Babaquices ideológicas: Paulistanos protestam contra grupo de moradores que se opõe à construção de metrô na avenida Angélica, no bairro de Higienópolis em São Paulo. |
Acompanhei o "churrascão da gente diferenciada" quase inteiro. Foi um protesto de estudantes e das classes médias (médias mais altas do que baixas). O povão ali era residual. Não pretendo tirar o brilho do evento, apenas caracterizá-lo. Havia muitos moradores de Higienópolis no meio das pessoas que gritavam "é a elite mais porca do Brasil".
Vi cenas curiosas: muitos cachorros "diferenciados" na coleira, entre os manifestantes. Pelo menos três golden retriever que decidiram ser "gauche na vida".
Dois "empreendedores" (assim foram chamados) vendiam camisetas com a inscrição: "gente diferenciada". Estavam no meio da avenida Angélica e, acredite, aceitavam pagamento em cartão de crédito. Seriam camelôs "diferenciados"?
O clima era festivo, performático. Alckmin e Kassab foram xingados (o prefeito até mais que o tucano), mas entre as palavras de ordem surgiam músicas como "Trem das Onze", de Adoniran, e a marchinha carnavalesca "Bandeira Branca". Havia lirismo e deboche nesse enfrentamento teatral de classes.
No final, perto de 21h, cerca de 150 estudantes gritavam: "Ei, polícia/ maconha é uma delícia". A PM estava claramente orientada a não contrariar os jovens. Comportou-se como uma babá zelosa. Como teria agido se o ato fosse na periferia?
Um amigo veterano da esquerda brincou que o protesto mais parecia um "playground revolucionário". Outro amigo, porém, disse que a manifestação -espontânea, desatrelada de partidos ou sindicatos- comunga do espírito de outros atos recentes, contra o aumento dos ônibus e o fechamento do Belas Artes.
Ambos parecem ter razão. Bem-humorado e anarquizante, o "churrascão" marca até aqui o ápice de um caldo de cultura novo, ou renovado, de mobilização progressista de parte das camadas privilegiadas. Em jargão, é uma fração de classe reagindo ao sentimento ostensivamente antipovo de representantes dessa mesma classe.
Artigo de Fernando Barros Silva na Folha de hoje.
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