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Ao centro o primeiro ministro George Papandreou que ontem conseguiu aprovar o famoso pacote, o tadinho tem um imenso pepino nas mãos. |
Ótimo artigo de Martin Wolf, colunista do Financial Times sobre a grave crise grega. Os de sempre estão a dizer que ela é fruto amargo das receitas ortodoxas do xarope do neoliberalismo e o escambau: as eternas desculpas daqueles que acreditam que sabem tudo, mas não sabem nada, Sorry!
Hora para bom senso em relação à Grécia
Martin Wolf
Albert Einstein teria dito que insanidade consiste de fazer a mesma coisa repetidas vezes e esperar resultados diferentes. Segundo este padrão, o acordo com a Grécia que está prestes a ser fechado parece insano. A única justificativa, como argumentei em uma coluna em 10 de maio, é a necessidade de ganhar tempo. Essa é uma estratégia ruim. Algo mais radical é necessário.
A pergunta sobre as perspectivas da Grécia não é se o país dará calote. Isso é, no meu entender, uma quase certeza. A pergunta é se um calote seria suficiente para devolver a economia a uma saúde razoável. Eu duvido fortemente. O país parece não competitivo demais para isso. Um calote é uma condição necessária, mas não suficiente, para um retorno à saúde econômica.
O desempenho grego sob o programa acertado com o Fundo Monetário Internacional, em maio de 2010, tem sido impressionante. Mas também não conseguiu devolver o país à solvência. O spread entre os títulos gregos e alemães de 10 anos passou de 460 pontos-base (4,6 pontos percentuais) após o anúncio do programa para 1.460 pontos-base. O mesmo aconteceu com a Irlanda e Portugal. Ainda mais perigosamente, até mesmo os spreads espanhóis atingiram 270 pontos-base. Grécia, Irlanda e Portugal não têm chance de conseguirem tomar empréstimos nos mercados a taxas que podem arcar no futuro previsível.
O que é bastante deprimente para os envolvidos é que esses saltos nos spreads ocorreram apesar de um desempenho razoável. No programa original, a previsão era de que o produto interno bruto grego caísse em 4% em 2010, seguido por 2,5% em 2011. Na revisão de março de 2011, isso provou ser apenas um pouco pior, em 4,5% e 3%, respectivamente. O déficit público foi inicialmente previsto em 8,1% do PIB em 2010 e 7.6% em 2011. Isso cresceu apenas para 9,6% e 7,5%, respectivamente, na revisão de março de 2011. Mesmo no déficit em conta corrente atual, os 10,5% para 2010 e 8,2% para 2011 na revisão de março foram apenas um pouco piores do que as previsões iniciais de 8,4% e 7,1%, respectivamente.
Infelizmente, isso nem começa a ser suficiente por quatro motivos.
Primeiro, o perfil da dívida passou de horrível para ainda pior; no programa inicial, a previsão era de que a relação entre dívida bruta e PIB atingiria seu pico em 149% do PIB em 2012. Na revisão de março, ela já tinha saltado para 159%. Segundo, a economia parece extraordinariamente não competitiva. O indicador mais relevante é a combinação do déficit em conta corrente ainda imenso com uma recessão profunda. Esse déficit externo agora não pode ser financiado no mercado. Terceiro, as perspectivas para o déficit em conta corrente estão deteriorando de modo acentuado: inicialmente, a previsão do FMI para o déficit em conta corrente era de 2,8% do PIB em 2014; na revisão de março, a previsão passou a ser de 5,5% do PIB. Quarto, sem um aumento das exportações, será impossível um retorno ao crescimento sustentável. Mas esse aumento exigiria uma grande redução nos custos nominais. Se isso fosse viável, o que eu duvido, isso aumentaria ainda mais a relação dívida/PIB.
O ceticismo do mercado em relação à capacidade da dívida da Grécia de se tornar merecedora de crédito é justificado. Ele se apoia na consciência de dois fatos: o endividamento imenso e a falta de competitividade. O fato do povo grego não estar disposto a suportar a dor apenas torna o já implausível quase inconcebível. Se essa fosse, digamos, a Finlândia, alguém poderia acreditar. De modo acertado ou equivocado, poucos acreditam que a Grécia atual é outra Finlândia
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No cartaz está dito, "sim à sociedade, não ao poder" |
E qual é o argumento em prol da persistência em emprestar ainda mais e, no processo, transferir uma proporção maior das obrigações do governo grego para os balancetes do setor público? Eu vejo quatro argumentos.
O primeiro é que a estratégia esconde o estado dos credores privados. É muito menos embaraçoso declarar que alguém está ajudando a Grécia quando alguém está, na verdade, ajudando seus próprios bancos. Se os credores privados tiverem tempo suficiente, eles poderão vender seus empréstimos para o setor público ou cancelá-los sem injeções de capital dos Estados.
O segundo argumento é que a estratégia de adiamento permite a outros países colocarem suas casas em ordem antes de um calote grego e talvez uma saída desordenada do euro. Se esses eventos ocorressem agora, como é temido, haveria fuga das dívidas soberanas e bancos de países frágeis, com resultados devastadores.
O terceiro argumento é que é possível que a Grécia consiga se acertar. Dar ao país o máximo apoio torna isso ao menos concebível.
O quarto argumento é que há a previsão pelo FMI de que Grécia terá um déficit fiscal primário (antes do pagamento de juros) de 0.9% do PIB neste ano. Logo, a transferência líquida de recursos seria para o setor público grego. Se este for o caso, um calote não faz sentido.
Esses argumentos são persuasivos aproximadamente em ordem ascendente. O primeiro argumento foi usado para justificar as políticas de negação que deram à América Latina sua “década perdida” nos anos 80. Parecia imoral na época e parece igualmente imoral agora. As perdas devem ser reconhecidas e os bancos recapitalizados. O segundo argumento presume que a posição grega ainda é um mistério. Mas está claro que a fuga já está em andamento de outras jurisdições frágeis. O terceiro argumento não é ridículo, mas esse resultado feliz parece implausível, dada a situação em que a Grécia se encontra. O último argumento é certo. Mas é um para um breve adiamento, não para um esforço eterno.
Quando um resultado é inevitável, é necessário planejar para el e. Nesse caso, esse resultado parece inevitável aos observadores mais informados. Eu vejo pouco mérito no calote dar anos de agonia ao setor público grego em vez de já ao setor privado. A melhor política é agir preventivamente. Um aspecto dessa ação preventiva consistiria em agir para escorar outros membros e sistemas financeiros frágeis da zona do euro mais fortemente do que agora. Pelo menos em um caso, a Irlanda, isso exigiria uma reestruturação da dívida. Isso também certamente exigiria uma adoção de um sistema financeiro para toda a zona do euro com apoio fiscal equivalente.
Mas a principal exigência agora é reconhecer a realidade desagradável. Não é possível tornar o incrível crível com adiamento interminável. Isso só torna o reconhecimento da realidade mais doloroso quando finalmente ocorrer. Chegou finalmente a hora de reconhecer a realidade do apuro grego e agir imediatamente sobre as ramificações mais amplas para seus parceiros.
Tradução: George El Khouri Andolfato, publicado no
UOL