Diversidade, Liberdade e Inclusão Social

Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Investindo em C & T


A crise e a pesquisa industrial

Luiz Eugenio Araújo de Moraes Mello

Poucos sabem, mas Basf e AGFA tem "anilina" no nome. Ambas surgiram como produtoras de corantes à base de anilina durante a revolução industrial, que teve origem no final do século 19 e que fomentou pela primeira vez no mundo a pesquisa na indústria.

No entanto, apesar de "anilina" constar do nome de ambas, é pouco provável que alguém que esteja lendo este texto tenha comprado anilina desses fabricantes. Como muitas outras indústrias, ao longo do tempo, Basf e AGFA se adaptaram aos novos mercados. Modificaram seu leque de produtos em consonância com as necessidades dos mercados e dos novos tempos.

Pesquisa industrial por si só não é garantia de sobrevivência para nenhuma empresa no mundo moderno. Mesmo ampla em termos de aporte financeiro e da qualificação de cientistas envolvidos, a pesquisa industrial feita pela RCA e pela Westinghouse não impediu que ambas fossem deslocadas por companhias mais eficientes e competitivas. Por outro lado, não foi a presença da pesquisa nessas empresas que as eliminou do mercado.


Já a ausência de pesquisa industrial parece ter sido um componente importante para a extinção da indústria siderúrgica norte-americana.Em 1960, convidado a falar em uma reunião anual da indústria siderúrgica norte-americana, o assessor cientifico da Presidência dos Estados Unidos vaticinou: "Não entendo por que vocês me convidaram para falar sobre pesquisa, tendo em vista que vocês não fazem nada nesse sentido" (referindo-se a pesquisas de relevância)."No ritmo atual e caso não ocorram mudanças, vocês estarão fora do negócio em 20 anos".


De fato, no início da década de 1980, cerca de 320 mil funcionários das companhias siderúrgicas norte-americanas (75% do total) haviam perdido seus empregos.Não é fácil para uma empresa, entre ações de efeitos imediatos e palpáveis e investimentos em um futuro aparentemente incerto, decidir-se pelo último cenário.Os cortes anunciados pelas diversas empresas no Brasil e no mundo são certamente uma parte necessária do ajuste essencial para sobrevivência em um cenário de diferentes níveis de demandas, preços e taxas de câmbio.Ainda no caso norte-americano, não deixa de ser notável que uma das promessas da General Motors para se habilitar a novo aporte de recurso do governo dos EUA seja um carro híbrido elétrico/gasolina.Nesse caso, fica claro que o fiador do empréstimo de US$ 25 bilhões é, em última análise, fruto do investimento da companhia em ciência e tecnologia (C&T) realizado em anos anteriores.O investimento empresarial em ciência e tecnologia empreendido no Japão, na Coréia, em Cingapura e nos Estados Unidos é sempre significativamente maior que o investimento governamental.

No Brasil, essa situação é invertida. Aqui, como porcentagem do PIB, esse montante é três vezes menor que em Cingapura e quase sete vezes menor que no Japão.Em virtude disso, não é estranho estarmos tão distantes em depósitos de patentes nos EUA quando comparados com esses países. Mesmo na sempre surpreendente China, o setor empresarial investe mais que o dobro em C&T do que o governo chinês.

Investir em C&T não é a garantia de sobrevivência para nenhum empreendimento. Não investir em C&T é certamente uma sentença de morte para qualquer empreendimento que pretenda manter-se ativo em longo prazo.Os cortes de curto prazo das indústrias no Brasil deveriam ser acompanhados de uma revisão nas suas estratégias de C&T no longo prazo. As profecias do assessor científico de J. F. Kennedy parecem ser tão válidas hoje como há quase 50 anos.


Artigo publicado na Folha de hoje de LUIZ EUGENIO ARAÚJO DE MORAES MELLO , 51, graduado em medicina, mestre e doutor em biologia molecular, com pós-doutorado em neurofisiologia pela Universidade da Califórnia, em Los Angeles (EUA), é pesquisador da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), presidente da Federação de Sociedades de Biologia Experimental (FeSBE) e membro titular da Academia de Ciências do Estado de São Paulo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Amém.