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sábado, 27 de outubro de 2007

Artigo - Zé Pedro Goulart - Tropa de Elite


Como hoje é dia de copia e cola, vai aqui um artigo do Zé Pedro Goulart, publicado hoje na Zero Hora. Para quem não sabe, para quem é de fora; Goulart é um dos grandes nomes da nova crônica gaúcha. Ah, o assunto é o mesmo, o filme Tropa de Elite.

Tropa da Elite
José Pedro Goulart

Ok, você está cheio desse assunto; já leu a respeito, discutiu com os amigos, debateu no trabalho, na sala de aula, enfim. Bom, se é o seu caso, procure outras matérias, eu não vou me importar. Eu vou é botar a minha colher torta nesse bolo que, aliás, vem recheado com muita coisa, menos farinha.

Estou no shopping (onde mais poderia estar?), assistindo ao filme em questão. Há fúria na tela. Na platéia, 70% de adolescentes estão imersos nessa fúria. A música urra: TROPA DE ELITE PEGA UM, PEGA GERAL, TAMBÉM VAI PEGAR VOCÊ - é punk, voz metaleira; o som dolby estéreo amplifica os tiros, os gritos. Atrás de mim, um garoto de 16 repete alguns diálogos - quantas vezes terá ele visto o filme para isso?

O capitão Nascimento, o mocinho do filme, se culpa, se justifica, se purifica. Nessa ordem. O nome do capitão é Nascimento, veja só, e no filme ele espera o nascimento de um filho. E também torce para que nasça um novo capitão Nascimento. E o Tropa de Elite vê "nascer" um ideário de força e repressão que andava latente - mas contido - junto à população.

No Rio, um grupamento do BOPE passa em treinamento perto da praia. A galera pára o que está fazendo e se vira para aplaudir. No cinema, em várias sessões, foram testemunhadas verdadeiras ovações no final. Gritos de "caveira!!" foram ouvidos em outras. Parte da população vê no filme um modo de desatar o nó da questão da insegurança no país: é isso, é preciso reagir com força.

O capitão Nascimento tem métodos discutíveis? Ok, mas o próprio filme começa dizendo que a ação das pessoas depende das circunstâncias. E as circunstâncias no filme estão sempre justificando o arbítrio, a esquematização simplória entre um lado e outro. Os autores avisam que o filme apenas coloca a problemática nas telas, e que o personagem vivido pelo Wagner Moura não é herói.

Mas é mentira.É evidente que o filme glorifica o capitão Nascimento. Sujeito leal à corporação, incorruptível, que chega a brigar com a mulher quando se vê tomando uma decisão errada - por influência dela - e um companheiro morre. Sujeito capaz de se enternecer diante de uma mãe que não pode velar o filho morto (então invade a favela e, em troca de alguns sopapos, desenterra o corpo). Nascimento "é" o filme, sua alma, sua justificativa. É por causa dele que o BOPE é aplaudido na rua. E é por causa dele que a polícia se sente liberada de atirar em bandidos correndo em um descampado de dentro de um helicóptero. É por causa dele, pela admiração que provoca, que o menino de 16 anos, atrás de mim no cinema, repete os diálogos do filme.

A população baba, esbraveja, acompanha: Caveira!!Tropa de Elite aponta: a culpa é do sistema! O sistema que cria policiais corruptos, o sistema que amordaça e impede que se saia dele. ONGs de mentira, passeatas pacifistas fajutas, jovens de classe média alta sustentando o tráfico. É o sistema. Contra ele, a farda, a lógica da repressão e da tortura, a elite da tropa - só a elite é incorruptível. Já vimos esse filme nesse país. Será preciso reprisá-lo? Aliás, os produtores reclamam que o filme foi pirateado antes de chegar aos cinemas. Ótimo. A pirataria é um furo no sistema, ué. Só que num outro sistema - esse outro que o filme aparentemente desconsidera. Um sistema que cria sub-sistemas, como o da corrupção da polícia. Um sistema permanentemente cioso de suas razões. Um sistema do qual eu e você fazemos parte, aliás; que precisa, necessita, torce e luta por uma Tropa de Elite que o proteja. E o mantenha.

