Diversidade, Liberdade e Inclusão Social

Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


sábado, 29 de novembro de 2008


O ovo da serpente, por Astor Wartchow *

Conflito de gerações e dessintonia entre pais e filhos é uma guerra antiga, atual e interminável. As rupturas e os desencontros são de toda ordem, natureza e dimensão. E sem limites geográficos de ocorrência.A propósito de diferenças entre gerações que vão e que vêm, “corre” na internet, faz muito tempo, um texto muito expressivo (que reproduzo, reduzo e adapto parcialmente abaixo), acerca do qual não há certeza de autoria.A internet é pródiga em mensagens de todos os tipos, anônimas ou não, assumidas ou atribuídas. Afinal, trata-se de um gigantesco tsunami de palavras, imagens e sons, de autorias falsas e verdadeiras, de mentiras e verdades, de realismo e ilusionismo.Naturalmente, à conta desse dilúvio verborrágico e imagético, a grande maioria é lixo. Mas mesmo no lixo podemos encontrar sabedoria e pérolas. Reduzido e adaptado, leia:“Somos a primeira geração de pais decididos a não repetir com os filhos os erros de nossos pais. E com o esforço de abolir os abusos do passado, somos pais mais dedicados e compreensivos.Mas, na tentativa de sermos os pais que queríamos ter, parece que passamos de um extremo ao outro.Assim, somos a última geração de filhos que obedeceram a seus pais e a primeira geração de pais que obedecem a seus filhos!Os últimos que respeitaram os pais e os primeiros que aceitam que os filhos lhes faltem com o respeito!Antes se consideravam bons pais aqueles cujos filhos se comportavam bem, obedeciam a suas ordens e os tratavam com o devido respeito.Mas, na medida em que as fronteiras hierárquicas entre pais e filhos foram-se desvanecendo, hoje são os filhos quem, agora, espera respeito de seus pais, pretendendo de tal maneira que respeitem as suas idéias, suas preferências e sua forma de agir e viver. E, além disso, que os pais os patrocinem no que necessitam para tal fim!Os papéis se inverteram: agora são os pais que têm de agradar a seus filhos para ‘ganhá-los’, e não o inverso, como no passado.Isso explica o esforço que fazem pais e mães para serem os melhores amigos e ‘tudo dar’ a seus filhos.Se o autoritarismo do passado encheu os filhos de medo de seus pais, a debilidade do presente os preenche de medo e menosprezo ao ver os pais tão débeis e perdidos como eles.Se o autoritarismo suplanta, a permissividade sufoca!Apenas uma atitude firme e respeitosa evitará o afogamento das novas gerações no descontrole e no tédio. À deriva, sem parâmetros, nem destino!”Concluo eu: muitas obras de ficção, como filmes, textos e livros, usam a expressão “o ovo da serpente” como uma metáfora para a constatação de um mal em incubação!


* Advogado


sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Somos Os Eternos "Tadinhos"


Supermercado saqueado em Itajaí: comerciantes estão com medo de abrir as portas em regiões alagadas. Os saqueadores carregavam gêneros alimentícios, bebidas, material de limpeza e higiene, além de dois aparelhos de TV de plasma, uma geladeira e utensílios domésticos.
Polêmico e sincero artigo de David Coimbra publicado hoje na ZH. Eu concordo com ele. Existe sim no Brasil uma cultura de que a culpa nunca é nossa. É sempre dos outros. David colocou os pingos nos is.

Pobres Coitados

Ah, o povo. O brasileiro sempre fala no povo como uma gigantesca e impalpável entidade subalterna a outra entidade não tão gigantesca, mas igualmente impalpável: a malévola “Eles”. “Eles” se aproveitam da ingenuidade do povo, “Eles” são corruptos, “Eles” é que estragam um país tão rico e belo, “Eles” não sabem aproveitar as qualidades dessa gente inzoneira, feliz e criativa.Quem são Eles?Os governantes, os chefes, as autoridades. A responsabilidade é toda deles.O brasileiro ganha mal? A culpa é do patrão que o explora. Mora mal? Por causa do Estado, que não financia a Habitação. As filas, a violência urbana, a sujeira das cidades, a carestia – Eles são culpados. A razão do problema nunca está no brasileiro, está fora dele.Agora mesmo, milhares de brasileiros foram vitimados pelas enchentes em Santa Catarina, e parece que neste caso não dá para atribuir a culpa a ninguém, senão à Natureza inclemente. Aí, como reagiram alguns brasileiros à tragédia que martiriza seus semelhantes? Comerciantes aumentaram os preços dos alimentos e da água potável – li que um litro de água chega a ser vendido a R$ 14. Flagelados não abandonam suas casas com medo de que sejam arrombadas. Depósitos de mercadorias estão sendo atacados. Vi fotos de gente levando produtos de saque pela rua dentro dos próprios carrinhos dos supermercados. Não eram alimentos. Eram TVs de tela plana, eletrodomésticos e bebidas alcoólicas. Uma farra. Para arrematar a festa, os caminhões que tombam nas estradas são saqueados pelas comunidades lindeiras às rodovias e pelos outros motoristas.É o brasileiro que faz tudo isso. Não são os chefes, nem os patrões, nem os governantes que estão espoliando flagelados, roubando motoristas acidentados ou invadindo casas, supermercados e depósitos. Não são “Eles”. É o brasileiro. O povo. Por sua conta e iniciativa, sem que ninguém ordene ou o obrigue.O que são essas pessoas que saqueiam caminhões tombados ou casas abandonadas?Não são oportunistas. São ladrões vulgares.O que são os homens que aumentam o preço da água potável que saciará a sede dos flagelados?Exploradores cruéis.Não são coitadinhos. São mesquinhos, gananciosos e desprezíveis. São grosseiros, velhacos e baixos. São a ralé. A escória da raça humana. São grande parte do povo brasileiro.

Glauco


SOS Petrobrás


Plataforma P-34 da Petrobras na costa do Espírito Santo; estatal sofre com escassez de crédito

Analistas vêem problema de gestão na Petrobras

Crise expõe estrutura pesada num cenário de queda do petróleo e falta de crédito

Investimentos com as refinarias no Ceará e no Maranhão podem ser suspensos por causa das dificuldades da estatal.

O empréstimo emergencial de R$ 2 bilhões da CEF (Caixa Econômica Federal) à Petrobras mostra que a crise financeira pegou a empresa desprevenida, atingiu o seu caixa e revelou a real -e pesada- estrutura de custos da companhia e seus problemas de gestão num cenário de queda do preço do petróleo e falta de crédito, dizem especialistas do setor. "Esse empréstimo preocupa não pelo valor, mas por ser destinado a capital de giro. Agora que o petróleo foi para US$ 50, começa aparecer o real custo dela [Petrobras]. Ficam claras a má gestão e a ineficiência. A atual direção só pegou a fase de bonança da indústria do petróleo, que ficou sempre acima dos US$ 100, na média. Essa fase já passou", diz Adriano Pires, especialista do CBIE (Centro Brasileiro de Infra-Estrutura). A crise bateu com força à porta da maior empresa brasileira, e a revelação dos problemas de caixa da Petrobras surge porque o empréstimo é destinado exclusivamente a capital de giro, dizem especialistas do setor. Pressionada pela queda do petróleo e pelo acúmulo de impostos, a estatal não teve outra saída e recorreu ao banco público enquanto anunciava um lucro recorde no terceiro trimestre de mais de R$ 10 bilhões. Ou fazia isso ou cortava drasticamente investimentos, apurou a Folha, tudo o que o governo não quer na crise. Para Pires, a estatal sofre com sua elevada estrutura de custos e terá de reduzir drasticamente despesas e investimentos para se adaptar à restrição de crédito e ao cenário de petróleo mais baixo. Já o economista José Roberto Afonso, um dos criadores da Lei de Responsabilidade Fiscal e hoje assessor econômico do PSDB, o empréstimo "não faz sentido algum": "Se é para fazer investimento, todos somos a favor. Mas não faz sentido algum para capital giro". Segundo Afonso, pode ser um sinal de má gestão financeira: "Estamos vindo da melhor fase de toda a história em termos de preço do petróleo. Foram anos de preços em alta. Com dois meses de turbulência, já não há dinheiro para pagar imposto?", questiona. Nelson Rodrigues de Mattos, analista do BB Investimentos, afirma que a estatal enfrenta um "problema momentâneo de caixa", que obrigou a buscar capital de giro. Ele espera, porém, uma melhora no quarto trimestre, quando a receita deve crescer na esteira dos preços maiores da gasolina e do diesel no país do que as cotações de referência internacionais. Um analista que preferiu o anonimato diz que diversas empresas devem fazer o mesmo que a Petrobras: buscar bancos públicos para levantar capital de giro de curto prazo em razão da crise. A gravidade, segundo ele, é o fato de a estatal expor neste momento sua fragilidade de caixa, problema que deve ser passageiro. Ele considera também que o novo cenário fará a Petrobras cortar investimentos principalmente na área de refino. Tanto Mattos, do BB, como Pires, do CBIE, compartilham da mesma opinião. "Houve, em outubro, um desembolso muito expressivo num momento de aperto momentâneo. O problema é de caixa. Se já há falta de recursos para tocar o dia-a-dia da empresa, como pagar impostos, quiçá para investimento? Certamente, alguns projetos serão postergados", diz Mattos. Para Pires, os projetos de refino serão os primeiras afetados. Entre os investimentos a serem postergados, apurou a Folha, estão, em primeiro lugar, as duas refinarias "premium", no Ceará e no Maranhão, que, juntas, vão consumir mais de US$ 20 bilhões em investimentos. Também corre risco, a depender da evolução da crise, o Comperj (refinaria petroquímica do Rio de Janeiro), cujos investimentos se aproximam de US$ 9 bilhões. Além disso, a Petrobras já implementou um severo programa de redução de custos e racionalização de gastos que atinge todo tipo de despesa. Viagens de funcionários foram reduzidas e substituídas sempre que possível por teleconferências. Foram restringidos os produtos oferecidos em seus eventos a café, biscoito e suco.
Folha de hoje. Colaborou ROBERTO MACHADO, da Sucursal do Rio

