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quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Personagem Principal dos Falsários Morou em Porto Alegre de 1950 Até Falecer em 1976



Foto real dos "Falsários" depois de serem liberados em Ebensee em 5 de maio de 1945. NaO primeiro da fila da frente à esquerda, de camisa branca é Solomon Smolianoff, o último é Adolf Burger, que queria sabotar o plano de falsificação de notas de dólar e libras e que escreveu o livro.




Ficha de Salomon (ou Sally) Smolianoff na Interpol.


Incrível.
Assisti no último fim de semana o filme alemão, ganhador do Oscar de melhor filme estrangeiro de 2009, Os Falsários. O post sobre o filme está aqui. Um belo e inteligente filme que trata, acima de tudo, de um dilema moral. A história é verdadeira e fiquei sabendo ontem que o personagem principal do filme -- e da história -- residiu em Porto Alegre de 1950 até sua morte em 1976. Ele está enterrado no cemitério israelita da capital gaúcha. Coisas da vida.


Matéria da ZH publicada em 19 de julho de 2009:

Porto Alegre, o último refúgio


Judeu ucraniano recrutado por operação de falsificação de dinheiro na II Guerra terminou seus dias no sul do Brasil

Perseguido pelos comunistas em sua Ucrânia natal, pelos nazistas por sua condição de judeu e pela Interpol por suas atividades como falsificador de dinheiro – a história do pintor Salomon Smolianoff sintetiza parte da própria história do século 20, porém do ponto de vista de alguém que passou a vida na obscuridade, encondendo-se em diferentes países, nas mais variadas circunstâncias. O capítulo mais conhecido dessa trajetória foi revelado em Os Falsários, filme austríaco que ganhou o Oscar de melhor longa estrangeiro de 2008 e que estreou por aqui no mês passado. O mais misterioso se deu em Porto Alegre.Alguns registros indicam que Sally, como era conhecido, nasceu em 1899. Mas a data que consta em seu túmulo, localizado no Cemitério Israe­lita Porto-Alegrense, confirma o que ele contava para amigos e ex-colegas de ateliê em seus últimos anos, vividos na capital gaúcha: seu nascimento se deu em 1897, em Kremenchuk. A juventude e grande parte de sua formação Smolianoff teria passado em Odessa, cidade do litoral da Ucrânia que antes da Revolução Russa era apontada como a mais cosmopolita daquele país e, também, a mais judia de todo o grande território soviético.
O verbo condicional se justifica pelas dificuldades de rastrear seus deslocamentos. Livros e arquivos da Interpol disponibilizados na internet pelo jornalista Lawrence Malkin contam parte da história, mas, desde sua chegada a Porto Alegre, em meados dos anos 1950, tudo fica mais nebuloso – ao menos para os pesquisadores europeus e americanos, que não tiveram contato pessoal com ele.– Sally vivia num apartamento de dois quartos que também usava como ateliê e oficina de criação de brinquedos artesanais, que vendia para ganhar a sua graninha – conta Magaly Amaral da Costa, 70 anos, que trabalhou durante uma década para Smolianoff.
Ele morou na Capital até morrer, em 1976, sempre no mesmo endereço: Avenida João Pessoa, ao lado do terreno sobre o qual hoje está erguido o Shopping João Pessoa e onde, à época, costumavam se estabelecer circos que passavam pela cidade.– O Sally se ocupava pintando retratos das pessoas. Os brinquedos, quem de fato criava era a mulher dele, Charlotte, sempre inspirada em animais, palhaços e outras figuras que via nos circos – lembra Suely Franco da Silva, 72, bióloga que também foi empregada pelo ucraniano.
Segredos e mentiras
A vida em Porto Alegre, no entanto, era muito discreta. As auxiliares de ateliê relatam que poucas pessoas o visitavam. Nem o próprio nome Salomon fazia questão de espalhar.– Ele dizia se chamar Sali – relata Magaly, enfatizando que, na grafia, Smolianoff usava apenas um L e o I. – Sempre que precisava fazer alguma carta comercial, pedia ajuda para a gente. Conhecia bem a língua portuguesa, mas tomava muitos cuidados com documentos oficiais.O motivo das precauções era óbvio, mas só veio à tona, para quem convivia com ele no Brasil, quando a revista O Cruzeiro estampou em sua capa, em 26 de novembro de 1960, a manchete “Exclusivo: rei dos falsários foge do passado”. “Vocês chegaram a ver a Cruzeiro?”, perguntou Sally aos colegas de ateliê no dia seguinte, referindo-se ao texto de Tabajara Tajes e às fotos que Antonio Ronek fez do próprio Smolianoff e de um delegado que havia acabado de passar relatos à Interpol. Diante das respostas sempre afirmativas, não restava outra alternativa ao homem que não admitir que fora mais do que um simples prisioneiro judeu na II Guerra Mundial. Sally foi o principal falsário recrutado pelo oficial nazista Bernhard Krüger naquele que até hoje costuma ser apontado como o maior programa de falsificação de dinheiro da história – a Operação Bernhard, levada a cabo pelos comandados de Hitler entre 1942 e 1945 buscando desestabilizar a economia dos Aliados. Hábil retratista e anticomunista convicto, Smolianoff já trabalhara na falsificação de notas russas com o objetivo de incomodar o governo bolchevique da União Soviética desde que fugiu para a Turquia, nos anos 1920. Era, coisa que o exército alemão não demorou a descobrir, o maior “talento” não só dos 142 falsificadores reunidos por Krüger no campo de concentração de Sachsenhausen, mas o melhor entre todos os falsários até então descobertos – e o único capaz de criar libras esterlinas falsas tão verossímeis que enganaram até as instituições financeiras britânicas.Os dilemas morais e os conflitos de consciência em Sachsenhausen, que são o melhor do excelente longa-metragem dirigido pelo austríaco Stefan Ruzovitzky – que alternativas tinham aqueles judeus para não colaborar com seus próprios inimigos? –, não acabaram com o fim da guerra.– Sally tinha uma tristeza no olhar que era absolutamente indisfarçável. Isso o tempo inteiro, ao longo de todos os anos – observa Suely. .O monitoramento ininterrupto da Interpol, na Itália, no Uruguai e onde mais Smolianoff tenha morado antes de Porto Alegre, incentivou-o a manter discrição e assim tornar – quase – obscura a história de seus últimos anos de vida. Mas, mais que isso, lembrava-o a cada instante de que, além de ser um simples pintor de retratos e vendedor de brinquedos, ele carregava uma culpa para sempre inexpiável.



8 comentários:

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