Eu também tive a mesma sensação da Martha Medeiros, a palestra que assisti ontem do Wenders no Fronteiras causou um 'insight'. Foi uma conversa com muito 'feed back'.
Você deve conhecer essa sensação: ao final de um evento (pode ser um filme, uma peça, uma festa, um encontro, uma viagem, um livro) você suspira fundo e pensa consigo mesmo que não só valeu a pena, mas que saiu transformado da experiência. É mais ou menos assim que fiquei após assistir à palestra de Wim Wenders na noite de ontem, uma segunda-feira chuvosa em Porto Alegre. Não por acaso, o público que tomava o Salão de Atos da Reitoria da UFRGS aplaudia e aplaudia e aplaudia sem parar, ninguém tinha vontade de cessar a homenagem. Por que? Por vários motivos. Aos 65 anos, o alemão Wim Wenders é um homem centrado, que fala pausadamente sobre coisas simples e universais, e que nos abre os olhos para o que intimamente sabemos, mas que no atropelo dos dias, esquecemos de lembrar.
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O ciclo de palestras chama-se Fronteiras do Pensamento e Wim Wenders escolheu esse tema: fronteiras. A palavra sofreu um desgaste e perdeu qualquer status. Fronteira lembra muro, porteira, prisão, e quem quer isso? Então vem a globalização e faz do universo um lugar onde todos se parecem, tudo se parece. É bom isso? Pois Wim Wenders glorifica as fronteiras como um espaço importante para se concentrar no que se é, em quem se é. Ele valoriza uma coisa que estamos perdendo: a sensação de pertencer a um lugar, e tudo o que esse lugar nos transmite. Rejeita filmes que possam acontecer em qualquer cidade, em qualquer época. Ele quer a identidade, ele quer o foco no que é micro, para que isso possa ganhar o mundo e comunicar: há outras vidas além dos padrões instituídos.
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Wenders fala do grande prazer que tem em aliar cinema e música. Para comprar sua primeira câmera, aos 22 anos, ele teve que vender seu amado saxofone. Acredita que o mundo perdeu um músico medíocre e ganhou um cineasta razoável. Modesto, o homem. Wenders ama o blues, o rock, a música latina. Ele apresentou Ry Cooder ao mundo, através do filme Paris, Texas (não sei se ao mundo, mas a mim, certamente, que saí do cinema correndo para comprar a trilha sonora). Ele dirigiu o documentário Buena Vista Social Club, que revelou os fantásticos músicos cubanos. Ele filma com o coração, com a mente, com os olhos, mas também com o ouvido.
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Eu falei documentário? Wenders diz que, ao chegar num cinema e encontrar 8 ou 10 opções de filmes, se entre eles houver um documentário, é nessa sala que ele entra. O documentário é o diferencial do cinema de hoje. É o olhar focado, que traz informação, emoção e que atravessa paredes. Enquando ele dizia isso, lembrei de Janelas da Alma, um documentário brasileiro sobre a visão e a perda da visão, sobre a miopia do mundo (direção de João Jardim e Walter Carvalho), que foi das coisas mais emocionantes que assisti no cinema, e que não por acaso contava com um depoimento de Wim Wenders, que usa um óculos de grau desse tamanho, mas que enxerga longe.
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Fim de palestra, Wenders pede licença para apresentar um documentário dirigido por ele, com duração de 20 minutos. A organização Médicos sem Fronteiras fez uma lista das terríveis mazelas por que passam várias regiões carentes e ofereceu a lista para vários cineastas escolherem o que filmar, numa tentativa de mostrar ao mundo as dores que ninguém vê. Wenders escolheu filmar depoimentos sobre mulheres que sofrem abuso sexual no Congo, na região mais pobre e isolada da África. O documentário chama-se Invisible Crimes e deixou a platéia de garganta seca e olhos marejados. Belamente filmado, ele colheu testemunhos de uma brutalidade que está acontecendo agora, nesse momento, com garotas de 13 anos, de 18 anos, com mulheres de 40, de 60 anos, cidadãs que não têm seus direitos respeitados e que sofrem nas mãos de criminosos impunes, em lugares onde não existe lei. Assim como no Congo, isso acontece aqui no Brasil e em diversos outros lugares. Mas o que a gente lê nas revistas? Como o botox pode nos rejuvenecer!
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O mundo é imenso. Um grande playground onde só se cultua o sexo e a violência. Mas se prestarmos atenção nos detalhes, nos espaços fechados, onde câmeras não entram, onde fotógrafos não clicam, poderemos ter uma visão mais abrangente do mundo e alcançar a paz. A globalização é uma falsa abrangência. É o que gera a verdadeira invisibilidade, e agora as palavras já não são dele, mas minhas, que saí comovida dessa palestra.