Quem São os Terroristas?


Após mais de 24 horas de conflito com os extremistas que atacaram anteontem diversos pontos de Mumbai, o Exército indiano invadiu o hotel Taj Mahal (foto) e libertou reféns. Ao menos 125 pessoas morreram e mais de 300 ficaram feridas. Ontem os militares tomaram vários prédios dominados pelos radicais.
Para analistas, terroristas têm origens domésticas

O terroristas que têm lançado ataques indiscriminados e de proporções crescentes na Índia têm bases cada vez mais locais, formadas por indianos e não por estrangeiros, segundo analistas internacionais consultados pela Folha.Até alguns anos atrás, o terrorismo no país esteve sempre ligado à disputa pela Caxemira, uma das centenas de principados que formavam o subcontinente até a independência do Império Britânico em 1947, e que ficou no meio da divisão entre Índia e Paquistão.Agora, a ameaça interna, de muçulmanos descontentes com o que vêem como marginalização, pode trazer graves conseqüências para a Índia, segundo Gareth Price, diretor do Departamento de Ásia do centro de estudos Chatham House, de Londres."Ao se autodenominarem Mujahedin do Deccan [Deccan é um planalto no sul do país], eles querem deixar claro que são muçulmanos indianos e que não têm nada a ver com a Caxemira [ao norte]. Eles estão tentando ressaltar que são indianos descontentes com a política do governo em relação aos muçulmanos", diz Price.A principal dúvida, de acordo com o analista inglês, é saber se grupos paquistaneses, como Lashkar-e-Taiba, ativo na Caxemira e ligado à Al Qaeda, estão envolvidos."Até agora parece muito mais provável que sejam apenas indianos, talvez com algum suporte técnico de militantes estrangeiros", afirma Price.A tese é corroborada pelo francês Roland Jacquard, presidente do Observatório do Terrorismo e consultor da ONU sobre o assunto."Muitos olhares estão voltados para Paquistão ou Bangladesh, mas os ataques refletem antes de tudo um problema interno. Grupos estrangeiros, como o Taleban ou os setores rebeldes da inteligência paquistanesa, podem, no máximo, ter fornecido armas, explosivos ou informações", avalia Jacquard.Segundo o analista, os autores são jovens recrutados nas universidades da Índia e endoutrinados para o ódio e a vingança do massacre de milhares de muçulmanos por grupos hindus no início dos anos 90.Jacquard descarta uma participação da Al Qaeda, mas afirma que a rede de Osama bin Laden inspirou os autores do atentado de Mumbai. "Os métodos são parecidos, como o ataque a lugares turísticos em grandes centros econômicos".Gareth Price aponta para a defasagem dos serviços secretos indianos em relação aos terroristas: "Os ataques a bomba aumentam em freqüência e escala, ganhando até proporção de operação militar. O que falta na Índia é inteligência sobre esses grupos. É sempre reativa. Faltam claramente medidas preventivas."Jacquard explica que a ineficiência dos serviços secretos é fruto do modelo de gestão administrativa da Índia, descentralizado e descoordenado."Sem contar o ataque de Mumbai, em um ano houve pelo menos 220 mortes em atentados terroristas na Índia. O país percebe, estarrecido, que há dentro de seu território jovens nascidos e criados ali dispostos a tudo para espalhar o terror", diz o especialista.
Frases
"As pessoas estavam levando tiros no corredor, havia corpos pelas escadas.Era o caos total"
BROOKE SATCHWELL - australiana hospedada no Taj Mahal
"Tirei meus sapatos e saí correndo, empurrada pelos funcionários do hotel. Não vi terroristas ou pessoas feridas, só sangue pelo chão, sobre o qual tive que andar descalça"
ESPERANZA AGUIRRE - espanhola hospedada no Taj Mahal

"Eles [terroristas] estão no comando. Vários aspirantes a chefs foram massacrados na cozinha"
DIPAK DUTTA - refém indiano resgatado do Taj Mahal
"Vamos deixar bem claro para nossos vizinhos que o uso do território deles para lançar ataques contra nós não será tolerado"
MANMOHAN SINGH - premiê indiano

Pontos de Vista


Clique na imagem para ampliar.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Que Cafonice...


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva exibe prato com o seu rosto que recebeu de presente do militar chinês Xu Caihou, no Palácio do Planalto, em Brasília. Caihou, vice-presidente da Comissão Militar do Centro da China, está no país para uma visita oficial de um dia.

Pele é Morte




Se eu fosse obrigado a fazer parte de algum movimento alternativo eu entraria para uma ONG de defesa dos animais indefesos. Eu colocaria no lixo meu casaco de couro de res e picharia de spray com cor de sangue falso os casacos de pele de animais da indústria da moda. Eu viraria vegetariano e deixaria de comer churrasco aos domingos, como bom gaúcho.


Pensando melhor, não pretendo entrar para nenhum movimento alternativo.

Terror em Mumbai (Bombaim)
















Servidores e Serviçais


Servidores e serviçais
Cássio Schubsky

Duzentos anos depois de sua chegada ao país, fugindo de Portugal, a família real volta ao Brasil, com toda a força, desta feita por meio de relatos históricos ou jornalísticos. A sensação, de alguma forma, é a de que nosso passado nobre -com reis e vice-reis, barões, marqueses e fidalgos de toda sorte, travestidos de servidores públicos- ressurgiu, de repente, depois de décadas de recolhimento. A verdade, no entanto, é que essa herança histórica, colonial e imperial nos assombra desde sempre, como resquício mal deglutido, incompreendido, nebuloso. Veja-se, por exemplo, o caso do Congresso Nacional. Nas duas Casas legislativas -no Senado e na Câmara dos Deputados-, bem como nos Parlamentos estaduais e municipais, perdura, entre os congressistas, uma forma de tratamento antiquada e, por isso mesmo, das mais significativas: "o nobre senador", "o nobre deputado", "o nobre vereador". A que, exatamente, estarão "Suas Excelências" se referindo? "É a tradição, faz parte dos usos e costumes do Parlamento", alegarão alguns para justificar tanta nobreza. Certo. Mas tradições existem para serem modificadas -do contrário, os "nobres parlamentares" continuariam a se utilizar de uma indumentária cheia de rendas e babados, incluindo, quiçá, alvas e encaracoladas perucas, um bom punhado de talco e ruge e cheirariam rapé no meio das sessões legislativas... "Questão meramente semântica", objetarão outros. "Pouco importa a forma pela qual deputados e senadores se tratam entre si, o que conta é como agem." É de desconfiar, no entanto, que o alheamento que muitos de nossos "nobres parlamentares" vivem a demonstrar com relação aos anseios populares seja irmão gêmeo de sua atitude ensimesmada, mais de olho em interesses próprios de fidalgos do que nas aspirações nacionais. Como se a função pública -mesmo quando fruto do voto- fosse uma benesse, uma prebenda, um bem pessoal a ser usufruído sem nenhuma prestação de contas ao eleitor, sem respeito ao programa partidário e aos mandamentos constitucionais. Ainda bem que vivemos em uma República, em que quem governa é o presidente, com pleno funcionamento do Congresso Nacional. E, como todos sabemos, o chefe do Poder Executivo só legisla por meio de medidas provisórias em caso de relevância e urgência, como reza a Constituição, não é mesmo? Aqui não temos mais dom João, dom Pedro ou dom José, tampouco dom Fernando, nem sequer dom Luiz. Quem elabora as leis é o Congresso livre, formado por "Suas Excelências", os "nobres parlamentares", legítimos representantes do povo. É deste, diga-se, que emana todo o poder, como, aliás, estabelece a Constituição Cidadã, já no artigo primeiro. Há quem diga que nos faltou uma revolução popular, como ocorreu na França, ou uma verdadeira guerra de independência, a exemplo da norte-americana, para dar cabo de um passado aristocrático, que continua nos atando a uma realidade anacrônica, com seu viés autoritário e antidemocrático. Nossa República é fruto de um golpe de Estado; de fato, a corte passou bem longe da guilhotina, da forca e dos fuzis. De outro lado, haverá quem possa argumentar que a Inglaterra ou a Espanha, sem falar no Japão, países ditos adiantados, são monarquias constitucionais e que, ali, todo título de nobreza integra o poder, com naturalidade. É verdade. Como é verdade, também, que somos (em tese) uma República e que, portanto, não temos mais (em tese) monarcas nem nobres. É de notar que, também no exercício de diversas funções públicas, mesmo quando legitimadas por concurso, continua imperando a atitude soberba e fidalga de muitas "Excelências", mais apegadas à liturgia do cargo do que às demandas da cidadania. Há nesses casos, também, resquícios de um passado aristocrático, quando os funcionários eram nomeados ao bel-prazer dos poderosos, um misto de sinecura e compartilhamento da riqueza a serviço do governante de plantão e de seus asseclas -fato até bem recentemente observado em muitas carreiras que nem sequer tinham concurso público. Ainda hoje não faltam servidores (serviçais?) sempre ávidos por usufruir das lambanças públicas (privadas?). Sem falar nos cargos de confiança que tanta desconfiança geram, em um triste espetáculo de avidez pelo bem comum. Tradição e passado devem servir à compreensão histórica, não para justificar a repetição perpétua de (maus) hábitos. Afinal, o que é mais nobre, Excelências: servir aos poderosos e a si mesmos ou, ao contrário, servir ao povo? Uma coisa é certa: há pouca participação popular em nossa democracia. Sobra nobre. Falta povo.


