O presidente pop se recupera da hipertensão
Lulismo é uma nova palavra que deve ser incluída nos dicionários da lingua portuguesa. Lulismo significa as políticas -- conservadoras ou não, mas nunca revolucionárias -- implementadas pelo governo do presidente Lula do tipo Bolsa Família. Mas não apenas isso, significa também a aliança que o governo Lula faz com o conservadorismo Brasuca, mais notadamente a indicação do tucano Meirelles no Banco Central e outras do tipo. Segundo dizem, essas política implementadas transformou a vida de milhões de pessoas que pertencem à base da pirâmide social brasileira e que votaram em Lula, sobretudo na eleição de 2006, porque refratárias das discussões morais do mensalão de 2005.
Houve assim, uma mudança no perfil dos eleitores do PT que eram, inicialmente, egressos da classe média brasileira, sobretudo nas grandes cidades e na eleição de 2006, quem votou em Lula foram exatamente as famílias de baixíssima renda. A classe média, ao contrário, votou no tucano Alckmin. Esse mesmo fenômeno de captação de votos nas populações de baixa renda, ocorre na Venezuela, na Bolívia, no Equador e na Argentina. As cidades de Caracas e Buenos Aires (redutos da classe média) elegeram candidatos de oposição aos governos Chávez e Cristina K. Na eleição de 2010 no Brasil não tenham dúvidas, esse fenômeno se repetirá.
A grande crítica que o pessoal mais à esquerda faz é que essa política implementadas pelo "lulismo de resultados não geram uma consciência de classe, um espírito de luta social e esse fenômeno trouxe uma transformação dentro do PT. André Singer escreveu um artigo sobre o assunto, “Razões Sociais e Ideológicas do Lulismo" que está no UOL e que recomendo. Diz ele, o PT foi um partido que se construiu sobre a ideia de que a luta de classes deveria ocupar o primeiro lugar na cena política. E a luta de classes é, por definição, um conflito social, que ameaça a ordem. Então o PT, que procurou construir uma organização autônoma da classe trabalhadora, se ergueu sobre a ideia e sobre a prática, porque foi um período de greves muito intensas, de que o conflito era positivo. Esse setor do eleitorado tem dificuldade para aceder a essa compreensão até porque é um setor que não pode se organizar, por exemplo, não participa de sindicato, porque não é formalizado. Está aquém das condições de participação da luta de classes. Então, para esse setor, a manutenção da ordem é um valor. Simultaneamente a isso [à manutenção da ordem], o governo Lula promoveu uma série de programas que, no seu conjunto, fizeram com que a qualidade de vida deste setor tivesse uma mudança positiva importante. Se a gente for pegar cada programa isoladamente, ele não talvez represente essa mudança. Mas se olharmos para o conjunto do Bolsa Família, dos aumentos do salário mínimo, da redução do custo da cesta básica e de dezenas de programas focalizados, como Luz para Todos, regularização de terras de quilombolas, construção de cisternas no semi-árido... Se reunirmos esse conjunto, a gente vai observar que o governo executou um conjunto de políticas que transformou a vida de milhões de pessoas que pertencem a esse setor que depois veio a aderir ao presidente Lula.” (...)“É preciso compreender bem o que é a natureza desse conservadorismo. Ele é um conservadorismo muito "sui generis". Ele é ao mesmo tempo conservador e não conservador. Ele é conservador num aspecto: ele recusa o conflito social. Ele quer mudanças dentro da ordem, mas ele quer mudanças. Esse setor do eleitorado apoia vigorosamente a intervenção do Estado na economia, por exemplo. Se a gente entender essa dialética, há uma transformação na qualidade do voto, a partir da adesão ao presidente Lula, o centro e a direita não podem mais fazer o discurso que foi muito eficiente da eleição de 1989 até a eleição de 2002, a de que Lula e o PT representam desordem. Esse tipo de eixo foi quebrado.” (...)“Acho que há uma repolitização em bases novas. O professor Francisco de Oliveira tem razão ao assinalar que há um fenômeno novo. Por que é novo? Por que o lulismo mistura elementos de esquerda e de direita. Nesse sentido ele reembaralha as cartas ideológicas de uma maneira nova, e obriga tanto o centro quanto a esquerda e a direita a se reposicionarem diante de uma articulação ideológica e social diferente. Com relação à questão do subperonismo, acho que estamos numa fase de transição, em que não sabemos em que forma política essa força social vai se cristalizar. Eu diria que existe uma possibilidade de que ela cristalize no próprio PT. Acho que ainda é cedo para a gente falar em modelos antigos. (...) “O fenômeno do lulismo, se a minha hipótese estiver correta, é que as pessoas que mudaram de condição de vida e identificaram essa mudança com um projeto político encabeçado pelo presidente Lula devem se manter leais a esse projeto. Essa seria uma possibilidade, mas é claro que a história vai se construindo de uma maneira inesperada.”
