Diversidade, Liberdade e Inclusão Social

Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

A Revolução do Palavrão



Lula não é Evo


A revolução de Lula é o palavrão. É único. É genial. Lula poderia ser um Evo Morales. Ambos são egressos do povo mais subalterno de seus países. Lula, ex-operário, ex-retirante do Nordeste paupérrimo; Evo Morales, camponês e índio num país de índios e camponeses.

Quando Lula assumiu a presidência, as lideranças do Ocidente desenvolvido e das classes empresariais do Brasil desconfiaram dele. Temiam que fosse o que Evo Morales foi mais tarde. Mas não. Eleito, Lula fez o que faria qualquer líder do Norte nababo. Fez um governo capitalista comportado, cumpridor de regras, social-democrata.

A diferença de Lula para os governantes dos países ricos é que ele volta e meia tece uma imagem grosseira em seus discursos, ou joga bola com seus ministros, ou veste chapéus esquisitos. Ou fala palavrão. Está sempre lembrando ao mundo de que ele é “do povo”, é “autêntico”. Funciona. Quando Lula comete uma bizarrice pública, os líderes dos países ricos balançam a cabeça, sorrindo, e comentam:
– Esse Lula...

Eles o aceitam como ele é, e até o festejam. Afinal, embora ele seja “do povo”, também é um deles. É inofensivo, não é um Evo Morales, que, índio empossado na presidência da Bolívia, tenta dar a Bolívia aos índios, que são mais de 90% de seus cidadãos. Lula, ao contrário, manteve tudo como estava, e assim construiu seu prestígio internacional. Porque sua figura é imensamente sedutora: trata-se de um ser exótico, um personagem que oscila entre a rudeza brejeira e a esperteza divertida, de quem se pode esperar tudo, até o palavrão proferido em público, mas nunca algo que contrarie as regras ditadas pelos economistas mais moderados.


Lula é o sonho realizado da intelectualidade ocidental. Na política externa, o general Geisel foi mais contestador, mais duro e mais rebelde do que o operário Lula. Na administração interna, Lula consolidou seu governo tendo a sagacidade e o bom senso de não mexer na economia, tendo a sensibilidade de incrementar uma medida humanitária de aumento de benefícios sociais, e tendo a temeridade de imitar Médici e Juscelino ao inchar a máquina pública e ao lançar um projeto desenvolvimentista.

Quando Lula deixar a presidência, o Brasil estará um pouco diferente. Ao eliminar a fome sistemática, ele deu dignidade a muitos brasileiros, ainda que isso tenha sido feito com a mera doação de dinheiro. É uma evolução. Mas os gastos de seu governo serão uma conta cara, que alguém terá de pagar. E será um retrocesso.

São mudanças, portanto. Mas poucas. Nada que assuste. Nada que um Evo Morales faria. Nada com que, imagino, sonharia um petista histórico, um Olívio, um Pont, um Koutzii, velhos companheiros do antigo Lula, que não existe mais. Claro que talvez a melhor mudança não seja mesmo a de Evo, ou a que, suponho, seria de Olívio, Pont e Koutzii. Mas Lula poderia promover uma mudança mais profunda. Na segurança pública, na previdência, na educação fundamental. Na estrutura do país, enfim. Poderia promover algo parecido com uma revolução. Lula não quis. Lula preferiu revolucionar falando palavrão.

Artigo de David Coimbra na ZH de hoje.



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