CÁSSIO SCHUBSKY , 43, formado em direito pela USP e em história pela PUC-SP, é editor e historiador. Artigo publicado na Folha de hoje.

Angeli


Porto Alegre e a Incapacidade de Produzir Entendimentos


Vista Aérea de Porto Alegre. A cidade tem um imenso potencial, mas patina nas algemas da burrice ideológica.


A cultura do impasse, por Ricardo Sondermann*

Proponho um convite para que pensemos juntos: quantos projetos, obras, leis e iniciativas estão hoje parados na cidade de Porto Alegre e no Estado? São idéias postas em discussão que repousam em pesados processos à espera de definição. O Cais do Porto, desejado por todos, tramita há 12 anos; o indispensável Teatro da Ospa aguarda há pelos menos cinco anos, ao lado do Plano Diretor, a ampliação da pista do aeroporto, o Pontal e tantos outros projetos capazes de levar a cidade ao crescimento. Existem ainda temas recorrentes, como o comércio aos domingos, os pedágios, as fontes renováveis de energia, os centros comerciais e supermercados com área superior a 2,5 mil metros quadrados, os milhares de EIA-Rimas, as audiências públicas. Há muita coisa estagnada por anos e décadas, sem que consigamos chegar a um consenso e fazer acontecer.Tudo faz parecer que nossa democracia parou em algum lugar. De tanto termos opiniões sobre tudo, menor ficou nossa capacidade de produzir entendimentos. Não conseguimos juntar forças para crescer, mas nos especializamos em reunir turmas para impedir qualquer coisa. Será que ainda somos competentes para produzir consensos?Nestes dois últimos anos, Porto Alegre sediou um evento de dimensões mundiais, o Fronteiras do Pensamento. Por aqui passaram as melhores cabeças do mundo, com certeza. Homens e mulheres que são expoentes, que construíram em seus países e para suas comunidades experiências consagradas, marcaram seu entorno com o que de melhor se faz no mundo das artes, da política, cultura, e, mais importante, fatos e realizações concretas. Parece que é hora de inverter um tanto nosso hino, e que sirvam suas façanhas de modelo para nós.O que mais impede o crescimento é a falta de visão, é a inexistência de interesse em conhecer exemplos que funcionaram, mesmo que contrários à nossa forma de pensar. A ausência de visão cria o medo do novo, e esta conduta produz incompetência e arrogância. A resposta é a raiva e o ódio.Temos que mudar nossa forma de pensar. Ou nos entendemos no máximo possível de coisas, até como torcemos para “A” ou “B”, ou seguiremos imobilizados no caminho para manter-nos pequenos, insignificantes e irrecuperáveis. Que possamos transcender as fronteiras da vaidade e do egoísmo, e evoluir para uma democracia mais moderna, eficiente e produtiva. Que a cultura de gerar intermináveis discussões apenas para propor novos adiamentos e impasses, mude para decidir e fazer. Comemorar os acertos e reverter erros, mas que possamos sair dos inúmeros impasses que preenchem o campo das idéias e caminhar para o campo das realizações.

*Empresário
Artigo publicado hoje na Zero Hora.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Espinafrando

Leio no Diário Gauche de hoje diversos posts. O primeiro deles diz respeito aos ganhos de produtividade do PIB brasileiro que não se refletem nos ganhos salariais.

Os outros posts dizem respeito à Aracruz e ao Daniel Dantas e que são comentados nos posts seguintes.




Ganhos de produtividade medidos pelo PIB per capita não se traduziram em ganhos salariais.

Apenas uma pequena parte dos ganhos com o crescimento da economia do Brasil, registrados no Produto Interno Bruto (PIB, soma de toda a riqueza produzida no país em um ano) entre 1995 e 2007 foi repassada para o salário dos trabalhadores brasileiros. É o que indica o Relatório Mundial sobre Salários 2008/2009, divulgado ontem pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). A informação é da Agência Brasil.Ao passo em que o PIB per capita cresceu 16% nesse período, o rendimento médio real dos trabalhadores registou uma queda de 6%. “Significa que os ganhos de produtividade medidos pelo PIB per capita não se traduziram em ganhos salariais”, afirma Laís Abramo, diretora do escritório da OIT no Brasil.No período entre 2001 e 2007 também caiu o percentual do PIB composto pelos salários, registrando uma média de 37%.Laís Abramo disse que a principal perda se deu durante os anos de 1990, quando foi registrada uma piora em praticamente todos os indicadores sociais. Já de 2004 a 2008 se verificou um ganho de 15,6% no rendimento médio dos trabalhadores, que colaborou para diminuir a desigualdade salarial entre os empregados. “Esse aumento é muito importante, mas ele não chega a compensar o nível salarial existente em 1995”, informou.De acordo com a OIT, um fator que colaborou para esse crescimento no nível salarial no Brasil foi um processo de valorização do salário mínimo desde o início dos anos 2000, especialmente a partir de 2004. Daquele ano até 2008, o crescimento médio foi de 10%, num total de aumento em 43%. De 2000 a 2008, esse percentual foi de 50%, em termos reais.“O aumento real do salário mínimo contribui para a redução das desigualdades salariais entre homens e mulheres e brancos e negros, se é verdade que há uma maior concentração de mulheres, em relação aos homens nos estratos inferiores da pirâmide salarial, no caso da comparação entre negros e brancos isso é ainda mais verdade”, afirmou.Na questão salarial ligada ao gênero, de acordo com números da OIT, se em 1995 as mulheres recebiam em média 62% do salário dos homens, em 2006 essa proporção passou a 71%. Já na questão ligada à raça, o avanço foi menor. Em 1995 os negros recebiam 49% do que recebiam os brancos. Em 2006, recebiam 53%.Outro dado significativo é a queda no percentual de trabalhadores que recebem menos que o mínimo (de 29,8% em 1992 para 21,6% em 2006) e o aumento do percentual daqueles que recebem exatamente o mínimo (de 6,1% em 1992 para 13,4% em 2006).Outro ponto destacado no estudo é o fortalecimento da negociação coletiva no país, com 96% das negociações alcançando reajustes acima da inflação em 2006. Apesar de não ser possível determinar com segurança qual a cobertura dessa instituição no país, porque, ainda que o percentual de trabalhadores sindicalizados seja baixo, os acordos coletivos acabam beneficiando toda a categoria, mesmo os que não estão ligados às instâncias sindicais.Segundo Laís Abramo, a conclusão é que “as instituições [do mercado de trabalho] em geral, e essas duas em particular, são muito importantes para a garantia do bem-estar dos trabalhadores e para uma melhor distribuição de renda e das riquezas e benefícios do desenvolvimento econômico”.
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Já os ganhos do capital financeiro, dos especuladores e rentistas...
Coisas do lulismo de resultados.

