em São Paulo aliança com o PT, como foi tentado em Belo Horizonte.


FOLHA - É possível dizer então que o PSDB conseguiu se tornar o partido dessa classe média organizada?
BENEVIDES - Sim. O PSDB, aliás, é o partido que está no poder desde Franco Montoro, com um breve interregno. Está lá. E está fortemente instalado no governo Kassab. Por isso não dá para dizer que o kassabismo é a direita udenista. É direita, mas com muitas nuances. Direita udenista é o DNA dele: direita udenista que apoiou o golpe militar, que esteve com Maluf e Pitta. Mas a coalizão dele é muito mais ampla. Esse foi o grande trunfo dos tucanos. Como foi o grande trunfo do PT em outros Estados do Brasil.