Diversidade, Liberdade e Inclusão Social

Foto: Obama, Cameron e Helle Thorning-Schmidt


segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Leituras (e Charges) do Segundo Turno

Angeli
Amarlido


Onda verde, marola tucana
Fernando Barros Silva, Folha de hoje.


A erosão na candidatura de Dilma Rousseff foi maior do que as pesquisas realizadas nos dias que antecederam a eleição conseguiram captar. O tucano José Serra se beneficiou, sobretudo, da arrancada final de Marina Silva, que atingiu quase 20% dos votos válidos e, no Nordeste, teve um desempenho bem acima do esperado.
Embora maior do que vinha sendo anunciada, a "onda verde" não foi o único fator que desgastou Dilma. Houve ainda, em menor escala, uma onda tucana na reta final.
Ela foi particularmente expressiva em São Paulo, onde as pesquisas projetavam até a véspera uma vitória de Dilma. Serra derrotou a petista em casa, o maior colégio do país.
Apesar do revés, Dilma segue como favorita para vencer no segundo turno. Mas terá de administrar a frustração de um resultado amargo, à luz das expectativas e da euforia alimentadas no campo lulista.
Como em 2002, contra Lula, Serra chega ao segundo turno como azarão, mas talvez não seja muito exagero dizer que, desta vez, ressuscitou das cinzas. Sua morte política foi decretada sucessivas vezes no decorrer da campanha.
O efeito eleitoral da sobrevida do tucano, para muitos inesperada, é algo que ainda está por ser conhecido. Em 2002, Serra ficou com 38,7% dos votos válidos no segundo turno, índice muito parecido ao de Geraldo Alckmin em 2006 (39,2%), contra o mesmo Lula. Pode ser um padrão, mas não é um destino.
Mais do que obter o apoio formal de Marina (que, em princípio, tem a intenção de se manter equidistante), as campanhas terão de mapear e conquistar os "marineiros". Do eleitor evangélico aos jovens ricos e instruídos dos centros urbanos, este não é um eleitorado homogêneo.
Segundo o Datafolha, 50% dos eleitores de Marina tendem agora a optar por Serra, enquanto 29% se inclinam por Dilma. Os 21% restantes não escolhem, por ora, nenhum dos dois. É um retrato que pode mudar, mas que já aponta para uma disputa mais difícil do que parecia.


Marina Silva em Wall Street
Vladimir Safatle, Folha de hoje.

"Wall Street" é, entre outras coisas, o nome do novo filme do cineasta norte-americano Oliver Stone. Ele conta a história da crise financeira de 2008 tendo como personagem central um jovem especulador financeiro que parece ter algo semelhante ao que um dia se chamou pudor.
Sua grande preocupação é capitalizar uma empresa, que visa produzir energia ecologicamente limpa, dirigida por um professor de cabelos brancos e ar sábio. O jovem especulador é, muitas vezes, visto pelos seus pares como idealista. No entanto, ele sabe melhor que ninguém que, depois do estouro da bolha financeira, os mercados irão em direção à bolha verde. Mais do que idealista, ele sabe, antes dos outros, para onde o dinheiro corre. Enfim, seu pudor não precisa entrar em contradição com sua ganância.
Neste sentido, "Wall Street" foi feliz em descrever esta nova rearticulação entre agenda ecológica e mundo financeiro. Ela talvez nos explique um fenômeno político mundial que apareceu com toda força no Brasil: a transformação dos partidos verdes em novos partidos de centro e o abandono de suas antigas pautas de esquerda.
A tendência já tinha sido ditada na Europa. Hoje, o partido verde alemão prefere aliar-se aos conservadores da CDU (União Democrata-Cristã) do que fazer triangulações de esquerda com os sociais-democratas (SPD) e a esquerda (Die Linke). Quando estiveram no governo de Schroeder, eles abandonaram de bom grado a bandeira pacifista a fim de mandar tropas para o Afeganistão. Com o mesmo bom grado, eles ajudaram a desmontar o Estado do bem-estar social com leis de flexibilização do trabalho (como o pacote chamado de Hartz IV). Daniel Cohn-Bendit, um dos líderes do partido verde francês, fez de tudo para viabilizar uma aliança com os centristas do Modem. Algo que soaria melhor para seus novos eleitores que frequentam as praças financeiras mundiais.
No Brasil, vimos a candidatura de Marina Silva impor-se como terceira via na política. Ela foi capaz de pegar um partido composto por personalidades do calibre de Zequinha Sarney e fazer acreditar que, com eles, um novo modo de fazer política está em vias de aparecer. Cobrando os outros candidatos por não ter um programa, ela conseguiu esconder que, de todos, seu programa era o economicamente mais liberal. O que não devia nos surpreender. Afinal, os verdes conservaram o que talvez havia de pior em maio de 68: um antiestatismo muitas vezes simplista enunciado em nome da crença na espontaneidade da sociedade civil.
Não é de se estranhar que este libertarianismo encontre, 40 anos depois, o liberalismo puro e duro. De fato, a ocupação do centro pelos verdes tem tudo para ficar. Ela vem a calhar para um eleitorado que um dia votou na esquerda, mas que gostaria de um discurso mais "moderno". Um discurso menos centrado em conflitos de classe, problemas de redistribuição, precarização do trabalho e mais centrado em "nova aliança", "visão integrada" e outros termos que parecem saídos de um manual de administrador de empresas zen. Alguns anos serão necessários para que a nova aliança se mostre como mais uma bolha.
--------------------------------------------------------------------------------
VLADIMIR SAFATLE é professor no departamento de filosofia da USP.

Um comentário:

Bípede Falante disse...

Eu votei na Marina e agora vou de Serra.