Meu comentário:


Essa é uma das tendências da sociedade de serviços. Aquele trabalho de carteira assinada, regulado pela CLT, ordenamento de novembro de 1943, impossível de ser flexibilizado, está dando lugar a outro tipo de trabalho, sob a forma de a prestação de serviços que não é uma relação trabalhista, mas de direito obrigacional.

Mas certa esquerda vem a tona com o discurso furado da exploração da"taxa de mais valia" e depois eles não entendem porque seu discurso não cativa mais o coração e as mentes dos brasileiros. Ninguém está interessado em mais valia, porque todo mundo está careca de saber que o empreendedor tem que ter sim o necessário lucro. E o empreendedor não é mais aquele gordo pançudo de charuto na boca. Essa atividade se diversificou, se pluralizou, se simplificou. Empreendedor é dono do armazém da esquina, o zé do cachorro quente, o profissional liberal sócio do escritório etc.
O dono do armazém quer ser dono de um supermercado de periferia. O Zé do Cachorro quente quer ser dono de uma rede de carrocinhas. O profissional liberal que tem seus negócios em Porto Alegre quer abrir seu escritório em Novo Hamburgo, Caxias e São Paulo. O mínimo quer ser pequeno, o pequeno quer ser médio, o médio quer ser grande e o grande quer ser enorme. Entre o Zé Ermírio e o dono do armazém têm um número imenso de pessoas que estão empreendendo. E não é meia dúzia. É uma imensidão. E são essas pessoas que fazem circular o capital no Brasil, aumentando o PIB, gerando empregos, impostos e renda. Por isso tenho verdadeira ojeriza a esse discurso medíocre e carregado de preconceito contra o capital.

Aracruz, o Cassino e as Versões


Outra notinha do diário gauche, dessa vez sobre a Aracruz que investe pesado no Estado do RS.


Ex-diretor da papeleira conta tudo. Vale conferir a entrevista do ex-executivo da Aracruz concedida ao Estadão de hoje. O senhor Isac Zagury cuidava dos investimentos não-operacionais da papeleira, eufemismo para a atividade de player irresponsável do vídeo-pôquer financeiro da temerária empresa.Ele conta tudo, diz que todos sabiam de tudo, inclusive os acionistas (Banco Safra, Votorantim, etc). Revela que de 2004 a 2008, a papeleira ganhou US$ 350 milhões na especulação da BM&F.Como se vê, a Aracruz Celulose era uma papeleira dublê de cassino.A matéria do Estadão é aberta, qualquer um de nós pode ter acesso, basta clicar no Estadão Digital e procurar o caderno de "Economia & Negócios".Uma matéria dessas jamais sairá no jornal Zero Hora, que no RS cuida zelosamente dos interesses da papeleira & cassino eletrônico.
Minha espinafrada:
Não vamos ser simplistas e ingênuos. Qualquer grande empresas joga seus ativos no mercado de ações que rende muito mais, mas em contrapartida existem os riscos. Uma empresa e sobretudo a grande empresa tem sim sua função social e não pode aplicar seus ativos no mercado de ações no percentual que a Aracruz investiu. Existe sempre um determinado limite. Por exemplo, os fundos de pensão que devem necessariamente diversificar seus investimentos, o limite é de 20% (Resolução 3121 do CMN, art. 16). Se não estou enganado, esse diretor financeiro da Aracruz foi sumariamente demitido da empresa. A versão que ele conta é a dele que está apenas tentando defender o seu lado. Será ela a verdadeira?

Velhas Contradições


Notinha do Diário Gauche de hoje. Comento depois.

Velho Karl, sempre atual

“No seu modo de fazer fortuna, como nos seus prazeres, a aristocracia financeira não é mais do que o renascimento do lumpenproletariado nos cumes da sociedade burguesa.”Karl Marx, “A luta de classes na França”

Foto: criador e criatura
Minha espinafrada:
E o governo do PT -- que aprova a BrOi -- vai injetar 2 bi na conta do Daniel Dantas.

Tristes Trópicos


Claude Lévi Strauss
Lévi-Strauss a dois

Ruy Castro


Claude Lévi-Strauss, o antropólogo francês, está fazendo 100 anos. Em 1935, ele era um jovem marxista com uma visão mecânica da vida, como tantos. Mas veio para o Brasil, embrenhou-se no mato com os nossos bororos e nambiquaras, comeu do cru e do cozido, e isso abalou suas certezas. Em 1955, a experiência rendeu-lhe um livro, "Tristes Trópicos".

Nos anos 50, Lévi-Strauss já acusava o homem de ser o vilão da ecologia, quando os dicionários ainda não tinham chegado a um acordo nem sobre o significado da palavra. Contrariando o espírito da época, também nunca aceitou a idéia de que, com a alfabetização em massa, o progresso da humanidade seria fatal -quem éramos nós para sair alfabetizando populações que viviam tão bem sem o alfabeto?Por defender a necessidade de preservar as identidades étnicas e culturais, combateu a idéia da globalização ainda no berço. Para ele, a globalização conduziria à uniformização, à anulação das diferenças -e o fim das diferenças levaria à indiferença, que é uma das piores pragas que poderiam nos afligir. Pois é o que está acontecendo, e bem que ele avisou.Minha geração tem vários motivos para ser grata a Lévi-Strauss. Em 1968, um pretexto infalível para um rapaz e uma moça se encontrarem era ler e discutir o último livro do autor da moda. Eram grandes noites, que, de fato, começavam pela leitura de um capítulo do livro, geralmente o primeiro. Mas nunca se chegava ao segundo.Naquele ano, o campeão disparado de tais leituras era "Eros e Civilização", de Herbert Marcuse. Mas, então, "Tristes Trópicos" saiu no Brasil, e Lévi-Strauss tomou-lhe o lugar. Eu tinha 20 anos, morava no Solar da Fossa, em Botafogo, e era incrível como não se passava uma noite sem uma discussão a dois sobre Lévi-Strauss.


Na Folha de hoje.

Memória Curta dos Mercados


Falta de memória

Delfim Netto


É cada vez mais evidente a enorme disfuncionalidade da excessiva liberdade deixada ao setor financeiro pela política monetária laxista (na teologia moral, "tendência a fugir ao dever e à lei, com base em razões pouco ou mal fundamentadas") dos Bancos Centrais. Uma das coisas mais surpreendentes é a memória curta dos mercados. Em janeiro de 2002 (em resposta a uma série de escândalos), o Congresso americano aprovou a lei Sarbanes-Oxley, que fixou normas de proteção aos investidores. Pois bem, apenas três anos depois da lei e quatro anos depois do estouro da "bolha" de ativos (e do escândalo da Enron), o presidente Bush indicou em 2006 para "chairman" da Security and Exchange Commission, Christopher Cox, um congressista conhecido por sua fúria desregulatória. O próprio secretário do Tesouro, Paulson, empossado também em 2006, disse, em seu discurso de posse, que vinha para acabar com todo o resíduo de regulação que entravava a liberdade financeira produtora do desenvolvimento da economia real. Completava-se, assim, mais um dos ciclos da dialética infernal de laxidão e controle produzidos pelas "bolhas" dos mercados de ativos e as fraudes ínsitas à sua história. Agora é a vez de o G20 sugerir mais controle. O tempo se encarregará de corroê-lo à medida que a infinita imaginação dos agentes financeiros for descobrindo novos "produtos exóticos" que os Bancos Centrais só entenderão quando ocorrer a próxima crise. Mas por quê? Apenas porque é assim que funciona o sistema que trouxe os homens da Idade da Pedra à Idade da Informática nos últimos 250 anos... O que talvez interesse agora é tentar adivinhar quanto durará a crise da economia real depois do acerto da economia financeira. A tarefa é impossível, mas o passado talvez nos dê algumas informações. Se tomarmos a média das sete últimas crises sofridas pela economia dos EUA e fizermos uma uniformização do PIB nos "picos" igual a 100, encontramos que ela se agrava durante os primeiros dois ou três trimestres e inicia uma recuperação entre o quinto e sexto semestre (quando retorna ao "pico" = 100), a partir do qual volta a subir para completar outro ciclo. Nessas condições, deve-se esperar que a redução da atividade e do emprego na economia mundial prossigam até setembro/outubro de 2009 e se inicie uma volta ao nível de atividade de 2007 que será atingido no segundo semestre de 2010. Esse parece ser o tempo no qual teremos de usar nosso mercado interno com inteligência e ousadia para sustentar um razoável crescimento e o nível de emprego.


Artigo na Folha de hoje.