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Vi poucos filmes dele. Gostei de alguns, outros achei maçantes. Mas o papo foi muito além do cinema. Falou-se de vida. E nisso ele consegue ser um mestre ainda maior.
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Desculpem a tietagem. Estou escrevendo sem racionalidade ou revisão, apenas transmitindo o que senti pra vocês, que não estavam lá.
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Vida longa aos que ainda conseguem enxergar o mundo com olhos sensíveis.
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O ciclo de palestras chama-se Fronteiras do Pensamento e Wim Wenders escolheu esse tema: fronteiras. A palavra sofreu um desgaste e perdeu qualquer status. Fronteira lembra muro, porteira, prisão, e quem quer isso? Então vem a globalização e faz do universo um lugar onde todos se parecem, tudo se parece. É bom isso? Pois Wim Wenders glorifica as fronteiras como um espaço importante para se concentrar no que se é, em quem se é. Ele valoriza uma coisa que estamos perdendo: a sensação de pertencer a um lugar, e tudo o que esse lugar nos transmite. Rejeita filmes que possam acontecer em qualquer cidade, em qualquer época. Ele quer a identidade, ele quer o foco no que é micro, para que isso possa ganhar o mundo e comunicar: há outras vidas além dos padrões instituídos.
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Wenders fala do grande prazer que tem em aliar cinema e música. Para comprar sua primeira câmera, aos 22 anos, ele teve que vender seu amado saxofone. Acredita que o mundo perdeu um músico medíocre e ganhou um cineasta razoável. Modesto, o homem. Wenders ama o blues, o rock, a música latina. Ele apresentou Ry Cooder ao mundo, através do filme Paris, Texas (não sei se ao mundo, mas a mim, certamente, que saí do cinema correndo para comprar a trilha sonora). Ele dirigiu o documentário Buena Vista Social Club, que revelou os fantásticos músicos cubanos. Ele filma com o coração, com a mente, com os olhos, mas também com o ouvido.
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Eu falei documentário? Wenders diz que, ao chegar num cinema e encontrar 8 ou 10 opções de filmes, se entre eles houver um documentário, é nessa sala que ele entra. O documentário é o diferencial do cinema de hoje. É o olhar focado, que traz informação, emoção e que atravessa paredes. Enquando ele dizia isso, lembrei de Janelas da Alma, um documentário brasileiro sobre a visão e a perda da visão, sobre a miopia do mundo (direção de João Jardim e Walter Carvalho), que foi das coisas mais emocionantes que assisti no cinema, e que não por acaso contava com um depoimento de Wim Wenders, que usa um óculos de grau desse tamanho, mas que enxerga longe.
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Fim de palestra, Wenders pede licença para apresentar um documentário dirigido por ele, com duração de 20 minutos. A organização Médicos sem Fronteiras fez uma lista das terríveis mazelas por que passam várias regiões carentes e ofereceu a lista para vários cineastas escolherem o que filmar, numa tentativa de mostrar ao mundo as dores que ninguém vê. Wenders escolheu filmar depoimentos sobre mulheres que sofrem abuso sexual no Congo, na região mais pobre e isolada da África. O documentário chama-se Invisible Crimes e deixou a platéia de garganta seca e olhos marejados. Belamente filmado, ele colheu testemunhos de uma brutalidade que está acontecendo agora, nesse momento, com garotas de 13 anos, de 18 anos, com mulheres de 40, de 60 anos, cidadãs que não têm seus direitos respeitados e que sofrem nas mãos de criminosos impunes, em lugares onde não existe lei. Assim como no Congo, isso acontece aqui no Brasil e em diversos outros lugares. Mas o que a gente lê nas revistas? Como o botox pode nos rejuvenecer!
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O mundo é imenso. Um grande playground onde só se cultua o sexo e a violência. Mas se prestarmos atenção nos detalhes, nos espaços fechados, onde câmeras não entram, onde fotógrafos não clicam, poderemos ter uma visão mais abrangente do mundo e alcançar a paz. A globalização é uma falsa abrangência. É o que gera a verdadeira invisibilidade, e agora as palavras já não são dele, mas minhas, que saí comovida dessa palestra.
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Vi poucos filmes dele. Gostei de alguns, outros achei maçantes. Mas o papo foi muito além do cinema. Falou-se de vida. E nisso ele consegue ser um mestre ainda maior.
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Desculpem a tietagem. Estou escrevendo sem racionalidade ou revisão, apenas transmitindo o que senti pra vocês, que não estavam lá.
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Vida longa aos que ainda conseguem enxergar o mundo com olhos sensíveis.
Pescado do Blog da Martha Medeiros.
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