Pedro Juan Gutiérrez e Fabrício Carpinejar, o encontro do escritor imaturo com o maduro.
Li a Trilogia Suja de Havana de Pedro Juan Gutiérrez e aquilo tudo me lembrou Bukowski e suas histórias do centro sujo da cidade grande. Pedro Juan estava ali parado assistindo a palestra de Fabrício Carpinejar que estava pilchado: bombachas, botas, lenço vermelhos e unhas da mão esquerda pintadas de marrom. Carpinejar falava sobre sua vida. Ele é teatral, mas imaturo. Ele disse: eu sou o gaúcho do Fronteiras e foi aplaudido pela menor platéia do evento, este ano.
Pedro Juan chegou sorrateiro. Se Carpinejar é imaturo, Gutiérrez é maduro. Ele se nega a falar sobre a situação política de Cuba. Bem que ele faz, pois seu assunto é a literatura.
Qual afinal o papel do escritor?
Ele responde:
"caminhar desesperadamente por dois caminhos que unem dois povos que se chamam cordura e loucura e levamos a vida sem saber a qual deles vamos e de qual estamos vindo. A resposta deve ser buscada na infância. O escritor é uma criança que continua sendo-o e portanto busca sempre compreender. Tenho uma menina de sete anos. Quando tinha quatro se aproximou da minha mesa de trabalho cheia de papéis e me disse: 'Eu quero saber tudo'. Ela tem sete, eu 58, e me acontece a mesma coisa. Onde eu chego quero saber tudo.O escritor é uma criança curiosa que nunca cresce. Escrevemos diários ocultos, ou vamos ao psicanalista ou inclusive escrevemos poemas que escondemos, como tentativas de explicação de nós mesmos. As tentativas descrevem nosso lado escuro, tudo o que precisamos ocultar. "O Pedro Juan Gutierrez mais interessante vocês nunca vão conhecer. Escondo o Pedro Juan que tem sonhos, planes, projetos pesadelos, medos. Ninguém deve saber que temos medo da noite ou queremos ter uma relação sexual desviada, ou que não agüentamos o vizinho. O escritor vence sua vergonha natural, se despoja da autoproteção e se põe a escrever sobre esse lado escuro, com descaro, mas são poucas as pessoas que escrevem sobre isso e com graça suficiente. A verdadeira história da literatura nunca se escreveu, a ninguém interessa, está feita a base de censura. Um escritor não pode esperar. Tem que ter capacidade de risco. Cada leitor faz sua leitura, ninguém lê o mesmo livro, ninguém vê o mesmo filme ou ouve a mesma música, cada um constrói seu próprio livro. Algumas pessoas vêem antropologia em meus livros, outros vêem política, outros vêem sexo. O escritor está obrigado a correr as fronteiras do silêncio. Em cada sociedade há uma fronteira de silêncio traçada pelas convenções e o escritor corre o risco de dizer algo que sua sociedade não quer ouvir. O oficio de escritor não é sempre agradável, porque ele se embarra com o que há dentro da sociedade e mostra a ela própria. Isso é o que tens dentro'. É um oficio terrível. Muitos dos escritores que levaram a sério o ofício terminaram loucos, bêbados ou suicidas. Quando nos aproximamos demasiado ao povo da loucura tentamos nos aproximar ao da cordura. O ofício de escritor não é recomendável, eu o recomendo só quando a vontade de escrever é maior que tudo.
fonte: Página do Fronteiras do Pensamento.
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