Glauco


terça-feira, 25 de novembro de 2008

Bob Wilson é Muiiiito Slowwww


Terminou ontem a edição do Fronteiras do Pensamento versão 2008. Dizem que tudo vai mudar em 2009. O que se verificou é que o público diminuiu consideravelmente nos últimos eventos. Por que será? Houve um certo desinteresse em relação aos palestrantes e os assuntos tratados, sobretudo os da parte estética. O marco divisor talvez tenha sido a complicada palestra do dramaturgo Gerald Thomas que mandou todos às favas e saiu do palco sem dizer boa noite. Na noite de encerramento de ontem, foi a vez de outro dramaturgo, o americano texano Robert Wilson.


Bob Wilson entra no palco olhando para baixo e fica estático por alguns bons minutos. A platéia fica ansiosa. De repente ele faz um gesto brusco com as mãos e grita, como se tudo aquilo fosse um horror. Assim iniciou a palestra de Bob. Ela teve altos e baixos. Os pontos nobres ficaram por conta de suas experiências pessoais, como adotou o menino negro e surdo chamado Raymond que mudou a vida de Bob. Raymond não sabe ler e nem o significado das palavras. A linguagem de Raymond são os gestos das pessoas, suas posturas e talvez até.... suas energias. Foi a partir desse contato que Bob teve com Raymond que ele começou a fazer suas peças de 4, 5, 7, 9 horas ou de 7 dias. É tudo muiiiiiito slow. É o que todos dizem sobre as peças de Bob Wilson. Tudo muiiiiito devagar. Quase nada acontece. As pessoas ficam ali estáticas num palco mudo e sem palavras.


Dizem que Bob Wilson vem a Porto Alegre para o próximo "Em Cena". As tratativas estão avançadas anunciou ontem o Luciano Alabarse que trata do assunto. Vamos ver quem aguenta ficar 7 horas num teatro assistindo a uma peça estática e very, very, very slowwwwww?

Angeli


Chávez perde grandes centros urbanos




Aliados do presidente venezuelano vencem em 17 dos 23 Estados, mas fracassam naqueles mais ricos e populosos.

Chávez minimiza avanço da oposição, ressalta vitórias de governistas nas prefeituras e volta a chamar dissidentes de "traidores" e "pó cósmico"

O presidente venezuelano, Hugo Chávez, sofreu uma dura derrota eleitoral anteontem nas regiões mais populosas e ricas da Venezuela, mas conseguiu manter o controle sobre 17 dos 23 Estados em disputa.O resultado em Caracas e em outros centros importantes consolida a recuperação política da oposição e dificulta as pretensões do líder venezuelano de convocar um novo referendo para aprovar a reeleição presidencial sem limite."Os resultados não foram contundentes nem para uma direção nem para a outra", disse à Folha o sociólogo Edgardo Lander, da Universidade Central da Venezuela (UCV). "Mas significam um avanço da oposição nas maiores concentrações populacionais e nos lugares de atividade econômica mais importantes. O petróleo e as indústrias básicas estão nesses Estados. É um golpe sério para o governo."A oposição tradicional passou de 2 para 6 Estados: manteve Zulia, o mais populoso e rico do país, e Nova Esparta (Ilha Margarita) e arrancou do chavismo outros quatro governos regionais, incluindo Caracas e Miranda, onde estão os "barrios" (favelas) da capital, até há pouco bastiões intocáveis do oficialismo. Com isso, passará a controlar a maior parte do "corredor eleitoral" - o centro e o noroeste do país, onde se verifica uma maior concentração populacional."O mapa da Venezuela começou a mudar, agora é diverso", disse o governador opositor Manuel Rosales, que se elegeu prefeito de Maracaibo, a segunda cidade do país, e ainda emplacou o sucessor em Zulia.A maior surpresa ficou por conta do governo distrital de Caracas, onde Antonio Ledezma, da agremiação de direita Aliança Bravo Povo (ABP) venceu o chavista Aristóbulo Istúriz, favorito em todas as pesquisas de opinião."Aqui quem deve se sentir derrotado são os bandidos", disse Ledezma, em discurso na madrugada de ontem, em alusão ao problema de segurança pública na capital venezuelana, tido como o mais grave pelas pesquisas de opinião.Já o maior triunfo de Chávez, que havia eleito 22 governadores há quatro anos, foi ter recuperado quatro Estados hoje governados por ex-aliados: Sucre, Trujillo Guárico e Aragua, que concentra boa parte das Forças Armadas.Ao todo, os chavistas governarão 56% da população do país, e a oposição, 44%.Vitória nos municípiosArmado com números da jornada eleitoral, Chávez convocou entrevista coletiva com jornalistas estrangeiros para demonstrar que o seu PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) foi o vitorioso."Nós reconhecemos as vitórias limitadas, parciais, setoriais de alguns movimentos opositores e de alguns líderes opositores", disse Chávez no início da entrevista, transmitida em cadeia obrigatória de rádio e TV. "Administrem bem suas limitadas vitórias."Chávez enfatizou principalmente a vitória em 80% das prefeituras (233, contra 56 para a oposição), o que, segundo ele, inclui 80 dos 100 maiores municípios e 18 das 24 capitais. "A curva retoma a ascendência histórica", afirmou, ao ressaltar que o oficialismo aumentou em 20% em número de votos com relação ao ano passado, quando perdeu o referendo sobre a reforma constitucional.O presidente venezuelano disse que a eleição regional foi uma "batalha" entre a "democracia bolivariana" e a "falsa democracia" e que "a oposição não tem espaço consolidado".Sobre a derrota dos ex-aliados, Chávez voltou a chamar os dissidentes de "traidores" e disse que eles terminaram "virando pó cósmico".Chávez pediu ainda que "se sancione severamente" o canal oposicionista Globovisión por supostamente ter antecipado o resultado eleitoral em Carabobo e Táchira, vencidos pela oposição. Pela lei, é proibida a divulgação de resultados antes dos números oficiais.

Governo Bush Injeta US$ 20 Bi no Citigroup




Numa complexa operação financeira que livrou o segundo maior banco dos EUA do desastre, o governo norte-americano injetou US$ 20 bilhões no Citigroup e se comprometeu a honrar a maior parte de US$ 306 bilhões em papéis "podres". É a segunda intervenção no mesmo banco, que em outubro levara outros US$ 25 bilhões, e a terceira grande operação resgate no mercado em três meses.Com isso, o governo se torna o maior proprietário do banco, segundo o executivo-chefe financeiro do Citigroup, com o equivalente a 7,8% em ações, seguido do príncipe saudita Alwaeed bin Talal, com 5%, e da autoridade financeira de Abu Dhabi (Emirados Árabes Unidos), com 4,9%. Extirpa ainda o "banco podre", ao se comprometer a garantir a banda ruim da instituição, lastreada em papéis cuja origem são financiamentos de má qualidade.Em troca, Washington terá entre outras coisas controle sobre os bônus dados aos executivos do banco e imporá limites ao pagamento de dividendos aos acionistas. A operação faz o total gasto ou comprometido em dinheiro público norte-americano na atual crise financeira encostar nos US$ 5 trilhões -ou quatro vezes o total de riquezas produzidas pelo Brasil em um ano. Só a garantia de ativos ruins do Citigroup equivale ao PIB da Dinamarca.Como resultado direto da operação e também do anúncio da nova equipe econômica do presidente eleito, Barack Obama, o índice industrial Dow fechou em alta de 4,9%, levado pelo salto de 60% nas ações do Citi, numa onda de efeitos positivos que tomou os mercados do mundo inteiro -no Brasil, a Bovespa subiu 9,4%, e o dólar tem recuo de 5,4%.O tipo de resgate anunciado é inédito e marca uma nova fase na intervenção do governo dos EUA no mercado financeiro. A primeira fase, em que o Tesouro prometia usar os US$ 700 bilhões aprovados pelo Congresso para comprar os títulos podres das instituições em dificuldades, nunca saiu do papel.A segunda, em que o governo injetou dinheiro direto nas empresas, levou quase a metade do montante -foi a ocasião em que o Citi, o JPMorgan e o Wells Fargo, entre outros, receberam US$ 25 bilhões cada um. A de ontem mistura as duas operações de maneira mais refinada. "O governo aprendeu com as experiências passadas", disse Jason Goldberg, analista do Barclays Capital.Abre as portas, no entanto, para que outras instituições financeiras venham bater na porta do Tesouro em busca de acordo parecido. E aumenta a pressão já exercida por outros setores da economia para que recebam auxílio semelhante -é o caso das três maiores montadoras, que querem um pacote de US$ 25 bilhões."Tomamos esse tipo de decisões no passado, tomamos na noite passada [domingo] e, se necessário, vamos tomar esse tipo de decisão para proteger nosso sistema financeiro no futuro", disse ontem o presidente George W. Bush, falando nas escadarias do Tesouro, em Washington, ao lado do secretário, Henry Paulson.Para o CEO do Citibank, Vikram Pandit, o aporte fortalece o banco, e o acordo "mostra total confiança" na instituição. Segundo maior banco dos EUA, atrás do JPMorgan, o Citibank tem US$ 2 trilhões em ativos, mais de 200 milhões de clientes em 106 países e se encaixa na categoria de instituições qualificadas pelo governo como "muito grandes para quebrar".Ainda assim, o socorro federal não saiu fácil. Depois de ver suas ações caírem mais de 60% na semana passada, a pior marca em 16 anos, por conta de sua exposição excessiva a papéis de má qualidade originados na crise do "subprime", o banco apresentou um plano de resgate ao governo na sexta à noite.O Departamento do Tesouro, o Fed (o banco central americano) e o FDIC (o órgão garantidor de depósitos bancários no país) passariam as 48 horas seguintes em duras negociações com os executivos. Um dos modelos era o acordo recente entre o governo suíço e o UBS.Do Peru, onde estava em viagem, Bush era informado das ações por telefone e informou o presidente eleito, Barack Obama, que também monitorava a negociação com o atual titular do Tesouro, Henry Paulson, e seu sucessor, Timoty Geithner, atual presidente do Fed de Nova York.Perto da meia-noite de domingo (3h de ontem de Brasília), chegou-se ao acordo, e o Citigroup foi salvo. Agora, analistas aguardam para ver se o efeito positivo nos mercados é duradouro, como se espera, ou fugidio, como aconteceu das últimas duas vezes.




