Emirados Árabes - 0h21 - Uma mulher acende uma vela em homenagem a Neda Agha Soltan que morreu baleada durante os protestos no Irã neste fim de semana
Choques no Irã
Marcos Nobre, na Folha de hoje.
Há quem veja nos confrontos no Irã apenas uma luta de poder interna à elite, especialmente entre os clérigos. Há quem pense que uma revolução está em curso. E parece haver concordância de que a simbologia da revolução islâmica de 1979 não está em questão.Para quem não sabe a língua nem conhece uma cultura em que confluem as tradições persa, grega, árabe e islâmica, não é tarefa fácil avaliar os acontecimentos. As avaliações costumam ser feitas a partir de traduções para o vocabulário político europeu, que marca presença importante na vida cultural do Irã desde pelo menos meados do século 19.
Mas o interessante é que o contrário também é verdadeiro: quem protesta procura traduzir em termos da história europeia sua versão dos acontecimentos. O que não falta são twitters, blogs, sites e cartazes em inglês que indicam paralelos com situações mais familiares para pessoas formadas segundo os cânones da história europeia.Mais interessante ainda, também a repressão aos protestos fez o mesmo movimento. O chefe da Guarda Revolucionária declarou em tom ameaçador que "qualquer tipo de revolução de veludo não será bem-sucedida no Irã". Referia-se às demonstrações pacíficas de oposição que culminaram na derrocada dos regimes comunistas do Leste Europeu. E, com isso, reconheceu também pelo menos uma semelhança entre o atual regime iraniano e as ditaduras do antigo bloco soviético.
Seja como for, o fato é que não se trata mais simplesmente de eleições fraudadas. Ao contrário, são justamente os grupos da elite política em confronto que buscam reduzir os protestos ao processo eleitoral. Ambos os lados do grupo dirigente sabem que essa é a única maneira de conter o movimento dentro dos rígidos limites institucionais vigentes.Há muitos elementos novos e mesmo entusiasmantes na situação atual do Irã, sem ignorar a tragédia das mortes nos confrontos.
Ao estrangulamento da esfera pública local pelo governo os manifestantes respondem com o recurso a uma esfera pública mundial, utilizando todos os novos meios de comunicação disponíveis para amplificar suas vozes. A ligação com as "revoluções de veludo" no final da década de 1980 mostra que um novo modelo de transformação social pode vir a se consolidar.Os acontecimentos no Irã enterram definitivamente as teses regressivas de um "choque de civilizações" que se tornou um emblema da era George W. Bush. E projetam um tipo de protesto e de transformação que pode servir de modelo também para as lutas por vir. Especialmente na China.
3 comentários:
Agradeço a sua participação no meu blog e volte sempre.. Algumas considerações: acho que um ocidental não tem completa isenção para 'escolher' um dos candidatos. E não acho legítimo forma alguma de interferência estrangeira. Mousavi é quase tão conservador quanto Ahamadinejad.. Quem decide a legalidade só pode ser a própria população dentro dos seus próprios valores culturais. Acho isto.. att,
Mousavi, Zéder, já manifestou que pretende fazer conciliações. Mostrou disposição de abrir o Irã. E isso é fundamental. Quando um país se fecha é que algo de errado existe. Quando um país tem zilhões de exilados é sinal de que algo de errado existe. O regime atual do Irã é sectário e conservador e está fazendo de tudo, inclusive o complicado, para se manter no poder. Também acho que um governo estrangeiro não pode se meter nos problemas internos de um país, mas isso ninguém está fazendo. A uma torcida ocidental para Mousavi, mas tem gente que torce o nariz para manifestações legítimas e espontâneas com torcedores ocidentais, brancos e de olhos claros.
Na verdade, parece que há muita gente que considera a manifestação pública de apoio a determinada causa como "interferência". Nesse sentido, se algum blog ou publicação emite um juízo de valor, logo aparecem os que dizem se tratar de "interferência".
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