Diversidade, Liberdade e Inclusão Social

Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Descascando a Ideologia e Criticando a Religião


Confesso, o Diário Gauche é minha fonte de inspiração.
Quando leio os textos do Cristóvão Feil, redator do DG, meus dedos serelepes têm uma vontade imensa de escrever.
Hoje o Feil falou do velho Hegel. Eu não vou transcrever o post inteiro, mas parte dele está aqui abaixo.

Hegel diz que o indivíduo – reduzido a si mesmo – é uma abstração. Eis porque, observa Hyppolite, a unidade orgânica verdadeira, o universo concreto, para Hegel, será o povo. O individualismo, para ele, é produto do cristianismo, que ele chamará de “religião privada”. A vida pública cidadã da velha Grécia era estimulada pelo politeísmo, pelos mitos, pelas cerimônias que acabaram formando o que ele chama do “espírito de um povo”.O homem livre é o homem que participa, diz Hegel. O indivíduo não poderia realizar-se em sua plenitude senão participando do que o ultrapassa e o exprime ao mesmo tempo, de uma família, de uma cultura, de um povo. É somente assim que ele é livre – explica o professor Jean Hyppolite acerca do alemão.

“A supressão da religião pagã pela religião cristã é uma das revoluções mais surpreendentes – conclui Hegel – , e a procura das suas causas deve ocupar mais particularmente o filósofo da história”.O cidadão antigo era livre porque precisamente ele não opunha a sua vida privada à sua vida pública, ele pertencia à cidade. A cidade não era – como Estado – um poder estranho que o constrangesse. “Como homem livre, obedecia a leis que ele próprio fizera. Sacrificava a sua propriedade, as suas paixões, a sua vida, por uma realidade que era a sua” (Fenomenologia).

A mitologia religiosa antiga, pré-cristã, era a religião da cidade-cidadania, que atribuía aos seus deuses o seu nascimento, o seu desenvolvimento, e suas vitórias. Ao contrário do cristianismo, a religião pagã não era uma fuga para um além, era uma religião da vivência cidadã, participativa. A religião supra-individual – para além do indivíduo – da liberdade. Não havia, portanto, uma oposição entre indivíduo e Estado. Hegel dizia que o cidadão punha a parte eterna de si mesmo em sua cidade e não no além, como o cristianismo.

O Direito romano, para ele, já representa a substituição da vida ética da cidade, que aos poucos desaparece. A imagem do Estado, como um produto de sua própria atividade, desapareceu da alma do cidadão. Este se sente apenas a peça de uma engrenagem que já não lhe pertence ou domina. Este atomismo social prepara o caminho para o advento do cristianismo, onde o Direito é o triunfo do individualismo, mas o que é reconhecido neste homem é a pessoa abstrata, a máscara do homem vivo e concreto.

A passividade do homem – diz Hyppolite – vem acompanhada dessa exigência cujo têrmo era o além.É dessa decomposição da velha cidade que aparece a consciência infeliz, e o cristianismo, para Hegel, é uma expressão disso.

A religião cristã é uma teologia positiva, o homem só se submete a ela porque teme a Deus, um Deus que está muito além dele e do qual ele é escravo.Mais adiante, Hegel diz que a “nossa religião [a cristã] quer elevar os homens à categoria de cidadãos do céu, cujo olhar está sempre voltado para cima, e com isso se tornam estranhos aos sentimentos humanos”.Agora, o mundo da vida real e o do pensamento são diferentes, há um abismo entre a moral privada e o ethos - os costumes existentes.

A velha democracia grega está ultrapassada, porque no mundo moderno ela corre o risco de não ser mais que uma dissolução do Estado nos interêsses privados. Os governos já não são mais a expressão de todos, mas aparecem como tendo uma existência independente.Com a queda de Wall Street o mundo não só dá um salto, como diz o mestre, mas dá cambalhotas, exigindo duas coisas de imediato: conceito, ferramentas para o pensamento, e ação.

Hegel dizia que “se a realidade é inconcebível, então cumpre-nos forjar conceitos inconcebíveis”.O inconcebível no conceito é a antinomia, o encontro da contradição viva e aguda. Portanto, estamos dropando a onda do inconcebível, vivendo a história, o destino e o julgamento do mundo.