O Caos do Ensino Público




Da página Amarela da Revista Veja dessa semana, entrevista com a antropóloga Eunice Durham.

Fábrica de maus professores

Uma das maiores especialistas em ensino superiorbrasileiro, a antropóloga não tem dúvida: os cursos de pedagogia perpetuam o péssimo ensino nas escolas.




"Os cursos de pedagogia desprezam a prática da sala de aula e supervalorizam teorias supostamente mais nobres. Os alunos saem de lá sem saber ensinar"

Hoje há poucos estudiosos empenhados em produzir pesquisa de bom nível sobre a universidade brasileira. Entre eles, a antropóloga Eunice Durham, 75 anos, vinte dos quais dedicados ao tema, tem o mérito de tratar do assunto com rara objetividade. Seu trabalho representa um avanço, também, porque mostra, com clareza, como as universidades têm relação direta com a má qualidade do ensino oferecido nas escolas do país. Ela diz: "Os cursos de pedagogia são incapazes de formar bons professores". Ex-secretária de política educacional do Ministério da Educação (MEC) no governo Fernando Henrique, Eunice é do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas, da Universidade de São Paulo – onde ingressou como professora há cinqüenta anos.

Veja: Sua pesquisa mostra que as faculdades de pedagogia estão na raiz do mau ensino nas escolas brasileiras. Como?
Eunice Durham: As faculdades de pedagogia formam professores incapazes de fazer o básico, entrar na sala de aula e ensinar a matéria. Mais grave ainda, muitos desses profissionais revelam limitações elementares: não conseguem escrever sem cometer erros de ortografia simples nem expor conceitos científicos de média complexidade. Chegam aos cursos de pedagogia com deficiências pedestres e saem de lá sem ter se livrado delas. Minha pesquisa aponta as causas. A primeira, sem dúvida, é a mentalidade da universidade, que supervaloriza a teoria e menospreza a prática. Segundo essa corrente acadêmica em vigor, o trabalho concreto em sala de aula é inferior a reflexões supostamente mais nobres.

Veja:Essa filosofia é assumida abertamente pelas faculdades de pedagogia?
Eunice Durham: O objetivo declarado dos cursos é ensinar os candidatos a professor a aplicar conhecimentos filosóficos, antropológicos, históricos e econômicos à educação. Pretensão alheia às necessidades reais das escolas – e absurda diante de estudantes universitários tão pouco escolarizados.

Veja: O que, exatamente, se ensina aos futuros professores?
Eunice Durham: Fiz uma análise detalhada das diretrizes oficiais para os cursos de pedagogia. Ali é possível constatar, com números, o que já se observa na prática. Entre catorze artigos, catorze parágrafos e 38 incisos, apenas dois itens se referem ao trabalho do professor em sala de aula. Esse parece um assunto secundário, menos relevante do que a ideologia atrasada que domina as faculdades de pedagogia.

Veja: Como essa ideologia se manifesta?
Eunice Durham: Por exemplo, na bibliografia adotada nesses cursos, circunscrita a autores da esquerda pedagógica. Eles confundem pensamento crítico com falar mal do governo ou do capitalismo. Não passam de manuais com uma visão simplificada, e por vezes preconceituosa, do mundo. O mesmo tom aparece nos programas dos cursos, que eu ajudo a analisar no Conselho Nacional de Educação. Perdi as contas de quantas vezes estive diante da palavra dialética, que, não há dúvida, a maioria das pessoas inclui sem saber do que se trata. Em vez de aprenderem a dar aula, os aspirantes a professor são expostos a uma coleção de jargões. Tudo precisa ser democrático, participativo, dialógico e, naturalmente, decidido em assembléia.

Veja:Quais os efeitos disso na escola?
Eunice Durham: Quando chegam às escolas para ensinar, muitos dos novatos apenas repetem esses bordões. Eles não sabem nem como começar a executar suas tarefas mais básicas. A situação se agrava com o fato de os professores, de modo geral, não admitirem o óbvio: o ensino no Brasil é ainda tão ruim, em parte, porque eles próprios não estão preparados para desempenhar a função.

Veja: Por que os professores são tão pouco autocríticos?
Eunice Durham: Eles são corporativistas ao extremo. Podem até estar cientes do baixo nível do ensino no país, mas costumam atribuir o fiasco a fatores externos, como o fato de o governo não lhes prover a formação necessária e de eles ganharem pouco. É um cenário preocupante. Os professores se eximem da culpa pelo mau ensino – e, conseqüentemente, da responsabilidade. Nos sindicatos, todo esse corporativismo se exacerba.

Veja: Como os sindicatos prejudicam a sala de aula?
Eunice Durham: Está suficientemente claro que a ação fundamental desses movimentos é garantir direitos corporativos, e não o bom ensino. Entenda-se por isso: lutar por greves, aumentos de salário e faltas ao trabalho sem nenhuma espécie de punição. O absenteísmo dos professores é, afinal, uma das pragas da escola pública brasileira. O índice de ausências é escandaloso. Um professor falta, em média, um mês de trabalho por ano e, o pior, não perde um centavo por isso. Cenário de atraso num país em que é urgente fazer a educação avançar. Combater o corporativismo dos professores e aprimorar os cursos de pedagogia, portanto, são duas medidas essenciais à melhora dos indicadores de ensino.

Veja: A senhora estende suas críticas ao restante da universidade pública?
Eunice Durham: Há dois fenômenos distintos nas instituições públicas. O primeiro é o dos cursos de pós-graduação nas áreas de ciências exatas, que, embora ainda atrás daqueles oferecidos em países desenvolvidos, estão sendo capazes de fazer o que é esperado deles: absorver novos conhecimentos, conseguir aplicá-los e contribuir para sua evolução. Nessas áreas, começa a surgir uma relação mais estreita entre as universidades e o mercado de trabalho. Algo que, segundo já foi suficientemente mensurado, é necessário ao avanço de qualquer país. A outra realidade da universidade pública a que me refiro é a das ciências humanas. Área que hoje, no Brasil, está prejudicada pela ideologia e pelo excesso de críticas vazias. Nada disso contribui para elevar o nível da pesquisa acadêmica.

Veja: Um estudo da OCDE (organização que reúne os países mais industrializados) mostra que o custo de um universitário no Brasil está entre os mais altos do mundo – e o país responde por apenas 2% das citações nas melhores revistas científicas. Como a senhora explica essa ineficiência?
Eunice Durham: Sem dúvida, poderíamos fazer o mesmo, ou mais, sem consumir tanto dinheiro do governo. O problema é que as universidades públicas brasileiras são pessimamente administradas. Sua versão de democracia, profundamente assembleísta, só ajuda a aumentar a burocracia e os gastos públicos. Essa é uma situação que piorou, sobretudo, no período de abertura política, na década de 80, quando, na universidade, democratização se tornou sinônimo de formação de conselhos e multiplicação de instâncias. Na prática, tantas são as alçadas e as exigências burocráticas que, parece inverossímil, um pesquisador com uma boa quantia de dinheiro na mão passa mais tempo envolvido com prestação de contas do que com sua investigação científica. Para agravar a situação, os maus profissionais não podem ser demitidos. Defino a universidade pública como a antítese de uma empresa bem montada.

