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Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O "Corajoso" Zé Dirceu

A famosa foto, na frente do avião Hércules, brasileiros trocados pelo resgate do embaixador americano Zé Dirceu mostra as algemas, em cima à esquerda. Flávio Tavares agachado à direita.

Recomendo a leitura dessa crônica do Flávio Tavares sobre Zé Dirceu.

O amigo Zé

por Flávio Tavares *


Conheço José Dirceu há 43 anos e, nele, além de tudo, admiro e valorizo a coragem pessoal. Nossa amizade começou naquele 6 de setembro de 1969 em que, sob a mira de metralhadoras, nos algemaram na Base Aérea do Galeão. Saíamos da prisão (ele em São Paulo, eu no Rio) e nos levaram à pista do aeródromo para uma foto que percorreu o mundo: os presos políticos trocados pelo embaixador dos EUA junto ao avião, rumo ao exílio no México. Era proibido falar, mas no interregno de segundos em que mandaram que eu me agachasse, balbuciei: “Vamos mostrar as algemas!”.

E ali está ele na foto – altivo, mãos ao peito, com as algemas que a maioria do grupo escondia. Preso político não é um criminoso envergonhado do que fez, mas um dissidente que desafia a quem oprime. Foi a primeira e única vez na vida que Zé Dirceu me obedeceu...

A intimidade do exílio nos fez amigos. Um canal de TV convidou-me a dublar telenovelas mexicanas ao português e levei junto Zé Dirceu. Eu “dublava” e coordenava o grupo; ele era o primeiro ator. Mas, dias depois, ele e os demais viajaram a Cuba. Só eu permaneci no México e, assim, nem sequer nossas vozes retornaram ao Brasil, para onde não podíamos voltar.

Ele, porém, desafiou a proibição. A morte era a pena imposta aos desterrados que ousavam regressar, mas Zé voltou, clandestino, em 1972, em plena euforia e terror do general Médici. Treinado em guerrilha, voltou para aliar-se aos que combatiam a ditadura. Em São Paulo, com seu grupo dizimado pela repressão feroz, percebeu que seria a vítima futura e se homiziou no oeste do Paraná. Mudou de nome e virou pacato comerciante de secos e molhados num município inexpressivo. Lá, casou-se e foi pai sem poder dizer quem era sequer à mulher e ao filho. Revelar a verdadeira identidade significaria a morte e ele passou a ser outro.

Já não era quem era. Sacrificava a identidade para não ser sacrificado. Com a anistia do final de 1979, voltou a ser o Zé. Concluiu o curso de Direito e integrou-se ao PT. Ao presidi-lo, tirou-o do atoleiro de seita fechada, mas, na “abertura”, os vícios políticos se incrustaram no PT como vírus.

Com Lula presidente, eram de Zé Dirceu os planos e atos de governo. Lula presidia, Zé governava. Irmãos siameses, um era a extensão do outro. A simpatia ficava com Lula, os atos antipáticos com Zé. Assim, o governo minoritário obteve maioria no Congresso e, hoje, se sabe a que preço e como – subornando o PMDB, o PTB, o PP de Maluf e o PL, que hoje é PR.


Em 2005, no topo do escândalo do “mensalão”, Lula quis renunciar para “não ser um Collor”. De novo, a coragem de Zé Dirceu brotou como água no deserto e ele é que renunciou. No gesto, assumia as responsabilidades e blindava Lula em pleno tiroteio.

Hoje, as 40 mil folhas do processo no Supremo Tribunal mostram o “mensalão” como um elaborado esquema de corrupção e suborno montado a partir “da alta cúpula do governo”. Mas, o mais alto da “alta cúpula” não é réu. A não ser que o presidente fosse um alienado absoluto ou pateta total, como explicar que um simples diretor de marketing do Banco do Brasil desviasse milhões do fundo VisaNet só por instigação de Dirceu, Genoino e Delúbio?

Ou vamos imitar o ministro Lewandowski, que condena os corrompidos sem ver os corruptores, ignorando os sujeitos ativos da corrupção, entre eles o corajoso Zé??

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