Centrais sindicais- que ajudaram a eleger o atual governo -- convocam para a Greve Geral - contra o governo -- em Portugal hoje.
Notas avulsas sobre um país mergulhado na loucura
A conversa era ontem igual em toda a parte: «claro que concordo com a greve, mas o salário está todo contado até ao fim do mês. Não posso perder nem um cêntimo. Já meti um dia de férias».
Sem dados estatísticos que o comprovem, estou convencido que a esmagadora maioria dos portugueses apoia a greve de geral de hoje. Estou também convencido que uma parte significativa da população a faz recorrendo a esquemas que lhe permitam não perder o dia de remuneração.
No fundo, a atitude subjacente a esta greve não se distingue da atitude recorrente do governo desde que tomou posse em 2005 e da atitude geral do país que determinou o estado de catatónico e abúlico em que mergulhámos e que nos atirou para o fundo do poço. Uma crise colectiva da vontade, muito mais do que uma crise económica ou financeira, embora o Presidente da República não tenha capacidade cultural nem intelectual para o compreender.
Tal como o governo e o seu chefe, os grevistas acreditam piamente – com convicção inabalável e ilimitada demência – que, se o desejarmos muito, se o desejarmos com muita fé, pensamento positivo e orações ao santo padre Cícero – a crise vai passar e vamos voltar aos dias felizes da prosperidade, sem necessidade de qualquer sacrifício particular ou atitude séria e empenhada de mudança.
Tal como o governo e o seu chefe, os grevistas de hoje (que, por acaso, são os que votaram ontem a reeleição do governo, apesar de este ter passado quatro anos a tentar demonstrar com força apodíctica a sua desmesurada incapacidade e irresponsabilidade) dão-se mal com a realidade e não conseguem lidar com a realidade. Optam quixotescamente por bafordar contra ela.
E, no entanto, a realidade é hoje, como nunca, de cristalina e transparente leitura: vivemos há anos muito acima das nossas possibilidades, gastando muito mais do que o que produzimos. Isto tem sido possível, porque os estrangeiros nos têm emprestado dinheiro. Agora, os estrangeiros fartaram-se. Não emprestam mais.
Perante isto, em abstracto, só temos quatro possibilidades:
- Ou gastamos menos;
- Ou produzimos mais;
- Ou gastamos menos e produzimos mais;
- Ou nos declaramos incapazes e nos entregamos aos alemães e ao FMI que, de fora e sem respeito pela nossa independência, nos obrigarão a gastar menos e a produzir mais.
A verdade, porém, é que, em concreto, os portugueses já proclamaram que não querem gastar menos, nem produzir mais. Como vem sucedendo desde Guterres, continuam a jurar que querem tudo. De graça e sem esforço. Reconhecem que a crise impõe sacrifícios e concordam sem qualquer reserva que os outros todos os devem fazer. Como o demonstrou de forma contundente e exemplar a muito ponderada, sensata e sacrificada Manuela Ferreira Leite numa conferência na ilha da Madeira.
Sobra, portanto, a quarta solução. É a que vai inelutável e fatalmente impor-se.
Entretanto, o governo e o seu tresloucado chefe juram que não, que vivemos tempos de crescimento e de sucesso económico ímpares que nos distanciam anos-luz da Grécia, da Irlanda e da Espanha e que fazem de nós a inveja e o espanto do mundo e dos alemães.
O povo, do seu lado, faz greve. Como se a greve aumentasse a produção ou nos pagasse as dívidas.
«Mas combate as injustiças» – redarguir-me-ão. Que o nosso problema não é apenas o de sermos pobres, mas o de a riqueza e de a pobreza serem sempre distribuídas pelos mesmos.
Concedo. Esse é um problema real, grave e sério. Todavia, não afasta o outro, o prévio: vivemos colectivamente acima das nossas possibilidades.
E nenhum dos dois se combate com greves nem com votos. Combate-se com armas e com violência. É aí que vamos acabar. Já sem retorno. Amanhã com mais danos e sangue do que hoje.
Teórico aburguesado, aguardo que outros morram na rua por mim. Vou trabalhar.
Meu último pitaco: vai direto para o meu blogroll.
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3 comentários:
Concordo com o texto. Só lamento um pequeno apontamento (com o resto concordo em absoluto): é que os Portugueses preferiram voltar a votar em Sócrates - uma pessoa que mente despudoradamente e nem se sabe se tem curso superior - em vez da Dr.ª Manuela Ferreira Leite, a qual é de contas certas e professora catedrática em Ciências Económicas. Ou seja, os Portugueses preferiram votar em conversa fiada do que em competência certa e rigor de contas. As consequências estão à vista.
Prezado Pulha, qualquer estado hoje tem de cuidar com absoluto rigor as contas públicas. Somente em 1994, o Brasil começou a controlar os gastos, apesar do nosso atual pop presidente ter exagerado nos últimos tepos. A Grécia está onde está exatamente por causa disso. E Portugal vai sair dessas águas turbulentas.
haha, genial o texto do gajo...
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