Diversidade, Liberdade e Inclusão Social

Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


quarta-feira, 10 de junho de 2009

Juros e Ressacas




Câmbio, scotch e água tônica

Certas informações sobre a recente apreciação do câmbio no Brasil me lembram uma velha história. Um cientista, apreciador de bebidas mais fortes, resolveu testar o que causava suas monumentais ressacas. Assim, na segunda-feira tomou gim e tônica, sofrendo a inevitável ressaca. Na terça, uísque e tônica, com as mesmas consequências. Na quarta, cachaça e tônica, enquanto na quinta e na sexta foram testadas tequila e tônica seguidas de bourbon e tônica. No sábado, confiante, apesar da cabeça latejando, concluiu: a causa da ressaca é a água tônica. Já nossos keynesianos de quermesse (incluindo os que em dezembro, com o dólar a R$ 2,40, reclamavam da depreciação excessiva da moeda) apontam a taxa de juros como o fator que tem levado ao fortalecimento do real, aparentemente alheios ao fato de o diferencial entre o juro brasileiro e o americano ser hoje menor do que há alguns meses, quando o real era bem mais fraco. De fato, em dezembro a diferença de taxas era de 13,5%, caindo para algo como 10%. Se o juro explica tudo e era maior lá atrás, por que a moeda só se valorizou agora? Mas, se não é a água tônica, o que poderia estar causando o barateamento do dólar? A primeira coisa a notar é que esse fenômeno não é local, mas nitidamente global. Assim, o índice DXY, que mede o valor do dólar contra uma cesta de seis moedas (euro, iene, libra, dólar canadense, coroa sueca e franco suíço), mostra uma queda de quase 11% da moeda norte-americana nos últimos três meses. Isso dito, a apreciação do real é mais intensa que a depreciação global do dólar, o que poderia sugerir que, ao final da história, a taxa de juros teve um papel relevante. Mas não. O gráfico mostra o desempenho das moedas importantes que mais se fortaleceram no ano, do real ao dólar neozelandês. Não parece ser possível atribuir esse desempenho às taxas de juros, pois, além de muito diferentes entre si, houve em todos os países uma redução expressiva do diferencial de juros. Por outro lado, à exceção da libra esterlina, todas as campeãs guardam uma característica comum: são moedas de países exportadores de commodities. O gráfico mostra também a evolução dos preços de commodities em 2009, medido pelo índice CRB, que revela uma apreciação da ordem de 16% no período, não muito distinta do desempenho das moedas. Da mesma forma, quando preços de commodities caíram quase 25% no último trimestre do ano passado, as moedas-commodities despencaram, apesar do aumento do diferencial de taxa de juros então observado. Isso não significa que a redução dos juros que já vem acontecendo, associada à melhora das perspectivas inflacionárias, não possa ter algum impacto sobre o câmbio, ainda que insuficiente para compensar a melhora do ambiente externo. O fundamental, porém, é não perder de vista que o BC possui apenas um instrumento, a taxa de juros, que deve continuar a ser guiada pelo compromisso com a meta de inflação, e não pela tentativa (inútil) de fixação da taxa de câmbio, como tentado no passado. A alternativa é ressaca na certa.



Artigo de Alexandre Schwartsman na Folha de hoje. Economista-chefe do Grupo Santander Brasil, doutor em Economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley) e ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central.

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