Veja: Muita gente defende a expansão das universidades públicas. E a senhora?
Eunice Durham: Sou contra. Nos países onde o ensino superior funciona, apenas um grupo reduzido de instituições concentra a maior parte da pesquisa acadêmica, e as demais miram, basicamente, os cursos de graduação. O Brasil, ao contrário, sempre volta à idéia de expandir esse modelo de universidade. É um erro. Estou convicta de que já temos faculdades públicas em número suficiente para atender aqueles alunos que podem de fato vir a se tornar Ph.Ds. ou profissionais altamente qualificados. Estes são, naturalmente, uma minoria. Isso não tem nada a ver com o fato de o Brasil ser uma nação em desenvolvimento. É exatamente assim nos outros países.

Veja: As faculdades particulares são uma boa opção para os outros estudantes?
Eunice Durham: Freqüentemente, não. Aqui vale a pena chamar a atenção para um ponto: os cursos técnicos de ensino superior, ainda desconhecidos da maioria dos brasileiros, formam gente mais capacitada para o mercado de trabalho do que uma faculdade particular de ensino ruim. Esses cursos são mais curtos e menos pretensiosos, mas conseguem algo que muita universidade não faz: preparar para o mercado de trabalho. É estranho como, no meio acadêmico, uma formação voltada para as necessidades das empresas ainda soa como pecado. As universidades dizem, sem nenhum constrangimento, preferir "formar cidadãos". Cabe perguntar: o que o cidadão vai fazer da vida se ele não puder se inserir no mercado de trabalho?

Veja: Nos Estados Unidos, cerca de 60% dos alunos freqüentam essas escolas técnicas. No Brasil, são apenas 9%. Por quê?
Eunice Durham: Sempre houve preconceito no Brasil em relação a qualquer coisa que lembrasse o trabalho manual, caso desses cursos. Vejo, no entanto, uma melhora no conceito que se tem das escolas técnicas, o que se manifesta no aumento da procura. O fato concreto é que elas têm conseguido se adaptar às demandas reais da economia. Daí 95% das pessoas, em média, saírem formadas com emprego garantido. O mercado, afinal, não precisa apenas de pessoas pós-graduadas em letras que sejam peritas em crítica literária ou de estatísticos aptos a desenvolver grandes sistemas. É simples, mas só o Brasil, vítima de certa arrogância, parece ainda não ter entendido a lição.

Veja:Faculdades particulares de baixa qualidade são, então, pura perda de tempo?
Eunice Durham: Essas faculdades têm o foco nos estudantes menos escolarizados – daí serem tão ineficientes. O objetivo número 1 é manter o aluno pagante. Que ninguém espere entrar numa faculdade de mau ensino e concorrer a um bom emprego, porque o mercado brasileiro já sabe discernir as coisas. É notório que tais instituições formam os piores estudantes para se prestar às ocupações mais medíocres. Mas cabe observar que, mesmo mal formados, esses jovens levam vantagem sobre os outros que jamais pisaram numa universidade, ainda que tenham aprendido muito pouco em sala de aula. A lógica é típica de países em desenvolvimento, como o Brasil.

Veja:Por que num país em desenvolvimento o diploma universitário, mesmo sendo de um curso ruim, tem tanto valor?
Eunice Durham: No Brasil, ao contrário do que ocorre em nações mais ricas, o diploma de ensino superior possui um valor independente da qualidade. Quem tem vale mais no mercado. É a realidade de um país onde a maioria dos jovens está ainda fora da universidade e o diploma ganha peso pela raridade. Numa seleção de emprego, entre dois candidatos parecidos, uma empresa vai dar preferência, naturalmente, ao que conseguiu chegar ao ensino superior. Mas é preciso que se repita: eles servirão a uma classe de empregos bem medíocres – jamais estarão na disputa pelas melhores vagas ofertadas no mercado de trabalho.

Veja: A tendência é que o mercado se encarregue de eliminar as faculdades ruins?
Eunice Durham: A experiência mostra que, conforme a população se torna mais escolarizada e o mercado de trabalho mais exigente, as faculdades ruins passam a ser menos procuradas e uma parte delas acaba desaparecendo do mapa. Isso já foi comprovado num levantamento feito com base no antigo Provão. Ao jogar luz nas instituições que haviam acumulado notas vermelhas, o exame contribuiu decisivamente para o seu fracasso. O fato de o MEC intervir num curso que, testado mais de uma vez, não apresente sinais de melhora também é uma medida sensata. O mau ensino, afinal, é um grande desserviço.

Veja: A senhora fecharia as faculdades de pedagogia se pudesse?Eunice Durham:Acho que elas precisam ser inteiramente reformuladas. Repensadas do zero mesmo. Não é preciso ir tão longe para entender por quê. Basta consultar os rankings internacionais de ensino. Neles, o Brasil chama atenção por uma razão para lá de negativa. Está sempre entre os piores países do mundo em educação.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Flores Para Los Muertos




Ontem depois de assistir meu time morrer na praia fui ver um filme em DVD que havia comprado por cerca de R$ 10,00, num balaio de loja de departamento. Eu já tinha visto esse filme antes e comprei porque gostei e resolvi rever. O filme é genial. No encerramento aparece uma frase célebre: Flores para Los Muertos, Flores para los Muertos. Tudo a ver com o meu time. A história é encorpada, com muito drama e diálogos ríspidos como a obra de Tennessee Williams, adaptada para o cinema pelo genial Elias Kazam: A Street Car Named Desire, 1951, (Um bonde chamado Desejo). E lá estão, todos reunidos, quatro grandes atores:

Vivian Leigh que é Blanche Du Bois, uma mulher madura e sofrida muito e que coloca Scarlett O'hara (E o Vento Levou de 1939) no chinelo. Blanche é a irmã complicada da bonitona Kim Hunter, que faz o papel de Stella Kowalski que é apaixonada por seu marido, o polaco e sangüíneo Stanley (Marlon Brando). E no filme tem ainda o Mitch, representado por Karl Malden (o único que está vivo da turma) que se apaixona por Blanche, mas nem tanto.

Resumo: o drama é bom, a época é glamorosa, mas a vida também pode ser decadente.

Se em um baú de loja de departamento você se deparar com um Bonde Chamado Desejo não titubeie: tire do baú e leva para casa. Vale a pena.

Fucking Simple


... é a mãe!

Steven Pinker


Uma palavra é um rótulo arbitrário -essa é a base da lingüística. Mas muita gente não pensa assim. Acredita na magia das palavras: que pronunciar um encantamento, uma maldição ou uma oração pode mudar o mundo. Não caçoe: você diria "nada deu errado até agora" sem procurar um objeto de madeira para bater?Xingar é outro tipo de magia das palavras.Contrariando a lógica, as pessoas acreditam que certas palavras podem corromper a ordem moral -que "mijar", "cagar" e "foder" são perigosas de uma maneira que "xixi", "cocô" e "trepar" não são.Essa peculiaridade em nossa psicologia está na capacidade das palavras tabus de ativar circuitos emocionais primitivos no cérebro.Meu interesse pelos palavrões é científico (juro!). Mas os xingamentos não são apenas um quebra-cabeça na neurociência cognitiva. Eles aparecem nos mais famosos casos de liberdade de expressão do último século, de "Ulisses" e "Lady Chatterley" a Lenny Bruce e George Carlin [comediantes].Por décadas, os tribunais constantemente levaram os censores do governo a uma precária posição defensiva.Em 1978, a Suprema Corte, julgando uma transmissão diurna do monólogo "Filthy Words" [Palavras Sujas], de Carlin [1937-2008], permitiu que a Comissão Federal de Comunicações (FCC) regulamentasse a "indecência" nos programas de rádio e TV nos horários em que as crianças pudessem estar escutando.O raciocínio, baseado em noções antiquadas da infância e da mídia moderna, foi que os programas transmitidos pelo ar se intrometem sem convite no lar e podem expor as crianças à linguagem indecente, prejudicando seu desenvolvimento psicológico e moral.Na prática, a FCC reconheceu que o impacto das palavras tabus depende de seu contexto. Assim, em 2003, quando Bono, vocalista do U2, disse, em um discurso de premiação na TV, "isto é realmente, realmente, "fucking brilliant'" [algo como "brilhante de foder"], a FCC não puniu a rede.