O destino é a consciência de si mesmo, “mas como de um inimigo”, é aquilo que o homem é, mas que lhe aparece como se tendo tornado estranho.A ação política “perturba a quietude do ser”, onde “só as pedras são inocentes, porque elas não agem, mas o homem deve agir”.

Inspirado em Hegel, Karel Kosik pergunta e responde: o que o homem realiza na história? Na história o homem realiza a si mesmo. Não apenas o homem não sabe quem é, antes da história e independente da história, mas só na história o homem existe. O homem se realiza, isto é, se humaniza na história.Pela primeira vez na história da humanidade, um modelo de produção e reprodução da vida social cresce, se desenvolve e entra em colapso num intervalo de tempo que cabe na vida de um indivíduo. Um sujeito que tenha 50 anos hoje, conseguiu ver o início da hipertrofia dinheirista do capital, depois assistiu a Thatcher dizer que “não existe essa coisa chamada sociedade”, e, agora, olha assombrado para bancos e tradicionais montadoras de automóveis (uma delas chegou a dar nome à sociedade de consumo do século 20) recebendo socorro monetário do outrora tão desprezado Estado.

Na história se realiza o homem, lembra Kosik, e somente o homem. A mercadoria, o dinheiro, são criações humanas, que às vezes a ideologia faz com que nos esqueçamos disso, que é elementar, mas tão ocultado por camadas e mais camadas de feitiçarias. Portanto, não é a história que é trágica, mas o trágico está na história – como lembra Kosik. Não é absurda, mas é o absurdo que nasce da história. Não é cruel, mas as crueldades são cometidas na história. Não é ridícula, mas as comédias se encontram na história.O breve ciclo de trinta anos que ora assistimos se fechar, no palco da história, teve um muito de tudo isso: tragédia, absurdo, crueldade e comédia. Coisas da vida.

Foi com base no post do DG - sempre muito bem escrito, reconheço - que este blogueiro resolveu escrever o post anterior, "A História Imposta".

Mas acrescento, ainda, o seguinte:

Volto a dizer, a crise tem um lado positivo. Foi-se o tempo da fé no livre mercado. Mas isso não significa que as velhas profecias dos livros antigos, alguns deles mofados pelo bolor da caducidade, tenham acertado no alvo exato. O futuro da humanidade, a história futura ninguém sabe, porque ninguém viu. Mas existem linguagens a serem seguidas de desenvolvimento social e econômico e com respeito ambiental que não podem ser menosprezadas. Não estou dizendo que esse é um caminho de fé, mas é uma via de meio termo e de múltiplas escolhas, concreta, objetiva e real. Enganam-se aqueles que a humanidade será salva pela ideologia ou religião. Isso é crendice dos pitorescos magos de plantão.

As Soluções mágicas nas filosofias de Cristo e Marx são as mais óbvias possíveis: amar uns aos outros e a união dos explorados. Também acho que devemos amar uns aos outros e também acho que os explorados devem se unir. Mas se unir em torno de qual objetivo e para construir qual história? A história da Igreja e do socialismo real? A história do mundo estatizado? A história da catequização da humanidade? A própria história já demonstrou que essas "histórias" não salvaram ninguém. Muito pelo contrário, são histórias do escravismo das idéias e das críticas e da redução do homem aos ordenamentos dos politburos da vida.

2 comentários:

Anônimo disse...

É aqui que nossos caminhos se afastam. Eu tenho lido constantemente que a causa da crise é o livre mercado. Não é. Mesmo nos países onde vigora um capitalismo mais liberal, ele não é suficientemente liberal.

As bolhas que estouraram são a prova da intervenção do Estado existe. E não é pequena! Os lobbystas americanos são também uma evidência.

Carlos Eduardo da Maia disse...

Essa crise está ai e está fazendo história porque houve falha do controle do Estado sobre o mercado. Deve sim o Estado regulamentar e fiscalizar essas atividades. As bolhas estouraram porque o mercado deu crédito sem lastro.