3 comentários:

Carlos de Castro disse...

Segundo informações de O Globo (21/10/07), o BOPE surgiu em janeiro de 1978 com o nome de NUCOE (Núcleo de Companhia de Operações Especiais) que tinha como símbolo um crânio com um punhal encravado de cima para baixo e duas pistolas. É importante lembrar que, na época, o chamado Esquadrão da Morte, grupo paramilitar que fazia justiça com as próprias mãos, tinha como símbolo uma caveira com duas tíbias entrelaçadas.Um de seus fundadores, hoje Coronel reformado da PM, Paulo César Amêndola, à época major, foi também um dos idealizadores e o primeiro Superintendente da Guarda Municipal, criada em 1993, pelo então prefeito do Rio de Janeiro, César Maia. È bom lembrar que o citado coronel enquanto Coordenador da Guarda Municipal, militarizou-a, colocando-a para desempenhar funções que fugiam aos seus preceitos legais. Ou seja, foi durante o seu comando que a Guarda Municipal especializou-se, em reprimir trabalhadores e movimentos sociais em nossa cidade

Mais uma vez cabe lembrar que o nome de Amêndola aparece em duas listas do Projeto Brasil Nunca Mais, pesquisa coordenada pela Arquidiocese de São Paulo que microfilmou todos os processos que se encontram no Superior Tribunal Militar, no período de 1964 a 1978; trata-se, portanto, de documentação oficial que não pode ser rotulada de facciosa. Na primeira destas listas “Elementos envolvidos em diligências e investigações”, à pagina 113, do Tomo II, volume 3, “Os Funcionários”, seu nome é denunciado, em dezembro de 1970, como Capitão da Policia Militar do Rio de Janeiro e aparece no Processo n° 1599, da 2ª Auditoria da Aeronáutica, da 1ª RM/CJM.

Na segunda lista, a de “Membros dos Órgãos da Repressão” no mesmo tomo e volume, também em dezembro de 1970, seu nome aparece no mesmo processo citado acima.

Além dessas informações que provam a estreita ligação de Amêndola com a repressão da ditadura militar, o GTNM/RJ, em 1993, quando apresentou o “Dossiê Paulo César Amêndola de Souza” teve informações do então deputado estadual Carlos Minc de que, quando esteve preso no Rio de Janeiro, no inicio de 1970, sabia do envolvimento deste coronel PM com a repressão.
http://www.torturanuncamais-rj.org.br/sa/Noticias.asp?Codigo=168

Carlos Eduardo da Maia disse...

Obrigado, Uranio, pela dica, vou dar uma lida, apesar de achar que o pessoal do La insignia força muito a barra. Pois é, de Castro, o Bope pode ter tido suas influências no esquadrão da morte e o filme tropa de elite mostra mais ou menos isso. Mas se existe no Brasil de hoje uma polícia que conta com a simpatia do povo brasileiro é o Bope e o capitão nascimento. É complicado, eu sei. Mas existe um grande problema do outro lado que é o controle da favela pelo impiedoso, torturador e homicida tráfico de drogas. Os traficantes, como bem mostra o filme, estão longe, muito longe, de serem considerados os bons mocinhos.

Carlos Eduardo da Maia disse...

Olá, Urariano, li teu texto no La Insignia, mas discordo dele. Acho que Padilla focou suas lentes num problema que fez o Brasil acordar. Por que não se pode criticar o pensamento políticamente correto? Será que o pensamento politicamente correto é tão correto assim? O melhor do filme é aquela aula de sociologia onde se mostra como é difícil contrapor o pensamento politicamente correto que cria um falso preconceito. A verdade, verdadeira você não toca no seu artigo: as favelas, as periferias das grandes cidades do Brasil estão sendo dominadas pelo tráfico. É necessário mais Estado e um Estado que seja eficiente e, sobretudo, FUNCIONE. Um abraço.