Diversidade, Liberdade e Inclusão Social

Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Análise de uma "certa esquerda" sobre a Crise Egipcia

Radicais que apoiam o Hezbolah saem as ruas em Tripoli, Libano.
A religião como farsa

Artigo de Vladimir Safatle na Folha de hoje.

Há algo de patético em parte dos analistas internacionais e nacionais que, diante da revolta no Egito, só conseguem se lembrar do risco do advento de um governo islâmico. Parece que de nada adianta lembrar que o que se ouve na Tunísia e no Egito são palavras de ordem pedindo democracia, fim do arbítrio, liberdade.


Palavras vindas, principalmente, de jovens que não veem futuro em regimes que misturaram ditadura e liberalismo econômico.


Também não adianta lembrar que, na Tunísia, o maior movimento organizado por trás da revolta é um sindicato (União Geral dos Trabalhadores da Tunísia) e, no Egito, o grupo religioso Irmandade Muçulmana é apenas uma dentre as várias organizações presentes nas manifestações.


Organização que não está na origem das manifestações e que sequer tem um líder capaz de capitalizar os protestos.


Na verdade, precisamos desesperadamente da narrativa que consiste em dizer que, no mundo árabe, só pode haver ou regimes teológico-políticos ou "autocracias" amistosas.


Afinal, como justificar que durante 30 anos nós, arautos dos direitos humanos, apoiamos um regime despótico, com eleições de fachada, assassinato de opositores, censura rígida e plutocracia? Só mesmo inventando que, se não fosse isso, teríamos que engolir o fundamentalismo islâmico.


Mas vejam que engraçado.


Se há um regime no mundo árabe que impôs à vida social um código jurídico totalmente religioso, regime onde os direitos das mulheres, das minorias e as liberdades individuais são massacrados, esse é a Arábia Saudita.


Comparado aos sauditas, os iranianos vivem numa democracia escandinava. Mas você nunca ouviu uma liderança ocidental criticar o regime saudita. O problema do Ocidente não é com a junção reacionária entre religião e política. O problema é com a distinção, digna de Carl Schmitt, entre "amigo" e "inimigo".


O que talvez certos governos ocidentais realmente temam é o aparecimento de um governo laico, democrático, de grande participação popular, mas que não está disposto a submeter-se aos interesses econômicos e geoestratégicos das potências que sempre viram aquela região do mundo como seu "protetorado".


No entanto é isso o que realmente pode acontecer no momento. As comparações com a queda da cortina de ferro no Leste europeu são justificadas. Só que, nesse caso, os árabes usam nossos valores para mostrar que ninguém no Ocidente os levava a sério.


Senão, como explicar uma pérola como a fornecida pelo vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Binden: "Não podemos chamar Mubarak de ditador". Bem, Joe, e como você prefere chamá-lo? De grande amigo e estadista com mãos sujas de sangue?


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Meu Pitaco.
Há um razoável exagero nas críticas de Safatle. Existe sim no meio dos protestos aqueles que defendem o radicalismo e a intolerância muçulmana. Não se trata de uma farsa ou de uma análise falsa. Isso é fato. Há de se ter cautela e prudência nessas análises.  É certo, também, que a crise é econômica, 2/3 da população egípcia é menor de 21 anos e 90% deles estão desempregados. Eles querem -- e com muita razão -- uma melhor qualidade de vida. E o governo Mubarak não é uma ditadura sanguinária. Longe disso. É uma ditadura sim, mas existem ditaduras piores, bem piores, como na Libia e no Irã. E Safatle só fala e se lembra da Arábia Saudita.

8 comentários:

Pablo Vilarnovo disse...

Ok... mas o que tem a ver os liberais com isso? Por acaso ele acha de alguma maneira que, pelo menos economicamente o Egito é liberal?

Esses boçais tentam culpar o liberalismo de tudo! Até onde ele não existe.

Nunca se recuperaram da queda do comunismo...

Carlos Eduardo da Maia disse...

Grande Pablo, é que os liberais comem criancinhas.

Anderson disse...

Os liberais apóiam a ditadura de Mubarak. Não é o bastante?

breno disse...

O Egito é um país liberal, não? Grandes corporações estão lá assentadas com altíssimos lucros. Sem dúvida, é uma nação capitalista liberal apoiada numa ditadura que dura 20 e tantos anos apoiada pelo bloco hegemônico liberal.
Isso é suficiente, não?

senna madureira disse...

Permitam-me um adendo

Os Liberais e Libertários confundem-se em suas ideologias, atos e atitudes.

Até o meu velho amigo Maia, no ano passado, soltou um papo de "liberal de esquerta".

Liberal é liberal e não nada disso não.

No Brasil, o pensamento dito Liberal é de radicais conservadores que se dizem "liberais".

O Egito é uma ditadura das mais descaradas do mundo, embora se mateve com o "U.S. Dept. of State´s support"

Vc. sabe o que é liberal ?

Nunca vi, não provei, eu só ouço falar.

Carlos Eduardo da Maia disse...

Voto com o relator, Senna Madureira.

Pablo Vilarnovo disse...

A partir de alguns "pensamentos" aqui a China é liberal, pois lá tem Nike, McDonalds, IBM...

Quanta ignorância...

Anderson - Você poderia citar um liberal, não precisa ser dois, três ou quatro, um apenas está bom, que defenda a ditadura egípcia? Ou melhor, qualquer outra ditadura?

Detalhe: o Egito encontra-se na 96 posição do índice de liberdade econômica.

O mais engraçado que o senhor que escreveu no texto diz que as pessoas no Egito anseiam por "liberdade", mas liberdade econômica não pode... ele é contra...

marcosomag disse...

O liberalismo foi sim, o estopim das revoltas no OM. As empresas multinacionais de defensivos e transgênicos tiveram apoio do governo dos EUA para convencer governos em todo o mundo, inclusive no OM, a confiar em um suposto "mercado livre" mundial de alimentos em detrimento de uma agricultura autóctone. O resultado foi que a especulação com alimentos que sucedeu a Crise do sub-prime em 2008 aumentou a fome em países como o Egito e a Tunísia. E Mubarak sim, é um ditador sanguinário que matava sistematicamente lideranças opositoras. Só espero que os novos dirigentes do Egito mandem às favas políticas econômicas subordinadas aos EUA para que possam garantir a segurança alimentar de seu país.