Intenção


Bono, ela comentou, não usou "fucking" para "descrever órgãos ou atividades sexuais ou excretórias". Ele a usou como "um adjetivo ou expletivo para enfatizar uma exclamação".Esse uso diferia do número "patentemente ofensivo" de Carlin, com seu "uso repetido, pelo valor de chocar", das palavras tabus. Mas os comissários indicados por Bush deram meia-volta no caso e posteriormente visaram a rede de televisão Fox, depois que ela transmitiu cerimônias de premiação em que Cher disse, sobre seus críticos, "então, fodam-se" e Nicole Richie perguntou "por que eles a chamam de "The Simple Life'? Você já tentou tirar bosta de vaca de uma bolsa Prada? Não é tão "fucking simple'".Em 2007, depois que um tribunal federal invalidou a política da FCC como "arbitrária" e "impulsiva", a comissão apelou para a Suprema Corte. Foi quando eu fui arrastado para a coisa. A FCC alegou que "mesmo quando o orador não pretende um sentido sexual, uma parte substancial da comunidade (...) entenderá a palavra como carregada de conotação sexual ofensiva".Uma denúncia apresentada no início deste ano pelo procurador-geral em defesa da posição da comissão citou meu livro "Do Que É Feito o Pensamento" [Cia. das Letras] da seguinte maneira: "Se você é um falante de inglês, não pode ouvir [uma palavra como a iniciada por efe] sem lembrar do que ela significa para uma comunidade implícita de falantes, incluindo as emoções ligadas a elas".Na verdade, as palavras destacadas na denúncia eram "nigger" [preto], "cunt" [boceta] e "fucking" [foder], e o contexto era uma explicação de por que as pessoas se ofendem "quando um estrangeiro se refere a um afro-americano como "nigger", ou a uma mulher como uma "cunt" ou a uma pessoa judia como um "fucking jew'".Eu certamente não estava afirmando que, quando os ouvintes escutam "não é tão "fucking simple'", suas mentes pensam em cópulas! Ao contrário, eu comentava que, com o tempo, as palavras tabus perdem seu sentido literal e retêm apenas um colorido emocional e, depois, apenas a capacidade de chamar a atenção. Essa progressão explica por que muitos falantes não têm consciência de que "sucker", "sucks", "bites" e "blows" [chupador, chupa, morde e sopra, usados informalmente como formas de desqualificar] geralmente se referem à felação, ou que um "jerk" [usado como "idiota"] era um masturbador.Isso explica por que "Close the fucking door" [Feche a porra da porta], "What the fuck?" [Que porra é isso?], "Holy Fuck!" [Caramba!] e "Fuck you!" [Foda-se] violam todas as regras da sintaxe e da semântica inglesa. Elas supostamente substituíram "Close the damned door" [Feche a maldita porta], "What in Hell?" [Que diabos?], "Holy Mary!" [Ave Maria!] e "Damn you!" [Dane-se] quando a profanidade religiosa perdeu a força e novas palavras tiveram de ser recrutadas para acordar os interlocutores.


Mercado da língua


A FCC tinha razão sobre eu pensar que os tabus lingüísticos nem sempre são ruins. O discurso salpicado de "fuck" fica entediante, e epítetos maliciosos podem expressar atitudes condenáveis.Mas, em uma sociedade livre, esses incômodos são naturalmente regulados no mercado das reações das pessoas -como Don Imus, Michael Richards e Ann Coulter [radialista, comediante e analista política que causaram polêmica por seus comentários, respectivamente, sexista, racista e religioso] recentemente ficaram sabendo da maneira mais difícil.Não está claro por que xingar nas ondas do rádio e da TV deva ser assunto para o governo.De fato, já que a linguagem é entremeada com o pensamento -o tema principal do livro citado pelo procurador-geral-, qualquer proibição a palavras levará a absurdos. Veja o monólogo de Carlin. Ele mencionou a palavra "fuck" não para descrever atividades sexuais, nem para chocar sua platéia. Sem regulação Carlin a citou para mostrar como as pessoas usam palavras tabus e para propor a discussão de que o governo não deve regulá-las. A decisão que controlou sua linguagem restringiu a crítica pública à própria decisão -zombando dos próprios princípios da liberdade de expressão.E considere o comunicado de imprensa emitido pelo presidente da FCC, Kevin Martin, expressando seu desprazer quando sua decisão foi derrubada: "Hoje [o tribunal] disse que o uso das palavras "fuck" e "shit" por Cher e Nicole Richie não foi indecente. (...) Eu acho difícil acreditar que o Tribunal de Nova York diria às famílias americanas que "shit" e "fuck" podem ser ditas ao vivo na televisão nos horários em que as crianças provavelmente estão assistindo".Em algum lugar, George Carlin continua sorrindo.


STEVEN PINKER é professor de psicologia na Universidade Harvard (EUA) e autor de "O Instinto da Linguagem" (ed. Martins Fontes). Este texto foi publicado na "Atlantic Monthly". Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves .


Caderno Mais da Folha de ontem.

Racismo:Mitos e Heranças



Responsabilidade pelas diferenças é da sociedade atual
Artigo de Flávio Gomes e Marcelo Paixão na Folha de ontem.

No período colonial e imperial brasileiro, um modelo de escravidão extremamente brutal sobre suas vítimas não deixara de lograr mecanismos de mobilidade social para alguns descendentes de escravizados que se tornaram libertos.No Brasil do século 19, em algumas regiões, eles poderiam chegar mesmo a 80% do total da população livre; dados semelhantes aos de Cuba. No Sul dos Estados Unidos, por exemplo, o índice era de apenas 4%. Alguns destes chegaram -de forma ainda hoje inédita- aos altos escalões da vida cultural e política do país. A lista não é tão pequena assim: Rebouças, Patrocínio, Caldas Barbosa, Machado de Assis.Na contramão, há quem afirme que a liberdade conquistada pela alforria, em nossa antiga sociedade, era extremamente precária -em razão da cor, tornando as pessoas libertas de tez mais escura no máximo quase-cidadãos.De qualquer maneira, se é verdade que nossa realidade colonial e imperial guarda uma complexidade própria, o fato é que ao longo do século 20 a antiga sociedade acabaria abrigando um desconcertante paradoxo. O escravismo não tivera nada de harmonioso, mas o sistema de dominação abria margens para infiltrações.Para as experiências do pós-emancipação, cor, raça e racismo foram paisagens permanentemente reconfiguradas. Ordem, trabalho, disciplina e progresso dialogaram com as políticas públicas de aparato policial e criminalização dos descendentes dos escravizados e suas formas de manifestação cultural e simbólica.No projeto de nossas elites desse período vigorou a concepção de que o desenvolvimento socioeconômico era incompatível com nossas origens ancestrais em termos étnicos. Países com maiorias não-brancas não atingiram, e jamais alcançariam, o tão desejado progresso. Os perniciosos efeitos do sistema escravista foram associados às suas vítimas, ou seja, os escravizados.No contexto posterior aos anos 1930, a valorização simbólica da mestiçagem seria um importante combustível ideológico do projeto desenvolvimentista. Dado o momento histórico em que fora forjado, se pode até reconhecer que tal discurso poderia abrigar algum tipo de perspectiva progressista. Por outro lado, ao consagrar como natural a convergência das linhas de classe e cor, tal lógica tentou convencer que diferenças sociais derivadas de aparências físicas (cor da pele, traços faciais), conquanto nítidas e persistentes, inexistiam. Ou se existiam eram para ser esquecidas, abafadas ou comentadas no íntimo do lar.Como tal, o mito da democracia racial serviu não apenas ao projeto de industrialização do país. Também se associou a um modelo de desenvolvimento que viria a ser assumidamente concentrador de renda e poder político em termos sociorraciais, dado que tais assimetrias passaram a ser incorporadas à paisagem das coisas.

Mito da herança
Após o fim do mito da democracia racial, parece que se torna necessário romper com uma segunda lenda. A de que as assimetrias de cor ou raça sejam decorrência direta do escravismo, findado há 120 anos.Tal compreensão retira da sociedade do presente a responsabilidade pela construção de um quadro social extremamente injusto gerado a cada instante, colocando tal fardo apenas nos ombros do distante passado. Nosso racismo está embebido de uma forte associação entre cor da pele e uma condição social esperada ou desejada. Tal correlação atua nos diversos momentos da vida social, econômica e institucional.A leitura dos indicadores sociais decompostos pela variável cor ou raça expressa a dimensão de tais práticas sociais inaceitáveis. Se os afrodescendentes se conformam com tal realidade, fica então ratificado o mito. Se não se conformam, dizem os maus presságios: haverá ruptura de nossa paz social.O racismo e as assimetrias de cor ou raça do presente não são produtos da escravidão, muito embora tenham sido vitais para o seu funcionamento. Em sendo uma herança perpétua e acriticamente atualizada, o passado fez-se presente.O que fazer para superar este legado? Este é o desafio de todos nós, habitantes deste sexto século brasileiro que há pouco despertou.


FLÁVIO GOMES é professor de história da UFRJ e co-organizador da coletânea "Quase-Cidadão -Antropologias e Histórias da Pós-Emancipação no Brasil" (ed. FGV) MARCELO PAIXÃO é professor de economia da UFRJ e co-organizador do "Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil -2007-2008" (ed. Garamont)