Diversidade, Liberdade e Inclusão Social

Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


sexta-feira, 20 de março de 2009

Battisti - O Único Terrorista Refugiado


Cesare Battisti: refugiado político?
Fabio Porta - Folha de hoje


No decorrer de minha recente visita a Brasília, junto com o vice-presidente da Câmara dos Deputados italiana, Maurizio Lupi, tive a ocasião de explicar ao presidente da Câmara brasileira, Michel Temer, e a meus colegas brasileiros a posição do Parlamento italiano sobre o "caso Battisti", confirmada por uma moção aprovada por unanimidade em 26 de fevereiro passado. Em todos os nossos encontros reafirmamos o pleno e grande respeito pelas instituições brasileiras, desaprovando aqueles que na Itália utilizaram de maneira imprópria e inoportuna esse delicado episódio para voltar a propor velhos e ofensivos estereótipos sobre o Brasil. Nesse contexto, o pedido de extradição de Cesare Battisti, apresentado pelo governo Prodi logo após a prisão do terrorista italiano no Rio de Janeiro, em 2007, deve ser considerado pelos fatos específicos a que se refere -e não com base em leituras errôneas da Itália dos anos de 1970 ou, pior ainda, da Itália de hoje. Em longa entrevista à "Carta Capital", Giancarlo Caselli, um dos mais respeitáveis magistrados italianos e protagonista da luta contra a máfia e o terrorismo, recorda como são inúmeras as provas que confirmam as responsabilidades pessoais de Battisti: testemunhos, perícias, documentos, armas e munições sequestradas, além da reconstituição de toda a história do PAC (Proletários Armados pelo Comunismo). Os documentos completos e os textos das sentenças são públicos e estão disponíveis em www.vittimeterrorismo.it. Da leitura desses documentos é fácil compreender que Battisti foi objeto de um processo justo, no pleno respeito de todas as regras do Estado de Direito. O que talvez não dê para "ler" nas sentenças seja o clima e a história política da Itália da década de 1970; algumas pessoas no Brasil tentaram descrevê-la como um país "não democrático" dominado por "leis especiais" e na mão de poderes ocultos como "Gladio" ou a "loja maçônica P2". A Itália dos chamados "anos de chumbo" era, ao contrário, um Estado em que vigorava uma democracia plena e rica, ainda que em um contexto histórico complexo e dramático: era o país de Aldo Moro e Enrico Berlinguer e do "compromisso histórico"; do presidente da República partigiano, o socialista Pertini; do estatuto dos trabalhadores e das principais reformas do bem-estar social desejadas pelos partidos de centro-esquerda. As bombas (da "direita") fizeram terríveis carnificinas de inocentes, como a chacina de Milão de 1969 ou aquela da estação de Bolonha de 1980. Os projéteis (da "esquerda") atingiram "seletivamente" centenas de pessoas, frequentemente sindi- calistas e operários, além de perso- nalidades como Aldo Moro. Lembro isso para afirmar uma primeira verdade: nos anos de 1970, os terroristas de "direita" e de "esquerda" tinham um único alvo: a democracia, o Estado de Direito, o movimento operário e, particularmente, o Partido Comunista Italiano.


Após aqueles anos, inúmeros terroristas foram parar na cadeia. Muitos outros fugiram. Alguns vivem tranquilamente em países democráticos -que, por razões humanitárias, não concedem a extradição que a Itália solicita. O único terrorista italiano no mundo a ter conseguido o status de "refugiado político" é Battisti. Por quê? A França, por exemplo, não disse que Marina Petrella é refugiada política. Disse apenas que, por motivos humanitários, não concederá a extradição. Ponto. Se lhe tivesse conce- dido o status de refugiada política, meu país teria protestado, assim como protestou por Battisti. Pela primeira vez -e contra a decisão do Conare-, o Brasil disse isso para Battisti. Ao conceder o status de refugiado político, supõe-se que o interessado: a) tenha cometido crimes de caráter político; b) esteja fugindo de um Estado ditatorial que o persegue injustamente. Mas o que há de político por trás do assassinato de um açougueiro ou de um joalheiro e, sobretudo, de que país ditatorial Battisti estaria fugindo?


Eu sou de esquerda desde sempre, estou na oposição ao governo Berlusconi, mas nego que hoje na Itália haja uma ditadura. Até o ano passado, Prodi estava no governo. Depois houve eleições e Berlusconi ganhou. Sinto muito por isso e farei o possível para que minha facção volte a governar. Mas não há uma ditadura na Itália. Vivo e trabalho há anos no Brasil, tenho mulher e filhas brasileiras, amo e conheço este país e jamais aceitarei que seja atacado e ridicularizado de forma arrogante e instrumental; com a mesma determinação, porém, permitam-me defender a Itália de interpretações erradas e desviantes que não têm a ver com a realidade de hoje.


FABIO PORTA, sociólogo, é deputado no Parlamento Italiano pelo Partido Democrático. Reside no Brasil e foi eleito pela Circunscrição do Exterior (América do Sul).

Um comentário:

Anônimo disse...

Curto e direto. Se não for suficiente para convencer os defensores de Battisti, nada os convencerá.