Diversidade, Liberdade e Inclusão Social

Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Sionismo e Intransigência


Muito interessante este artigo publicado na Folha de hoje sobre a complicada faixa de Gaza e o sionismo - suas origens e interpretações.

Recomendooooo.
A charge é do Angeli.


Egoísmo coletivo
Mateus Soares de Azevedo

Sderot, em Israel, onde caíram foguetes Qassam do Hamas (de fabricação artesanal, alcance até 10 km e pouca precisão), era, até 1948, um vilarejo palestino.


Seus habitantes foram expulsos antes da criação de Israel e confinados numa estreita faixa de terra, no sudoeste do país, na fronteira com o Egito. Esse pequeno território, com 35 km de comprimento por 10 km de largura, é a tristemente famosa faixa de Gaza.


Para lá foram levados os humilhados e ofendidos palestinos, expulsos pelos novos donos da terra, os sionistas israelenses. Quem são os sionistas? Filosoficamente, o sionismo constitui uma das faces modernas daquela busca sempre perseguida e jamais realizada de um "absoluto" terreno. Busca crescentemente explosiva e destrutiva -nazismo e comunismo são dois outros exemplos dessa busca irracional. Religiosamente, o sionismo representa um rompimento revolucionário com a tradição judaica. É a síntese acabada do processo de secularização do ideal messiânico e uma apostasia do judaísmo. É um desvio profano do messianismo. Politicamente, pertence à família dos totalitarismos ultranacionalistas, em sua modalidade "judaica". Coloco os parênteses porque se trata de uma ruptura com a tradição judaica, sendo uma perversão nacionalista e xenófoba dela. De fato, judeus tradicionais são antissionistas e o consideram uma dessacralização da religião.


O sionismo é um tipo de "egoísmo coletivo". Para nós, tudo; para os outros, nada. Se o egoísmo individual já não é bonito, imagine o coletivo... Ele tira prazer vulgar do narcisismo e do preconceito contra o estrangeiro. Caracteriza-se pela estupidez, pela superficialidade e por um máximo de brutalidade -como se pode constatar sem dificuldade hoje. Em Gaza, a maioria de seus 1,5 milhão de habitantes é de refugiados e seus descendentes, expulsos de cerca de 350 cidades e vilarejos palestinos que foram riscados do mapa por grupos terroristas judaicos, como o Irgun, o Haganá, a gangue Stern ou, posteriormente, pelo Exército israelense.


Ou seja, eles não estão ali por vontade própria, mas porque foram forçados -outro termo para descrever a situação é "limpeza étnica". Apesar de ser outro país, Israel controla o espaço aéreo de Gaza e suas fronteiras terrestres e marítimas. Nada nem ninguém entra ou sai de Gaza sem sua anuência. Além disso, esse bloqueio foi tornado ainda mais rigoroso -um autêntico "selamento" territorial- depois da vitória eleitoral do Hamas há dois anos.


Isso aumentou ainda mais as já terríveis adversidades de seus habitantes: saúde deteriorada, carestia, desemprego de mais de 50% da população masculina. Gaza sofre o que racistas não tão antigamente chamavam de "punição coletiva". Quanto ao massacre militar, que alguns preferem eufemisticamente chamar de "conflito", não há necessidade de entrar em discussão: os números por si sós são eloquentes. Mais de 900 seres humanos, a maioria civis, incluindo duas centenas de crianças, já perderam a vida em Gaza. Quatro mil feridos. A crer no ódio que corre nas veias de muitos israelenses e seus apoiadores no mundo, mais vidas estão para ser ceifadas. Do lado israelense, uma dezena de mortos, a maioria militares. Isso dá uma proporção de 1 para 100. Como escreveu Gideon Levy no jornal israelense "Haaretz", "é como se o seu sangue valesse cem vezes menos do que o nosso, reconhecendo nosso racismo inerente". Muitos questionam o que os brasileiros fariam caso o Hamas lançasse seus foguetes contra nós. Afinal, argumentam, "Israel tem o direito de se defender". Antes disso, devemos perguntar o que faríamos se tivéssemos sido expulsos de nossas terras e comprimidos num exíguo território. O que os brasileiros fariam se tivessem fechado hermeticamente esta área por mais de um ano, sem deixar entrar alimentos ou medicamentos nem permitir à população entrar ou sair?


Falando pelos americanos, Takis Theodoracopulos, editor do site Taki's magazine, respondeu: "O que faríamos nessa situação seria muito mais duro e eficaz do que os oprimidos, mas não vencidos, palestinos têm feito com seus Qassams". Takis conclui: temos sido totalmente iludidos pela poderosa máquina de propaganda sionista. Apoiar essa guerra é justificar seu cortejo de brutalidades e horrores; é ser iludido pela propaganda.


MATEUS SOARES DE AZEVEDO, 48, jornalista, é mestre em história das religiões pela USP e autor de "Homens de Um Livro Só: O Fundamentalismo no Islã e no Pensamento Moderno" (Best Seller, 2008) e "A Inteligência da Fé: Cristianismo, Islã e Judaísmo" (Record, 2006).

3 comentários:

Anônimo disse...

Como foi dito antes, a criação de Israel no local, da maneira e no momento em que foi feito é altamente questionável. Condenável. E tal qual o pan-arabismo, pan-eslavismo, pan-germanismo, o sionismo é uma desgraça ideológica que promove um grande desserviço à humanidade. E o texto ainda pegou leve na crítica da fundação de Israel...

Mas, também é válido o que dizíamos em outro post. Israel é uma realidade que não vai desaparecer. É tão absurdo militar pela extinção de Israel quanto militar pela desocupação de europeus na América, África ou Oceania. Vini, vidi, vici.

Agora é arredondar a situação, e criar de uma vez o Estado palestino.

Anônimo disse...

Outro aspecto perturbador da guerra moderna: não só a maioria é de civis, provavelmente a totalidade é de civis, uma vez que o Hamas é formado por combatentes estilo milícia. É o que acontece no Iraque e no Afeganistão. Ou qualquer outro lugar destes. A guerrilha tem a cara do povo.

Carlos Eduardo da Maia disse...

Bem observado, a guerrilha tem a cara do povo insurgente. A cara do Che Guevara.