“Do mesmo modo como Marx, ao tentar explicar a ascensão do Luís Bonaparte - ninguém esperava que Luís Bonaparte ganhasse as eleições de 2 de dezembro de 1848. Ganhou para surpresa de todos analistas. Essa é a meu ver a genialidade do Marx, ter percebido que ele recebeu os votos de uma parcela enorme da população francesa que tinha dificuldades estruturais para se organizar. Hoje eles estão organizados, naquele momento era muito difícil. Eu fiquei pensando nesses trabalhadores que vivem na informalidade no Brasil, que vivem no setor de serviços, ora estão empregados, ora desempregados, muito em empregos domésticos, que têm muita dificuldade em se expressar. Eles têm de expressar suas aspirações a partir de cima, de alguém que venha de cima. E num certo sentido eles recusam essa organização eleitoralmente, ao não votar no Lula e no PT até 2002. Até eles terem a certeza da ordem.”Weber viu isso com clareza quase cem anos atrás: em democracias presidencialistas, uma liderança carismática, como é o caso do presidente Lula, que tem muita expressão eleitoral, ela se torna uma força enorme dentro do partido que tem vocação eleitoral. O partido fica observando qual é a direção que essa liderança vai dar. Esse é um fenômeno que não tem novidade em relação a isso, sobretudo nas democracias presidencialistas. O presidente Lula tem um peso enorme dentro do PT.”
3 comentários:
Algumas correções:
- A classe média também vota em Lula. As pesquisas de opinião sobre o governo atual mostram que todas as classes aprovam o governo Lula.
- Ninguém se elege no Brasil sem o voto da classe baixa (que, aliás, deixou de ser a classe mais populosa no governo Lula). FHC se elegeu com os votos do Nordeste também, mas não foi chamado de populista.
Lula é uma liderança que só surgiu, a exemplo de Chavez, porque a direita fracassou politicamente. Lula ocupa um espaço (que estava vazio) que nem FHC, nem Serra e nem Alckmin tiveram competência para preencher.
Uma coisa é aprovar e outra é votar. Eu sou daqueles que acha que o governo Lula é bom, poderia ser melhor, poderia ser pior, é bom e, portanto, aprovo. Mas não voto na Dilma nem amarrado. Sim, FHC (que não é de direita) se elegeu com os votos dos pobres do nordeste, assim como os governos militares da Arena. Mas isso mudou a partir do Lulismo. O grande desafio de Serra é tentar captar votos nesses redutos, não vai ser fácil.
Se a eleição fosse hoje, votaria sem problemas na Dilma. Também aprovo o governo Lula, que apesar de seus defeitos tem saldo positivo.
Há um contraste gigante entre a posição de Dilma agora e a posição de Serra em 2002: Dilma quer mais é expor o que o governo fez para mostrar que pode continuar fazendo; Serra, em 2002, procurou esconder FHC, fazendo de conta que era "novo" ou "diferente" (como o "novo" da Yeda).
Serra está desorientado, dependente dos apoios da elite (principalmente da mídia). Mais perdido que cusco em tiroteio. Espero que isso mude, mas tenho poucas esperanças. Serra está à deriva, esperando que a rejeição ao PT faça a presidência cair no seu colo.
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